A agricultura celular faz parte da quarta revolução agrícola, que busca melhorar a segurança alimentar, a sustentabilidade e as condições de trabalho
Agricultura celular é o nome dado à técnica de produção agrícola com células. Ela faz parte de um conjunto de tentativas de encontrar novas maneiras de produção de alimentos, sem usar animais de criação. A ideia é produzir produtos de origem animal sem a necessidade de criação, abate e processamento.
A agricultura celular visa desestabilizar as formas convencionais de produção de produtos de origem animal, com o objetivo de reduzir o número de animais mortos para alimentação e criar um sistema alimentar global mais sustentável e ético.
A pecuária desempenha um importante papel no sistema alimentar global. Dados da Food and Agriculture Organization indicam que ela fornece um terço da proteína alimentar global, sustenta a subsistência de mais de um bilhão de pessoas e contribui para a fertilidade do solo.
No entanto, a criação de gado é responsável por cerca de 14,5% das emissões globais de gases do efeito estufa, o que provoca diversos impactos ao meio ambiente e à saúde humana.
Impactos da pecuária
A pecuária contribui para o agravamento das mudanças climáticas por meio da liberação descontrolada de metano, um gás de efeito estufa 20 vezes mais potente do que o dióxido de carbono. O aumento da demanda aumentará significativamente os níveis de metano, dióxido de carbono e óxido nitroso e causará perda de biodiversidade.
Outro grande problema causado pela indústria agropecuária é o elevado consumo de água. Cultivar plantas para a alimentação animal representa 56% de toda a água consumida nos EUA. O cultivo de grãos consumidos pelos animais demanda uma quantidade enorme de água, que, somada ao consumo direto dos bichos, representa, segundo um estudo, faixas de consumo de água de 34-76 trilhões de litros por ano.
Além disso, a pecuária é a principal causa da extinção de espécies, geração de zonas mortas nos oceanos, poluição da água e destruição de habitats. O uso disseminado de pesticidas, herbicidas e fertilizantes químicos utilizados na produção de culturas para alimentação animal interfere nos sistemas de reprodução dos animais e na saúde do consumidor final. Segundo um relatório da organização Mercy for Animals e um estudo publicado na revista científica Nova Economia, ela também é a principal causa direta de desmatamento na Amazônia.
Com o objetivo de reduzir os impactos, a agricultura celular usa culturas de células para produzir produtos animais sem criar gado, caçar ou pescar. Ela pode ajudar a atender à crescente demanda por proteína animal, bem como diminuir os impactos ambientais e os efeitos nocivos à saúde humana e ao bem-estar animal.
Como funciona?
A principal abordagem da agricultura celular consiste no uso do processo de fermentação avançada, onde leveduras, fungos e bactérias são geneticamente modificados para produzir proteínas.
Ele é diferente do método de fabricação de cerveja, já que emprega micro-organismos altamente especializados e que seguem instruções que foram adicionadas ao seu código genético.
A carne de laboratório é um exemplo de aplicação da agricultura celular.
Carne de laboratório como exemplo
A carne cultivada é produzida a partir de células animais, começando com a retirada indolor de uma amostra de tecido muscular de um animal vivo, que é então transformada em massas de células. Amostras de vacas, galinhas, coelhos, patos, camarões e até atuns foram levadas a laboratórios na tentativa de recriar partes de seus corpos sem ter de criar, confinar ou abater os próprios animais.
Em 2013, Mark Post, professor da Universidade de Maastricht, apresentou o primeiro “hambúrguer de laboratório”, ou seja, produzido a partir de carne cultivada. A experiência, financiada por Sergey Brin, co-fundador do Google, foi resultado de 5 anos de pesquisa e surgiu a partir da reprodução de células-tronco bovinas, cultivadas e alimentadas com nutrientes em laboratório.
Desafios
As barreiras para que produtos de origem animal produzidos com células cheguem ao mercado são significativas. Atender aos padrões alimentícios estabelecidos e equilibrar os custos associados às tecnologias envolvidas na produção dos produtos são as principais delas.
Outro desafio é o fato da agricultura celular envolver o uso de organismos modificados geneticamente. Estudos afirmam que eles podem trazer sérias consequências à saúde humana e ao meio ambiente, como alergias, câncer, resistência à antibióticos, aparecimento de pragas e perda de biodiversidade. Nesse sentido, o Greenpeace sugere que a produção e o consumo de organismos modificados geneticamente devem estar baseados no princípio da precaução e na bioética.
Se essas barreiras puderem ser superadas, parece haver pessoas dispostas a consumir os alimentos derivados da agricultura celular. Um estudo realizado entre consumidores ingleses estimou que a carne de laboratório poderá compor até 40% do consumo anual de carne do país, considerando a disposição do público para experimentar produtos cultivados em laboratório.