A fome é um problema político, e não de escassez

Compartilhar

Enquanto o planeta produz alimentos suficientes para alimentar mais que o dobro da população global, milhões ainda passam fome. A desigualdade, os conflitos e as mudanças climáticas são os principais responsáveis por essa contradição. A solução, no entanto, não está apenas em inovações tecnológicas, mas em decisões políticas corajosas que enfrentem as causas profundas da insegurança alimentar.

A produção mundial de alimentos nunca foi tão alta. Ainda assim, mais de 700 milhões de pessoas sofrem de desnutrição crônica, e 2,3 bilhões não têm acesso a uma dieta adequada. O problema não é a falta de comida, mas a má distribuição e o acesso desigual. Grandes corporações preferem destinar alimentos para ração animal, biocombustíveis ou produtos ultraprocessados, em vez de vendê-los a preços acessíveis para populações carentes. Além disso, um terço de toda a comida produzida é desperdiçada, grande parte, para manter preços lucrativos.

Desigualdade e conflitos: os pilares da fome

A fome é, acima de tudo, um problema político e econômico. Conflitos armados, como os observados em Gaza e no Sudão, transformam regiões inteiras em zonas de fome. Governos frequentemente ignoram táticas de guerra que usam a fome como arma, optando por oferecer ajuda emergencial em vez de resolver as causas dos conflitos. A desigualdade também desempenha um papel central. Nos Estados Unidos, por exemplo, estados como Iowa, conhecidos por sua produção agrícola industrializada, têm 11% da população e uma em cada seis crianças enfrentando dificuldades para se alimentar.

No Brasil, o programa Fome Zero mostrou que políticas públicas direcionadas podem gerar resultados significativos. Em 18 meses, o país reduziu a fome severa em 85% por meio de assistência financeira, programas de alimentação escolar e políticas de salário mínimo. Essas medidas comprovam que a redistribuição de renda e o acesso a recursos são essenciais para combater a insegurança alimentar.

O papel da agroecologia e dos mercados locais

A agroecologia surge como uma solução promissora para enfrentar a fome e as mudanças climáticas. Esse sistema agrícola aplica princípios ecológicos para garantir a sustentabilidade e promover a equidade social. Além de sequestrar carbono e aumentar a resiliência a choques climáticos, a agroecologia reduz a dependência de fertilizantes e pesticidas sintéticos, que são caros e prejudiciais ao meio ambiente. Investir em mercados locais e territoriais também é fundamental, pois eles fortalecem a resiliência econômica e garantem o acesso a alimentos diversificados e nutritivos.

No entanto, a concentração corporativa nas cadeias globais de alimentos continua a ser um obstáculo. Desde sementes e agroquímicos até o comércio de grãos e o empacotamento de carne, grandes empresas controlam preços e exercem influência política desproporcional. Políticas antitruste mais rigorosas são necessárias para limitar esse poder e garantir que os alimentos cheguem a quem mais precisa.

A armadilha da dependência alimentar

Regiões pobres frequentemente ficam presas em ciclos de dependência de importações de alimentos, tornando-se vulneráveis a crises econômicas e interrupções nas cadeias de suprimentos. Para romper esse ciclo, é essencial apoiar a produção local e regional, que não só gera empregos, mas também fortalece a segurança alimentar. Além disso, é preciso reconsiderar o uso de cultivos alimentares para biocombustíveis, uma prática que desvia recursos essenciais para a alimentação humana.

Ação política: a chave para mudanças reais

A tecnologia pode desempenhar um papel importante, mas as inovações mais valiosas são aquelas que promovem sistemas alimentares equitativos e sustentáveis, e não apenas lucros corporativos. Sem políticas que priorizem a equidade e enfrentem o poder concentrado, a fome continuará a ser uma realidade. A solução para a fome não é um mistério: o que falta é vontade política para enfrentar suas causas profundas.

A mensagem é clara: a fome persiste porque a injustiça persiste. Para erradicá-la, são necessárias ações políticas corajosas, e não apenas avanços científicos. O combate à fome exige uma transformação radical no modo como produzimos, distribuímos e consumimos alimentos. E essa transformação só acontecerá quando os governos e a sociedade priorizarem a justiça social e a sustentabilidade.

Equipe eCycle

Você já percebeu que tudo o que você consome deixa um rastro no planeta? Por uma pegada mais leve, conteúdos e soluções em consumo sustentável.

Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos.

Saiba mais