A Floresta Amazônica é vital para o planeta. Na posição de maior floresta tropical do mundo, suas árvores não apenas sustentam um dos biomas mais ricos que existem como regulam os padrões climáticos que fornecem água para as pessoas na América do Sul e são fundamentais para a agricultura na região.
Na emergência climática que o mundo enfrenta, a Amazônia tem um papel essencial para manter abaixo de 1,5°C o aumento da temperatura média causado pelas mudanças climáticas. No entanto, a floresta e sua capacidade de ser parte da solução para a crise no clima estão em risco. A região enfrenta hoje quatro crises simultâneas que podem comprometer a capacidade da Amazônia de absorver carbono.
O desmatamento e a degradação são fontes diretas de emissões de gases de efeito estufa, uma ameaça que pode transformar a região amazônica em um emissor líquido de CO2. Um estudo conduzido ao longo da última década mostrou que áreas importantes da floresta, em particular a região sudeste, deixaram de ser um sumidouro para se tornar uma fonte de dióxido de carbono.
Estamos vivendo uma crise de biodiversidade em todo o mundo, com a estimativa de um milhão de espécies ameaçadas de extinção. Florestas tropicais como a Amazônia são profundamente biodiversas; incêndios e o desmatamento colocam muitas espécies sob ameaça. Nos últimos 20 anos, o fogo já afetou o habitat de até 85% das espécies de plantas e animais listados como ameaçados na Amazônia.
Novos estudos sugerem que o desmatamento contínuo pode levar a Floresta Amazônica a um ponto de não retorno, no qual a floresta não será mais capaz de se manter e grandes áreas podem passar por uma transição, tornando-se um ecossistema mais próximo das savanas. Isso aceleraria as mudanças no clima e causaria alterações nos padrões climáticos do continente, afetando a agricultura em diversas regiões.
A Amazônia é uma região tão vasta quanto de difícil acesso, devido à infraestrutura precária. É também uma região de excepcional diversidade social na América Latina, ainda que empobrecida. A atual dinâmica econômica aumentou a pressão sobre seus recursos naturais, e o desmatamento atingiu marcas históricas, com os setores de madeira, soja, gado e mineração pressionando os limites da floresta. O conflito entre áreas florestais e outras formas de uso da terra tem sido um problema para a região desde os tempos coloniais. Recentemente, cresceram as atividades de extração ilegais, o que provocou um aumento da violência no campo, incluindo invasões recorrentes a reservas indígenas. A crise da Covid-19 aprofundou desafios históricos, intensificando a urgência por novas oportunidades – não associadas ao desmatamento – de desenvolvimento sustentável e diversificação econômica para todas as pessoas, em especial aquelas que carecem de acesso às necessidades mais básicas seja nas áreas florestais, rurais ou urbanas.
Evitar que um cenário assombroso como esse se concretize é o interesse dos nove países amazônicos – Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. A Colômbia, por exemplo, reforçou sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), que já era ambiciosa, e convocou o Pacto de Letícia com o objetivo de proteger a Amazônia. No entanto, uma vez que 60% da floresta está dentro das fronteiras brasileiras – país com experiência comprovada no passado em reduzir o desmatamento –, o Brasil é um ator chave na proteção da Amazônia.
A seguir, listamos quatro estratégias que o país pode colocar em prática para proteger a Floresta Amazônica e, ao mesmo tempo, traçar os rumos de uma recuperação econômica verde, criando empregos, gerando renda e conduzindo a região para uma economia de baixo carbono.
Em primeiro lugar, o Brasil poderia mostrar à comunidade internacional seu comprometimento com o combate ao desmatamento na Amazônia, fortalecendo sua NDC. O país tem um padrão de emissões muito diferente dos países desenvolvidos, que têm a maior parte das emissões provenientes do setor de energia. Aqui, em contraste, há uma alta participação de fontes hidráulicas renováveis de energia na produção de eletricidade: mais de 64%. A maior parcela das emissões no Brasil vem do setor de uso da terra, com mais de 70% das emissões relacionadas à agricultura, desmatamento e queimadas. Uma vez que a NDC é um compromisso com a redução de emissões, eliminar o desmatamento ilegal é uma das ações climáticas mais fundamentais e estratégicas que o Brasil pode adotar para cumprir o Acordo de Paris e, ao mesmo tempo, evitar pontos de não retorno causados pela degradação na Amazônia.
Em dezembro de 2020 o governo brasileiro apresentou uma NDC decepcionante. Embora o país tenha se comprometido a reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030 em relação aos níveis de 2005, atualizações na linha de base de 2005 deixam essas metas bem menos ambiciosas do que o compromisso assumido pelo Brasil em 2015.
