Mulheres são maioria no veganismo e isso pode estar relacionado ao patriarcado
O veganismo tem ganhado cada vez mais força em diversos países do mundo. No Brasil, uma pesquisa do Ibope Inteligência, realizada em 2018, mostrou que 14% da população não consome proteína de origem animal, um aumento de 75% em comparação com a mesma pesquisa feita em 2012. Entretanto, essa ideologia é mais presente em uma figura: a mulher vegana. Segundo alguns autores, esse fato está relacionado com a cultura patriarcal, que constrói a imagem do homem com base na objetificação de animais e mulheres.
Elas são maioria
No Reino Unido, em 2016, a Vegan Society descobriu que duas vezes mais mulheres do que homens seguem o veganismo. E isso não é apenas no Reino Unido, estatísticas mostraram que 79% das pessoas que se declaram veganas nos Estados Unidos se identificam como mulheres.
Mas o que seria capaz de explicar esse comportamento diferente entre os gêneros? Na verdade, os argumentos em prol do veganismo só nos levam a crer que essa filosofia de vida deveria ter mais adeptos entre os homens (e entre as mulheres), já que ela proporciona uma série de benefícios ambientais e de saúde, além de evitar crueldade animal.
Veganismo beneficia a todos
De acordo com o relatório do IPCC, consumir menos produtos de origem animal deveria ser um hábito adotado por toda a sociedade, não só por ser uma prática de compaixão pelos animais, mas também porque, segundo o relatório, o vegetarianismo estrito reduz a emissão de gases do efeito estufa, a degradação ambiental e o risco à segurança alimentar.
Um outro estudo, publicado na revista The Lancet, concluiu que a produção e o consumo de alimentos de origem animal devem ser reduzidos drasticamente para evitar milhões de mortes humanas e danos catastróficos para o planeta.
Menor risco de morte
Segundo um estudo realizado por profissionais da Universidade Adventista do Sétimo Dia de Loma Linda, nos Estados Unidos, quem é vegetariano estrito (que só come vegetais e fungos, como é o caso das pessoas veganas) têm um risco 15% menor de morte.
Enquanto isso, quem é ovolactovegetariano (que têm uma dieta baseada em vegetais, ovos, leite e produtos derivados destes) têm um risco de morte 9% menor do que pessoas que comem carnes.
Outros estudos ainda descobriram que, em populações de baixo risco, seguir uma dieta vegana pode reduzir o risco de câncer em geral.
Uma pesquisa mais antiga sugere que uma dieta vegetariana estrita ainda pode diminuir os sintomas da asma. Mas não para por aí. Uma revisão de 25 estudos concluiu que uma dieta com redução nos produtos de origem animal contribui para a redução do risco de obesidade e diabetes tipo 2.
Além disso, quem consome menos produtos derivados de animais está menos exposto a agrotóxicos. Uma análise mostrou que há uma maior presença de agrotóxicos no leite materno de mulheres onívoras em relação às vegetarianas, o que pode ser explicado pela característica lipossolúvel (capacidade de se misturar com gordura corporal) dos agrotóxicos, que se bioacumulam no organismo dos animais — que consomem ração produzida com agrotóxicos — e, consequentemente, nos humanos que consumiram esses animais.
Como o veganismo impacta o meio ambiente?
Em relação aos benefícios ambientais, reduzir o consumo de carne e outros produtos derivados de animais diminuiria a pressão sobre as terras agrícolas. Em um hectare de terra, por exemplo, é possível plantar de 42 mil a 50 mil pés de tomate ou produzir apenas uma média de 81,66 kg de carne bovina por ano. Assim, a alimentação vegetariana estrita estimula a diminuição do desmatamento.
A economia de água também é significativa, já que para se produzir um quilo de soja (que é fonte de proteína completa), são gastos 500 litros de água, enquanto para um quilo de carne bovina, são necessários 15 mil litros.
Estudos mostraram que reduzir o consumo de produtos derivados de animais alivia a pressão sobre o uso da terra e pode ser essencial para evitar impactos ambientais negativos, como a grande expansão agrícola (1).
Para piorar a reputação de quem ainda consome carne, a disseminação do coronavírus a nível mundial foi associada ao abate de animais. Uma pesquisa mostrou que os frigoríficos são os principais focos de coronavírus. Mas diante de todos esses benefícios de uma dieta vegana, por que os homens ainda parecem resistir?
Dieta machista?
Segundo a autora do livro “Política Sexual da Carne“, a dieta baseada em produtos de origem animal é reforçada pela cultura do patriarcado. Carol Adams defende que é impossível ser homem sem comer carne. Para a autora, consumir proteína animal contribui para manter a virilidade, que inclui características como força e robustez.
Em contrapartida, comer vegetais define o feminino. Mas, biologicamente, isso não faz o menor sentido, já que uma pesquisa mostrou que o desempenho físico de mulheres veganas é maior do que o de mulheres que consomem produtos derivados de animais.
Além disso, estudos recentes vêm questionando o mito da “natureza” caçadora dos homens. Uma pesquisa revelou que as mulheres estavam entre as primeiras pessoas a caçarem nas Américas.
Ingerir derivados de animais é, culturalmente, uma forma de mostrar superioridade em relação aos animais e às mulheres. E essa suposta supremacia masculina é passada e reforçada cotidianamente por meio da linguagem. No Brasil, por exemplo, para ofender uma mulher é comum chamá-la de fêmea de outras espécies como “galinha”, “vaca”, “piranha” e “cachorra”. Nessa lógica, os homens que não consomem animais são afeminados, gays e fracos.
Masculinidade tóxica
O professor de Geografia Humana na Universidade de Newcastle, Dr. Michael J Richardson, também defende que a dieta baseada em proteína animal está relacionada à masculinidade tóxica. Em entrevista à Euronews, ele diz: “Minha experiência como amante de esportes, jogador de futebol, jovem, homem branco heterossexual era totalmente esperada no grupo de amizade… mas como qualquer outro desafio às estruturas de masculinidade hegemônica, uma vez declarado vegano, as acusações imediatas de fraqueza e homossexualidade vêm à tona.”
Na cultura americana é comum que homens que passam a reduzir seu consumo de carne sejam chamados de “meninos de soja”, o termo ganhou força com comentaristas de extrema direita que buscavam se distanciar de qualquer coisa considerada “feminina” ou “fraca”.
Um estudo da Universidade de Southampton mostrou que mesmo que os homens estejam interessados em comer menos carne, sem aceitação do grupo social isso ainda pode ser uma escolha difícil. De forma complementar, outro estudo de 2018 descobriu que conceitos como “virilidade” e “poder” faziam parte da relação que nós, como espécie, temos com comer carne e estereótipos masculinos convencionais.
Muitos homens estão interessados em comer menos carne e demonstrar práticas de compaixão pelos animais, mas eles precisam de permissão social para isso — e à medida que mais homens decidem aderir à um estilo de vida vegano, essa decisão se torna mais fácil para outros homens.
Estatísticas
Um estudo mostrou que as dietas ricas em produtos de origem animal dos homens resultam em emissões de gases do efeito estufa 41% maiores do que as dietas das mulheres. Além disso, a pesquisa revelou que dietas não veganas estão associadas a um aumento de 59% nas emissões médias de gases do efeito estufa, em comparação com dietas veganas.