Com 132 filmes e obras premiadas nacional e internacionalmente, a 8ª Mostra Ecofalante de Cinema Ambiental chega a São Paulo trazendo uma filmografia baseada em diversos panoramas. Esse ano, a programação de destaque do Panorama Histórico é A Crise das Utopias e o Cinema Militante Pós-68 reunindo 14 obras realizads entre 1970 a 1984 e assinadas por grandes diretores, como Agnès Varda, Michelangelo Antonioni, Chris Marker, Frederick Wiseman, Glauber Rocha, entre outros. Dois debates estão agendados: “Contracultura e 68” e “Ativismos Emergentes”.
O evento propõe, assim, uma reflexão sobre o mundo e a sociedade que se seguiram à grande efervescência cultural dos anos 1960, às utopias, aos sonhos de revolução, às promessas de uma vida mais fraterna e libertária. Trata-se de uma oportunidade de se revisar aquele período pós-utópico no qual uma geração, ao mesmo tempo em que tentava juntar os cacos daquilo que caia por terra, não se furtava a abraçar novas lutas.
Além do Panorama Histórico, a Mostra traz filmes da sessão de Homenagem à Silvio Tendler, Brasil Manifesto, Panorama Internacional Contemporâneo, Competição Latino-Americana, Concurso Eco-falante, Sessão Infantil, Realidade Virtual e Seminário de Cinema e Educação.
Destaca-se “Zabriskie Point” (EUA, 1970, 114 min), em que o mestre Michelangelo Antonioni faz seu primeiro filme norte-americano, em que mergulha no contexto cultural da época, marcado, entre outros, pelo embate entre defensores e contestadores de uma sociedade cada vez mais pró consumo, esvaziada de sentido, em que o clima é de repressão e, ao mesmo tempo, resistência. A trama se inicia num campus universitário onde, após um protesto, um estudante suspeito de abater um policial foge. Em seu caminho, ele encontra uma estudante hippie. Juntos, ambos tomam o rumo das paisagens abertas do Vale da Morte, na Califórnia.
Dirigida pela recém falecida realizadora Agnès Varda, “Uma Canta, A Outra Não” (França, 1977, 120 min) é um filme militante e um musical feminista. Ele retrata duas personagens bastante diferentes: Pomme é uma cantora idealista, enquanto Suzanne torna-se mãe precocemente e tem que moldar sua vida a partir desse fato. Apesar disso, elas se mantêm unidas por fortes laços de amizades e sororidade.
Vencedor do Oscar de melhor documentário, “Os Tempos de Harvey Milk” (EUA, 1984, 88 min), de Robert Epstein, apresenta a carreira política de Harvey Milk, primeiro supervisor municipal de São Francisco assumidamente gay, desde sua ascensão enquanto ativista de bairro até tornar-se um símbolo da luta pelos direitos civis dos homossexuais.
Assinado pelo brasileiro Glauber Rocha durante seu exílio, “O Leão de Sete Cabeças” (Brasil/Itália/França, 1970, 103 min) se passa em um país africano fictício, onde dois homens, um latino-americano e um africano, unem forças para lutar contra o governo, que encontra-se em mãos europeias e norte-americanas.
Já “O Fundo do Ar é Vermelho” (França, 1977, 180 min) retraça a história das utopias daquele que foi um século de luta e resistência, mas também de opressão e violência. O diretor Chris Marker divide seu filme em duas partes: As Mãos Frágeis, em que 1968 e a Guerra do Vietnã aparecem como eventos chave e aglutinadores de movimentos sociais emergentes; e As Mãos Cortadas, em que mostra o declínio das utopias que marcaram a geração 1968. A versão exibida pela Mostra Ecofalante foi restaurada em 2008 e é a última validada por Marker.
Do cineasta brasileiro de origem moçambicana Ruy Guerra, a programação exibe “Mueda, Memória e Massacre” (Moçambique, 1979, 75 min), obra selecionada nos festivais de Berlim, Locarno e Roterdã e restaurada recentemente pelo Instituto Arsenal da Alemanha – é esta versão que a Mostra Ecofalante exibe. O filme documenta uma reconstituição do massacre de Mueda, ocorrido em 1960 e levado a cabo por portugueses no distrito de mesmo nome em Moçambique. O episódio sangrento significaria uma virada na história da luta contra o colonialismo no país, pois é a partir daí que emerge a Luta Armada de Libertação Nacional.
