Anéis de crescimento de árvores amazônicas são prova oculta de contaminação por mercúrio

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A exploração ilegal de ouro na Amazônia deixa marcas profundas não apenas no solo, mas também no ar. Um estudo recente revelou que os anéis de crescimento de árvores nativas podem funcionar como arquivos naturais da poluição por mercúrio, expondo os danos causados pela mineração artesanal e de pequena escala. A pesquisa, publicada na Frontiers in Environmental Science, analisou espécies da floresta peruana e confirmou que essas árvores registram a contaminação atmosférica ao longo do tempo.

O mercúrio é amplamente utilizado na extração ilegal de ouro, especialmente em operações clandestinas. Os garimpeiros misturam o metal tóxico ao solo para formar amálgamas com partículas de ouro, que depois são queimadas, liberando vapores perigosos. Esse processo não só degrada o ambiente como coloca em risco a saúde de comunidades locais, já que a inalação de mercúrio pode causar danos neurológicos graves.

A equipe de pesquisadores coletou amostras de três espécies tropicais: figueiras (Ficus insipida), castanheiras (Bertholletia excelsa) e tornillos (Cedrelinga catenaformis). Entre elas, apenas a Ficus insipida apresentou anéis de crescimento bem definidos, permitindo a análise histórica da contaminação. As amostras foram retiradas em áreas próximas a zonas de mineração e em locais distantes, como pontos de controle.

Os resultados mostraram que as concentrações de mercúrio eram mais altas nas árvores próximas aos garimpos, especialmente após o ano 2000, período em que a atividade se expandiu na região. Um dos locais analisados, próximo a uma floresta protegida, apresentou níveis menores, mas ainda assim significativos. A descoberta reforça a relação direta entre a proximidade de áreas de mineração e o aumento da poluição por mercúrio.

Apesar do potencial da técnica, há limitações. A localização exata dos garimpos ilegais muitas vezes é desconhecida, o que dificulta a precisão das medições. Mesmo assim, a análise dos anéis das árvores se mostra uma ferramenta valiosa para monitorar a dispersão do mercúrio na Amazônia, auxiliando no cumprimento da Convenção de Minamata, tratado internacional que busca reduzir os impactos do metal no meio ambiente e na saúde humana.

Com um custo relativamente baixo e ampla distribuição na região, árvores como a Ficus insipida podem se tornar aliadas no combate aos crimes ambientais, funcionando como testemunhas silenciosas da devastação causada pelo garimpo ilegal. A pesquisa abre caminho para estratégias mais eficazes de fiscalização e preservação da maior floresta tropical do mundo.

Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)