A NDC de 2020 também excluiu qualquer menção a metas setoriais – como acabar com o desmatamento ilegal e restaurar 12 milhões de hectares de florestas até 2030. Em uma carta enviada em abril ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e de novo durante seu discurso na Cúpula de Líderes, o governo brasileiro se comprometeu a conter o desmatamento ilegal até 2030, mas se esse compromisso integrará novamente a NDC oficial ainda é uma questão em aberto. Uma NDC mais ambiciosa, submetida oficialmente à Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) antes ou durante a COP26, deveria incluir essas metas e indicar qual caminho será adotado para reduzir as emissões.
O Brasil é uma potência do agronegócio – o setor representa pelo menos um quarto do PIB. No entanto, formas não sustentáveis de produção de commodities resultaram em mais de 50 milhões de hectares de pastagens degradadas no país.
O Brasil não precisa derrubar novas áreas de floresta para manter sua produção pecuária. Em vez disso, novos estudos mostram que a recuperação de pastagens degradadas pode aumentar a capacidade do país de produzir carne e, ao mesmo tempo, expandir a restauração e a regeneração de florestas nativas.
Um estudo de 2020 do WRI Brasil e da New Climate Economy com instituições parceiras indica que a restauração florestal também traria vários benefícios econômicos. O trabalho mostra que a restauração de 12 milhões de hectares de pastagens degradadas pode levar a um aumento de US$ 3,7 bilhões na produção agrícola, além da arrecadação de US$ 144 milhões a mais em receitas tributárias apenas do setor da agricultura.
A questão financeira é outra razão para o Brasil cumprir seus compromissos climáticos e proteger a Amazônia. O país já possui meios para reduzir o desmatamento de forma considerável. No passado, fortaleceu a fiscalização, trabalhou com a sociedade civil e também com a Polícia Federal, criou o Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) e condicionou o financiamento e o crédito rural ao cumprimento do Código Florestal, entre outras medidas.
Restabelecer políticas para controlar e prevenir o desmatamento e criar novas maneiras de tornar produtos e cadeias de abastecimento livres do desmatamento são ações importantes para atrair novos financiamentos internacionais para a região amazônica.
O setor financeiro internacional tem se afastado rapidamente de investimentos e produtos não sustentáveis. Mais de 1.500 organizações em todo o mundo, incluindo mais de 1.340 empresas com uma capitalização de mercado de US$ 12,6 trilhões e instituições financeiras responsáveis por US$ 150 trilhões em ativos, manifestaram seu apoio à Força-Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima, que cria transparência em torno dos riscos climáticos. Esse é um indicativo claro para os países que buscam investimentos sobre a necessidade de de garantir sustentabilidade. Setenta e três dos maiores gestores de ativos do mundo, incluindo a Blackrock e a Vanguard, que supervisionam juntas US$ 35 trilhões – ou um terço dos ativos globais – estabeleceram o objetivo de alcançar emissões líquidas zero em seus portfólios de investimento até 2050, em linha com a meta de 1,5°C do Acordo de Paris.
O Brasil precisará enviarsinais concretos à comunidade internacional se quiser capturar os fluxos financeiros que precisa. Caso contrário, empresas com metas e divulgações climáticas não estarão dispostas a investir no Brasil por medo de exposição ao risco climático.
Parte da luta contra as mudanças climáticas e o desmatamento na Amazônia brasileira se dará por meio da inovação. A diversidade cultural da Amazônia deveria ser considerada uma vantagem. Para preservar o capital natural e ir além do cenário atual, será essencial descobrir, testar e ampliar novos métodos de produção baseados em conhecimentos tradicionais. Estudos mostram que o desmatamento não se converte em bem-estar para as pessoas que vivem na Amazônia, do mesmo modo que sua redução não compromete a produção agrícola, e há muitos meios de aumentar a produção sem destruir a floresta. Além disso, uma nova economia da Amazônia precisa inovar e valorizar e incluir os povos originários da região. Pesquisas também já quantificaram os benefícios climáticos e econômicos para a sociedade da garantia do direito à terra aos povos indígenas, que são os melhores guardiões da floresta. A transição, no entanto, deve criar novos empregos para famílias e coletivos locais, bem como fornecer a infraestrutura necessária sem sacrificar a biodiversidade.
A ação climática no Brasil será determinada pela resposta às atuais crises na Amazônia. Um relatório recente do WRI Brasil mostra que uma recuperação econômica verde pode gerar mais de dois milhões de empregos a mais do que no cenário tendencial, levar a um aumento acumulado adicional de R$ 2,8 trilhões no PIB até 2030, reduzindo a poluição do ar e da água e beneficiando todos os brasileiros. A Floresta Amazônica, suas cidades e áreas rurais devem estar à frente da transição para uma economia de baixo carbono. As ações realizadas na Amazônia ajudarão a determinar não apenas o futuro da população local, mas também se o mundo será capaz de evitar os piores impactos da emergência climática.
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