Destaque na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes em 1975, “Milestones” (EUA, 1975, 206 min) é um épico dos diretores Robert Kramer e John Douglas. Trata-se de um mosaico que reúne histórias e depoimentos de pessoas que, no momento de crise das utopias de esquerda dos anos 1970 ainda tentam viver de acordo com seus princípios.O filme retrata, em última instância, um momento de passagem, em que um ideal de coletividade perde cada vez mais terreno para valores pautados em torno do consumo e do culto ao individualismo.
Um retrato coletivo de mulheres trabalhadoras de uma fábrica de roupas na Alemanha Oriental, “Ela” (Alemanha, 1970, 30 min) teve sua versão restaurada exibida este ano no Festival de Berlim. Sua direção é assinada pela veterana Gitta Nickel, uma das mais prolíficas cineastas da antiga RDA (Alemanha Oriental). As protagonistas falam sobre relacionamentos e planejamento familiar, educação de filhos e qualificação profissional, direitos das mulheres e igualdade na sociedade socialista.
Vencedor do Oscar de melhor documentário, “Corações e Mentes” (EUA, 1974, 102 min), de Peter Davis, tornou-se um marco emblemático sobre a Guerra do Vietnã. O filme disseca a ideologia que engendrou e sustentou este trágico episódio da história americana e mostra o que foram os horrores do conflito para aqueles que o viveram in loco. Imagens chocantes às quais a sociedade norte-americana não tinha tido até então acesso vêm à tona.
No documentário “Carne” (EUA, 1976, 112 min), dentro do estilo observacional que lhe é próprio, documentarista Frederick Wiseman examina o processamento da carne, desde o boi no pasto até o hambúrguer. A produção é amplamente automatizada e os trabalhadores são mostrados como uma engrenagem da linha de produção. Ao mesmo tempo em que traz um retrato seco e duro do mundo do trabalho, este filme acaba por questionar as escolhas e o modo de vida da sociedade de consumo, numa década em que esse tipo de crítica começava a aparecer de maneira contundente.
“Angela Davis, Retrato de uma Revolucionária” (EUA, 1972, 62 min), de Yolande Du Luart, traça um retrato da professora de filosofia, membro do Partido Comunista e dos Panteras Negras, Angela Davis. Realizado entre o outono de 1969 até o incidente envolvendo a morte do estudante Jonathan P. Jackson, em 1970, pelo qual ela seria acusada e perseguida. O filme, que tem participação de Jane Fonda, dá vazão àquilo que a própria Angela Davis declara quando diz que se considera em estado de mobilização permanente.
Os anos 1970 viram a emergência de diversos filmes de ficção científica que propunham cenários distópicos em um mundo pós-desastre ambiental. No Brasil, em 1981, momento em que a discussão sobre o nuclear ganhava corpo, o diretor Roberto Pires filma “AbrigoNuclear”, um marco do cinema brasileiro, apresentado aqui em sua versão restaurada. O longa-metragem (Brasil, 1981, 85 min) mostra o planeta contaminado por múltiplas explosões nucleares e os sobreviventes dos eventos vivem sob o solo, num abrigo controlado por cientistas. Após um acidente dentro do local, um grupo de rebeldes decide desafiar as restrições impostas e subir para a superfície.
O filósofo francês Guy Debord foi um dos pensadores da Internacional Situacionista e da Internacional Letrista e seus textos pautaram o ideário de Maio de 1968. Em “A Sociedade do Espetáculo” (França, 1973, 88 min), Debord transforma em filme o livro de mesmo nome, hoje um tratado crítico, clássico pioneiro sobre o papel das imagens produzidas pela mídia na cooptação da vida das pessoas na era do capitalismo avançado. O filme acaba de serrestaurado e esta versão será exibida pela primeira vez no Brasil pela Mostra Ecofalante.
Dirigido pelo cineasta Celso Luccas e pelo dramaturgo, ator e diretor teatral José Celso Martinez Corrêa, “25” (Brasil/Moçambique, 1975, 140 min) foi filmado durante as comemorações que se seguiram à independência de Moçambique. O filme aborda o processo de libertação do país, passando pela história da resistência e luta do povo moçambicano contra 400 anos de opressão e dominação colonialista. Os realizadores percorrem as diferentes fases da colonização, desde a invasão de Vasco da Gama ao início da conscientização descolonizadora, passando pela resistência, massacres e pelos dez anos de guerra popular contra o exército português.
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