Por Sarah Parsons em WRI Brasil | O fim de 2022 certamente nos deixou em uma posição interessante – mas preocupante. Uma pandemia que já dura três anos se mostrou ainda longe de acabar, adoecendo milhões de pessoas e afetando as economias. A inflação global atingiu 9%, o nível mais alto desde 2008. A invasão da Ucrânia pela Rússia obrigou milhões de pessoas a deixarem suas casas e causou efeitos em cascata em sistemas de alimentos e energia pelo mundo. E os impactos das mudanças climáticas – de inundações fatais no Paquistão a ondas de calor fulminantes na Índia e secas na África – multiplicaram as ameaças.
Os mais pobres sentiram esses efeitos de forma ainda mais severa. Apenas em 2022, cerca de 95 milhões de pessoas passaram a viver na pobreza.
Mas não foram só más notícias: a capacidade de energia renovável subiu 8% no último ano, e todos os países assinaram um acordo histórico de biodiversidade da ONU para conservar 30% das áreas de terra e da água disponíveis no planeta até 2030.
Considerando os retrocessos, porém, será que os sinais de avanço evoluirão para as mudanças sistêmicas de que o mundo precisa para estabilizar o clima, proteger os ecossistemas e melhorar a qualidade de vida de todos?
O presidente e CEO do WRI, Ani Dasgupta, buscou responder essa e outras perguntas na 20ª edição do Stories to Watch, evento realizado anualmente pelo WRI. Dasgupta apresentou quatro temas e histórias que se desdobrarão em indicativos certeiros sobre os futuros rumos do planeta e que devem ser acompanhados em 2023:
A Rússia fez da energia uma arma ao invadir a Ucrânia, cortando o gasoduto responsável por 40% do abastecimento de gás natural da União Europeia e levando a um aumento de 41,5% nos preços da energia em outubro de 2022. A Europa reagiu assegurando mais importações de gás natural liquefeito (GNL) e aumentando a geração de energia nuclear e a partir do carvão.
A questão agora é: o aumento do investimento em combustíveis fósseis vai desviar a transição para a energia limpa e manter o aumento das temperaturas em níveis perigosamente altos? Ou desencadeará uma ampla mudança em direção a fontes de energia mais seguras, mais limpas e menos voláteis?
Alguns especialistas, com base em sinais iniciais, acreditam na segunda possibilidade. Em 2022, por meio do Plano REPowerEU, a União Europeia aumentou sua meta de energia renovável: de 40% para 45% da capacidade total até 2030. As lideranças recentemente foram além e aumentaram a meta de redução de emissões do bloco de 55% para 57% até 2030. E pesquisas mostram que 83% dos moradores da UE acreditam que a invasão da Ucrânia pela Rússia torna o investimento em energia renovável ainda mais importante.
Fora da Europa, países como Índia e China continuam investindo em fontes renováveis mesmo enquanto buscam GNL e outros combustíveis fósseis, colocando a questão em uma encruzilhada este ano.
A Amazônia oferece muito mais do que árvores. Abrangendo nove países, o ecossistema garante a subsistência de 47 milhões de pessoas, abriga 10% da biodiversidade do planeta e armazena até 140 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa.
Ainda assim, tanto a Amazônia quanto os serviços ecossistêmicos que oferece estão ameaçados. Aproximadamente 18% da floresta já foi desmatada; os cientistas afirmam que perder entre 20% e 25% das árvores da Amazônia desencadeará o colapso da floresta, transformando algumas áreas em savana e fazendo com que a floresta deixe de ser um sumidouro de carbono para ser uma fonte de emissões.
O destino da Amazônia depende muito do que acontece no Brasil, que foi responsável por 40% da perda de florestas tropicais no mundo em 2021. No final de 2022, a Amazônia vislumbrou uma nova esperança com a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A pergunta agora é: seu retorno ao poder colocará o destino da Amazônia em um rumo mais positivo, desencadeando movimentos internacionais mais fortes para proteger as florestas?
