Ser adepto do negacionismo climático e apoiar populistas de direita são características correlacionadas
Negacionismo climático diz respeito à postura cética em relação aos fatos científicos sobre o aquecimento global e as mudanças climáticas em geral. E esse comportamento é mais proeminente em seguidores de populistas de direita.
Durante a maior parte de sua história, o negacionismo climático foi uma tendência política de nicho e, onde existia, as formas mais vocais tendiam a ser minoria. Mas um mundo cada vez mais globalizado e uma proliferação de líderes céticos quanto à ciência do clima fizeram dele uma força global.
Isso foi melhor exemplificado pela candidatura e presidência de Donald Trump. Trump descreveu a mudança climática como uma “farsa” e retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris.
Ele conduziu para a corrente principal uma variação populista mais abertamente de direita do negacionismo em que os ambientalistas são enquadrados como parte da “elite corrupta” agindo contra os interesses do povo “puro”.
O que são as mudanças climáticas?
Mudanças climáticas são as variações climáticas na temperatura, precipitação e nebulosidade em escala global. Elas ocorrem devido ao aumento das emissões de gases do efeito estufa. Como resultado, a retenção de energia nos oceanos e na atmosfera aumenta. Assim, provocando um aumento da intensidade, da frequência e do impacto de eventos climáticos extremos, sejam de frio ou de calor.
As mudanças climáticas podem ser causadas por fatores naturais, como as alterações na radiação solar ou movimentos da órbita da Terra. Porém, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) afirma que há 90% de certeza que o aumento da temperatura global está sendo causado pela ação humana ao longo dos últimos 250 anos.
Esse tempo coincide com a primeira Revolução Industrial, que foi responsável pela intensificação de processos industriais como a queima de combustíveis fósseis e outras atividades humanas que foram responsáveis pelo aquecimento do planeta.
Durante o século 20, estudos da comunidade científica comprovaram um aumento de 0,6ºC da temperatura global e, além disso, um aquecimento adicional de 0,14ºC desde os anos 2000. Isso comprova que as mudanças climáticas são processos graduais, que são agravados em sincronia com a exploração e destruição do meio ambiente.
Porém, como já mencionado, a elevação da temperatura não é a única característica das mudanças climáticas e sim as variáveis do clima em geral, que levam à cada vez mais desastres climáticos e, consequentemente, oferecem mais riscos à saúde do planeta e dos seres humanos. Portanto, ganhar espaço para a discussão aberta sobre o clima e diminuir o número de pessoas que negam o aquecimento global é imprescindível na luta contra a crise climática.
Quais são os tipos de negacionismo?
Segundo pesquisadores de um estudo realizado no Reino Unido e publicado na revista Elsevier, há dois tipos de negacionismo climático:
- O negacionismo epistêmico, relativo às dúvidas sobre o status da mudança do clima como um fenômeno científico e físico;
- Negacionismo de resposta, relacionado às dúvidas sobre a eficácia das ações tomadas para enfrentar as mudanças climáticas.
Quais são os argumentos do negacionismo climático?
De acordo com o estudo mencionado, as eras glaciais são citadas como a principal causa das mudanças climáticas entre os negacionistas epistêmicos. Já os negacionistas de resposta apresentam como principais comportamentos:
Justificação da inação individual
No nível individual, negacionistas climáticos duvidam da eficácia de suas próprias ações comportamentais no combate às mudanças climáticas.
Um dos participantes do estudo, por exemplo, mencionou acreditar que “separar o vidro do papelão não tem muito efeito no derretimento das calotas polares”. O participante, de nome não divulgado, ainda disse: “Eu sei que, se todo mundo fizesse, seria útil, mas é um símbolo no momento. É mais para nos fazer sentir melhor do que para resolver o problema”.
Da mesma forma, uma segunda pessoa expressou ceticismo sobre a eficácia de fazer reciclagem doméstica:
“Reciclando uma garrafa de vinho, vou mesmo salvar o mundo? Eu não acredito. Se eu não colocar meu papel de fotocópia na reciclagem, isso vai fazer uma grande diferença? Sou cético a respeito disso”.
Além de caracterizar um ceticismo geral em relação ao enquadramento das mudanças climáticas em termos de responsabilidade individual, afirmações como a do segundo participante podem ser usadas para explicar a falta de engajamento pessoal no combate às mudanças do clima. Da mesma forma, na seguinte troca, dois participantes fornecem um contexto em que a inação individual é retratada como justificável:
— “Se você e eu mudarmos o que fazemos realmente não faz nenhuma diferença.”
— “Se eu não comer vacas [referência aos impactos do consumo de carne], não faz grande diferença.”
Um outro adepto do negacionismo climático, também não identificado, afirmou que as mudanças climáticas “são apenas mais uma grande expressão da moda política no momento em relação às eleições”.
Invalidação da mídia
Os participantes da pesquisa também expressaram ceticismo sobre a veiculação de informações a respeito das mudanças climáticas. Eles classificaram os meios de comunicação como “exagerados e sensacionalistas”.
