Renovação da matriz energética é uma renovações necessárias para todos países
Por Jamal Srouji, Taryn Fransen e David Waskow em WRI Brasil – O relatório de 2021 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) deixou muitos de nós questionando se o mundo pode de fato manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C, o limite que os cientistas consideram seguro para evitar os impactos mais perigosos das mudanças climáticas. Uma nova pesquisa do WRI e da Climate Analytics mostra que os países do G20, que respondem por cerca de 75% das emissões globais de gases de efeito estufa, podem conduzir o mundo em direção a essa meta – se aumentarem consideravelmente sua ambição.
Os atuais planos climáticos nacionais – incluindo compromissos de redução de emissões para 2030 (conhecidos como NDCs) e metas legalmente vinculantes para atingir emissões líquidas zero – só limitarão o aquecimento a 2,4°C até 2100, tornando mais prováveis eventos extremos cada vez mais severos, como incêndios florestais, secas, inundações, entre outros. Se os países do G20 oficializarem as metas que anunciaram (mas que ainda não foram adotadas formalmente), o aumento da temperatura pode ser limitado a 2,1°C.
O estudo conclui que, se todos os países do G20 definirem metas ambiciosas de redução de emissões para 2030 e se comprometerem a atingir emissões líquidas zero até a metade do século, o aumento da temperatura global pode permanecer em 1,7°C até 2100, mantendo alcançável o limite de 1,5°C.
Especificamente, o documento modela os efeitos que a temperatura global sofrerá se, além das promessas existentes, os países desenvolvidos estabelecerem metas para zerar as emissões líquidas até 2050; se os países em desenvolvimento estabelecerem metas semelhantes até 2050; e se todos os países do G20 alinharem suas metas para 2030 a trajetórias globais que limitam o aquecimento a 1,5°C.
A análise ressalta o quanto é essencial que as nações do G20 intensifiquem seus compromissos de ação climática antes da cúpula do clima da ONU (COP 26) em novembro de 2021.
Por que é tão importante limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C?
Os eventos climáticos extremos que vemos hoje – como calor e incêndios florestais recordes nos EUA, Canadá e Rússia, e inundações severas na Europa e China – estão ocorrendo mediante um aquecimento de apenas 1,1°C em relação aos níveis pré-industriais.
Manter o aumento da temperatura abaixo de 1,5°C não interromperá eventos climáticos extremos como esses, mas evitará os impactos ainda mais perigosos de temperaturas médias mais altas. Ultrapassar o limite de 1,5°C condenaria milhões de pessoas a um risco muito maior de ondas de calor, inundações, secas e pobreza potencialmente fatais. Cada fração de grau é importante quando se trata da gravidade dos impactos climáticos.
Para exemplificar, reunimos no infográfico abaixo uma análise das diferenças de impacto de aumentos de 1,5° C e 2°C na temperatura global:
Quanto os países do G20 precisam reduzir de suas emissões até 2030 para limitar o aquecimento a 1,5°C?
Quase todos os membros do G20 precisariam fortalecer suas NDCs de 2030 para reduzir as emissões em um ritmo consistente com a meta de 1,5°C. O gráfico abaixo mostra a porcentagem da lacuna de ambição global para 2030 que cada país do G20 poderia preencher ao adotar uma NDC alinhada ao limite de 1,5°C:
Vários países do G20 apresentaram NDCs mais ambiciosas, que estreitam a lacuna em relação ao limite de 1,5°C. Até o momento, embora não estejam totalmente alinhados a esse limite, Argentina, Canadá, União Europeia e EUA estabeleceram metas para 2030 mais fortes do que as apresentadas anteriormente, em suas NDCs de 2015. Já o Reino Unido estabeleceu uma meta para 2030 na faixa compatível com o limite de 1,5°C.
Japão, África do Sul e Coreia do Sul anunciaram a intenção de aumentar a ambição de suas metas até a COP26, mas ainda não as comunicaram formalmente à ONU. China, Índia, Arábia Saudita e Turquia ainda não enviaram NDCs atualizadas para 2030.
Outros países, incluindo Austrália e Indonésia, apresentaram planos climáticos que mantiveram para 2030 o mesmo nível de emissões que já haviam apresentado nas NDCs de 2015. A NDC atualizada da Rússia é levemente mais ambiciosa do que a anterior, mas ainda permite que em 2030 as emissões estejam mais altas do que as projeções das políticas atuais do país. Na mesma linha, Brasil e México enviaram NDCs atualizadas com metas para 2030 que permitem uma quantidade de emissões maior do que as apresentadas em suas NDCs anteriores.
Além disso, o relatório observa que, embora muitas das metas de emissões líquidas zero estabelecidas por alguns países do G20 tenham ajudado a reduzir os níveis de temperatura projetados, esses países precisarão fazer cortes consideráveis nas emissões a partir de 2030 para chegar a emissões líquidas zero em 2050. Em muitos casos, reduções tão acentuadas desafiam ou simplesmente estão além do que os modelos globais consideram viável. O G20 precisará cortar rapidamente as emissões ainda na década de 2020 para melhorar a credibilidade de suas metas de emissões líquidas zero.
Além de reduções de emissões mais profundas por parte dos países do G20, o que mais precisa acontecer para limitar o aquecimento a 1,5°C?
Sem uma ação ambiciosa por parte dos países do G20, limitar o aquecimento a 1,5°C está fora de cogitação. E, para fechar totalmente a lacuna restante de 1,7°C para 1,5°C, também precisaremos de ações de países de fora do G20, além de cortes nas emissões do transporte aéreo e marítimo internacional. De forma animadora, vários países não pertencentes ao G20 já demostraram liderança ao propor compromissos robustos para reduzir as emissões até 2030 e adotar metas de emissões líquidas zero.
No entanto, uma ação ambiciosa por parte dos países em desenvolvimento exigirá que as nações desenvolvidas, além de estabelecer as próprias metas de redução de emissões, forneçam um financiamento climático adequado – começando por compensar os US$ 100 bilhões que se comprometeram a fornecer anualmente até 2020.
O que as principais economias devem fazer agora?
Ainda este mês, uma pesquisa global descobriu que 74% das pessoas que vivem nos países do G20 apoiam a ideia de que as prioridades econômicas nacionais “vão além do lucro e do aumento da riqueza para se concentrarem mais no bem-estar humano e na proteção ambiental”. Nossa pesquisa mostra o papel fundamental que o G20 pode desempenhar para proteger o futuro do planeta e manter o aumento da temperatura global em níveis seguros. O que o mundo precisa agora é de uma liderança ousada do G20 para nos colocar em um caminho seguro e resiliente ao clima.
A Assembleia Geral da ONU, a Cúpula do G20 em Roma, em outubro, e a COP26 em novembro são oportunidades cruciais. As ações que os países do G20 devem tomar antes disso incluem:
Submeter NDCs que aprofundem as reduções de emissões para 2030 de forma significativa; Comprometer-se com metas de emissões líquidas zero até 2050 e garantir que os objetivos para 2030 estejam alinhados com essas metas de longo prazo; Cumprir as promessas de financiamento público para o clima (países desenvolvidos) e mobilizar financiamento privado.
Ainda é possível limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C, mas essa janela está se fechando rápido. Os países do G20 precisam tomar a frente para manter essa janela aberta e garantir um futuro mais seguro para todos.
Este artigo foi publicado originalmente no Insights. Licenciado sob Creative Commons Attribution-NoDerivatives 4.0 International License.