Lula já promoveu avanços ao nomear ministros favoráveis ao meio ambiente, restabelecer medidas antidesmatamento interrompidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, revogar licenças de mineração em áreas protegidas e reabrir o Fundo Amazônia, que fornece financiamento em troca de proteção florestal. Mas essa agenda pró-floresta enfrenta oposições políticas.
O que acompanhar: a agenda conservacionista de Lula será bem-sucedida – especialmente na aplicação das leis existentes em um país onde 98% do desmatamento é ilegal? E incentivos ao desmatamento zero serão adotados em escala global, por meio de regulamentações de cadeias de valor, mercados de carbono, financiamento para proteção florestal e, o que é fundamental, pela redução do desmatamento nos outros dois principais ecossistemas de florestas tropicais do mundo, na Indonésia e na Bacia do Congo, na África?
Uma transição de baixo carbono positiva para a natureza e para as pessoas exige US$ 5,2 trilhões em financiamento climático até 2030. Em 2020, o financiamento climático total ficou em apenas US$ 600 bilhões.
Todos os países passam por essa lacuna de investimentos, mas ela é ainda mais profunda nas nações em desenvolvimento devido aos recursos públicos cada vez mais escassos e aos riscos percebidos pelo setor privado. E, embora esse não seja um problema novo, o momento é favorável a uma nova solução: a Iniciativa Bridgetown.
Lançado em 2022 e liderado pela primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, o plano é abrangente: pode reformular por completo o sistema financeiro global, direcionando recursos e investimentos de baixo carbono para onde são mais necessários. O plano inclui reformas de bancos de desenvolvimento multilaterais, reestruturação de dívidas, recursos para adaptação e perdas e danos, entre outras frentes. Ambiciosa, a proposta foi celebrada por figuras como o presidente da França, Emmanuel Macron, e pela diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, entre outros nomes.
O que devemos acompanhar este ano é se as reformas propostas vão de fato começar e contar com o apoio de bancos de desenvolvimento multilaterais, dos países emissores e do setor privado. Potenciais momentos propícios incluem as reuniões de primavera do FMI e do Banco Mundial, em abril; as reuniões do GT e do G20 em maio e julho, respectivamente; a Cúpula dos Chefes de Estado na Índia em outubro; e a próxima conferência climática da ONU (COP28), em novembro.
O ano passado foi importante para a legislação climática nos Estados Unidos: o país promulgou a Lei dos Chips e da Ciência, a Lei de Infraestrutura Bipartidária e a Lei de Redução da Inflação. Juntas, essas políticas vão fornecer US$ 79 bilhões para investimentos de baixo carbono e positivos para o clima, com a promessa, por meio da Iniciativa Justice40, de direcionar pelo menos 40% dos benefícios do investimento climático a comunidades historicamente desassistidas.
É importante ressaltar que a importância dessas leis vai além do combate às mudanças climáticas: vão melhorar a qualidade de vida das pessoas ao corrigir injustiças. Por exemplo, a Lei de Infraestrutura Bipartidária e a Lei de Redução da Inflação juntas podem criar até 3,1 milhões de novos empregos até 2030 (saldo líquido). As famílias beneficiadas pelos incentivos de energia limpa da Lei de Redução da Inflação podem receber até US$ 10 mil em créditos e deduções fiscais.
A pergunta é: essas leis inovadoras vão impulsionar uma transição justa e de baixo carbono nos Estados Unidos – uma que permita ao país atingir suas metas de redução de emissões e, ao mesmo tempo, trazer benefícios econômicos para todas as pessoas?
Sinais importantes que devem ser observados incluem:
Juntos, esses temas ajudarão a moldar o futuro do planeta. Para mais informações sobre possíveis desdobramentos em cada uma dessas áreas, veja a apresentação completa do Stories to Watch.
Este texto foi originalmente publicado por WRI Brasil de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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