Além disso, jornais foram mencionados como fontes não confiáveis. Foi enfatizado que as más notícias só servem para “gerar ganho financeiro, servindo de interesse para agendas particulares”.
Preguiça
Em alguns casos, a fadiga com relação às mudanças climáticas foi dada como justificativa para o negacionismo. “Eu coloquei ceticismo [no questionário da pesquisa]. Mas não é que eu não concorde com isso [mudanças climáticas]”, disse um participante.
“Vamos ficar bem; os humanos existem há tantos anos e todos nós nos adaptamos para estar onde estamos hoje, então eu tenho certeza de que podemos lidar com isso de novo, é apenas um problema e eu não posso ficar desesperado com isso”, concluiu outro.
Negacionismo climático e disseminação de informações falsas
Apesar da preguiça ser uma das justificativas para a adesão ao negacionismo climático, nem todos os negacionistas são preguiçosos. Uma parte deles, inclusive, atua vandalizando páginas como a Wikipedia, importante enciclopédia pública da internet, alterando notícias científicas sobre problemas ambientais.
Um grupo de editores, entretanto, trabalha constantemente para proteger a página de informações falsas a respeito das mudanças climáticas. Saiba mais detalhes na matéria “Grupo se reúne para proteger a Wikipédia do negacionismo climático“.
Por que algumas pessoas acham difícil acreditar no aquecimento global?
O aquecimento global é o processo de aumento da temperatura média global, causando enormes prejuízos para o planeta. Segundo estudos, a negação relacionada às mudanças climáticas pode estar ligada com um mecanismo de defesa. Ele serve para proteger-se e recusar a aceitar notícias que afetam o modo de vida do indivíduo. Dessa maneira, a negação pode entrar como uma forma de adiar o momento de lidar com situações angustiantes.
A posição de líderes globais e de pessoas com grande influência também são um fator determinante para o negacionismo. As falas e ações de Donald Trump perante à temática ambiental são um exemplo disso. Uma vez que elas têm o poder de mudar parte da opinião pública independente da veracidade dos fatos.
Além disso, a visão política, religiosa e cultural de um indivíduo pode influenciar na aceitação de algum assunto. Se a pessoa não está disposta a acreditar em algo, ela automaticamente procurará motivos dentro da sua visão de mundo para discordar.
Negacionismo climático é de direita
Curiosamente, um estudo realizado pela Universidade de Oxford e pelo Instituto Leibniz de Ciências Sociais, revelou uma forte ligação entre ser adepto do negacionismo climático e apoiar populistas de direita.
Com base em dados de pesquisa e rastreamento de históricos de navegação na internet de mais de 9 mil participantes em seis países, os pesquisadores Dr. Pu Yan, Professor Ralph Schroeder e Sebastian Stier descobriram que o apoio aos partidos de direita está fortemente relacionado ao negacionismo climático e à oposição às políticas favoráveis ao clima.
O estudo não encontrou uma ligação entre o apoio aos partidos populistas de esquerda e a negação da mudança climática. Entretanto, observou que o grupo mais propenso a ser negacionista é dos seguidores de partidos políticos de direita. Por isso esse grupo desconfia mais dos métodos científicos.
O negacionismo climático no Brasil
Dados de 2019 do Datafolha indicam que 85% dos brasileiros acreditam nas mudanças climáticas. Em contrapartida, apenas 15% da população são considerados negacionistas climáticos e especificamente duvidam do fenômeno.
O número de negacionistas climáticos brasileiros é relativamente baixo. Entretanto, a ampliação de vozes desses indivíduos pode ter um impacto significativo no planeta.
Uma dessas vozes pertence ao ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que durante sua atuação no ministério defendeu a exploração capitalista da Amazônia e outros processos altamente destrutivos à biodiversidade brasileira. Além do ex-ministro, outras vozes do governo também possibilitaram uma maior exploração do ecossistema amazônico.
Isso resultou em inúmeros impactos ambientais, como observado pelo The Climate Observatory. Em setembro de 2022, segundo um levantamento da instituição, a floresta amazônica perdeu cerca de 1.455 quilômetros quadrados frente ao desmatamento — um aumento de 47,7% em relação a setembro do ano anterior.
Segundo o chefe executivo do The Climate Observatory, Marco Astrini, o governo brasileiro atuante entre 2019 e 2022 era uma “máquina de destruição de florestas”.
Além disso, em 2022, o desmatamento na Amazônia brasileira quebrou todos os recordes anteriores. Segundo dados do IPAM, a área destruída no primeiro semestre de 2022 é 80% maior que a média de área desmatada em 2018, acumulando 3.988 quilômetros quadrados.
Outras informações de um relatório divulgado durante o segundo semestre de 2022, cerca de 26% da Amazônia já possui danos quase irreversíveis, chegando em um ponto de não retorno.
Todos esses dados ressaltam o peso do negacionismo climático no meio ambiente e, principalmente, nos ecossistemas brasileiros, que sofreram mudanças irreversíveis durante um período de negligência governamental.