Imagem de Bruno Vitor Gomes Prado no Unsplash
A superexploração de águas subterrâneas no Brasil está alterando o fluxo de rios e ameaçando a segurança hídrica do país. Pesquisa publicada na Nature Communications aponta que mais da metade dos cursos d’água nacionais pode perder volume devido à transferência de líquido para aquíferos, agravada pela perfuração ilegal de poços. Com 88% dos 2,5 milhões de poços tubulares operando fora da legalidade, o bombeamento descontrolado atinge 17,6 bilhões de metros cúbicos anuais – volume suficiente para abastecer toda a população brasileira.
A bacia do rio São Francisco e a região do Matopiba, polo agrícola que abrange Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, destacam-se como áreas críticas. No primeiro caso, 61% dos rios analisados apresentam risco de redução de vazão, enquanto no afluente Verde Grande, entre Minas Gerais e Bahia, o índice chega a 74%. A irrigação extensiva, aliada à falta de regulação, pressiona aquíferos e compromete a recarga natural dos rios. Projeções indicam que as áreas irrigadas no país devem aumentar mais de 50% nas próximas duas décadas, intensificando o problema.
Além de reduzir a disponibilidade de água para consumo humano e ecossistemas, a extração desenfreada pode provocar subsidência do solo – fenômeno observado em países como Índia e Estados Unidos. No Cerrado, bioma responsável por 70% da produção nacional de milho e berço de aquíferos estratégicos, o avanço da agricultura irrigada altera a dinâmica entre águas superficiais e subterrâneas. “Mudanças no uso do solo e demandas crescentes por irrigação desafiam o equilíbrio hídrico na região”, alerta Paulo Tarso Sanches de Oliveira, hidrólogo da UFMS e coautor do estudo.
A pesquisa também destaca impactos diretos na saúde pública. Em 2017, moradores de um vilarejo em Alagoas tiveram casos de hiensão arterial ligados ao consumo de água salobra do rio São Francisco. A intrusão de água marinha, decorrente da redução da vazão fluvial, ilustra como a degradação hídrica afeta comunidades locais.
Para reverter o cenário, especialistas defendem a integração de políticas de gestão de águas superficiais e subterrâneas. Sensoriamento remoto e monitoramento hidrogeológico são apontados como ferramentas essenciais para identificar regiões prioritárias. “O Brasil tem potencial para expandir a irrigação com sustentabilidade, mas é preciso planejamento integrado”, afirma José Gescilam Uchôa, doutorando da USP e autor principal do estudo.
Com 15% da água doce renovável global, o país enfrenta desafios que exigem ação imediata. A crise hídrica, agravada pelas mudanças climáticas, demanda controle rigoroso sobre poços irregulares e investimento em tecnologias de gestão. Caso contrário, riscos à produção agrícola, geração de energia e biodiversidade tendem a se intensificar, afetando milhões de brasileiros.
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