Por Luciana Yokoyama Xavier, pesquisadora da Cátedra Unesco para Sustentabilidade do Oceano, e Alexander Turra, professor do Instituto Oceanográfico (IO) da USP
Por Jornal da USP | Quando falamos de conservação ambiental, o conhecimento é a base para a ação. Nós nos envolvemos com aquilo que conhecemos, que nos é caro, que nos desperta emoção e que nos afeta. Pessoas mais bem informadas, mais conectadas e em maior sintonia com o mundo que as cerca tendem a adotar comportamentos mais responsáveis quanto à conservação do ambiente e seus recursos. Um exemplo disso são as populações indígenas e comunidades tradicionais, cujos modos de vida são responsáveis pela conservação de grande parte de nossos sistemas naturais.
Sendo assim, como promover a conservação do oceano quando conhecemos menos de 5% dele? Apesar de cobrir 70% da superfície do planeta e ser fundamental para a manutenção de todas as formas de vida da Terra, o oceano representa um mistério tanto para a ciência quanto para a sociedade. O chamado mar profundo, área abaixo de 200 metros de profundidade, cobre mais de 80% do oceano, mas conhecemos apenas 19% dele. Mesmo nas áreas mais rasas, onde se concentram os usos, impactos e a pesquisa, apenas cerca de 50% são bem conhecidos.
A área marinha do Brasil é uma das maiores do mundo. São mais de 8 mil km de linha de costa que banham 17 dos 26 Estados brasileiros e 5,7 milhões de quilômetros quadrados de área marinha, a chamada Amazônia Azul. É uma área de grande importância pela diversidade de espécies, recursos minerais, usos e benefícios que provê para a sociedade. O oceano contribui com cerca de 19% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Ainda assim, grande parte da população não conhece o oceano ou sabe muito pouco de sua importância para o País, para a própria sociedade e para si.
O desconhecimento é uma grande ameça ao oceano, que já se encontra em uma situação bastante delicada. Não há uma área do oceano que não seja afetada por nossas ações sobre o planeta e mais da metade dele (59%) já sofre impactos cumulativos da ação humana. Até mesmo no longínquo mar profundo já é possível observar efeitos indesejados da presença de lixo e de mudanças globais relacionadas à catástrofe climática.
Para mudar esse cenário, em 2017 foi proposta a Década das Nações Unidas da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (Década do Oceano – 2021 e 2030). A Década do Oceano nos chama para construirmos “a ciência que precisamos para o oceano que queremos” por meio da colaboração entre diversos setores da sociedade.
Pautada na promoção da Cultura Oceânica – um movimento que busca mostrar como o oceano nos afeta e é afetado por nossas ações – e alinhada à Agenda 2030 das Nações Unidas, em especial ao Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) 14 “Vida na Água”, a Década do Oceano se propõe a romper barreiras e transformar gerações para transbordar o conhecimento sobre o oceano e gerar mudanças estruturais em nossa relação com ele. Construir canais de comunicação que façam a ponte entre diferentes saberes é um dos desafios da Década.
Assim, pautada em sua missão de criar conexões entre os diversos setores sociais e de produzir e disseminar o conhecimento sobre o oceano, a Cátedra UNESCO para Sustentabilidade do Oceano, ligada ao Instituto Oceanográfico e ao Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, produziu um volume especial junto à revista Diálogos Socioambientais sobre esse tema.
A revista Diálogos Socioambientais é uma produção do Grupo de Acompanhamento e Estudos de Governança Ambiental (GovAmb) da USP e do Laboratório de Planejamento Territorial da Universidade Federal do ABC. A revista iniciou suas atividades vinculada ao Projeto Temático Fapesp Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista face à Variabilidade Climática – MacroAmb, com o título Diálogos Socioambientais na Macrometrópole, tendo esse território como foco dos primeiros 12 volumes publicados. Em 2022, a revista ampliou seu escopo para novos territórios, territorialidades e temas, com o nome de Diálogos Socioambientais para fortalecer seu papel de divulgar o conhecimento sobre a relação entre a sociedade e a natureza.
Nasceu assim o volume O Oceano e a Sociedade, que reúne textos de representantes de diferentes segmentos sociais que pesquisam, conservam, fazem a gestão, usam, vivem, se conectam e se inspiram pelo oceano para refletir sobre a Década do Oceano e os desafios que ela busca superar.
O volume começa com uma apresentação da Década do Oceano e sua implementação no Brasil, assinada pela Coordenação-Geral de Oceano, Antártica e Geociências do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Na sequência, os textos abordam temas relacionados a cada um dos objetivos da Década do Oceano, ou seja, de alcançar: um oceano limpo; um oceano saudável e resiliente; um oceano previsível; um oceano seguro, um oceano produtivo e explorado sustentavelmente; um oceano transparente; e um oceano conhecido e valorizado por todos.
Buscamos trazer uma coleção diversa de vozes e temas para falar da Década do Oceano. Nas palavras dos editores: “O oceano é imenso e único, mas tem diferentes facetas que revelam a multiplicidade de relações que podem ser estabelecidas entre ele e a sociedade. Esse volume nos propõe um reconhecimento desse manancial de inquietudes e oportunidades para superarmos desafios e singrarmos rumo a um movimento que promova a transformação para um oceano e um planeta sustentáveis”.
Assim, convidamos todos a conhecer o volume O Oceano e a Sociedade, e se aprofundar nesse diálogo inquietante e nas metas desafiantes que a Década do Oceano nos coloca.
Este texto foi originalmente publicado por Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.