O que é o Antropoceno e suas fases

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Estamos vivendo no limiar de uma nova Era. As ações da espécie humana têm alterado drasticamente o funcionamento e os fluxos naturais do planeta ao promover intensas mudanças globais. Diversos especialistas afirmam que entramos no Antropoceno — que é uma época geológica marcada pela alteração irreversível dos processos biofísicos na escala de tempo geológico.

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Fases pré-Antropocênicas

Hipótese da fase pré histórica

Evidências sugerem que os humanos antigos (Homo erectus) utilizaram o fogo para modificar seu ambiente e cozinhar alimentos. Isso ocorreu entre 1,8 milhão de anos até 300 mil anos atrás. E teria influenciado a evolução da espécie e o crescimento do tamanho do cérebro.

A tese mais aceita atualmente afirma que os humanos modernos (Homo sapiens) evoluíram na África há aproximadamente 200 mil anos. Desde então, realizaram migrações para outros continentes. É reconhecido que esses humanos desempenharam um papel importante na alteração da biodiversidade. Mas também das paisagens em ilhas e continentes durante os últimos 50 mil anos.

Eles foram indicados como os responsáveis pelo declínio e pela total extinção de centenas de espécies de grandes mamíferos (chamados de megafauna) em toda a América do Norte e do Sul, Eurásia, Austrália e em muitas ilhas oceânicas. Apenas na África e nos oceanos a megafauna escapou da extinção em larga escala. Apesar disso, atualmente, centenas de grandes espécies de mamíferos se encontram sob intensa pressão no continente africano.

Ainda que os seres humanos tenham contribuído para o aumento das taxas de extinção da megafauna, as mudanças climáticas também são possíveis responsáveis. Portanto, ao considerar as extinções da megafauna em todo o mundo, parece provável que o clima e a atividade antropogênica atuaram em conjunto.

Revolução Agrícola

Imagem de Bence Balla-Schottner no Unsplash

A expansão da agricultura em múltiplas regiões ao redor do planeta provocou impactos significativos sobre as paisagens. Assim como a biodiversidade e a composição química atmosférica desde o início do Holoceno.

A Revolução Neolítica (8 mil anos atrás) gerou o desmatamento de áreas de florestas e a queimada de terrenos para o aprimoramento de terras agrícolas. Esse fato levanta a hipótese de que essa baixa nas florestas teria levado a um aumento geral de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. Assim, contribuindo para um aumento das temperaturas globais, ainda que de maneira reduzida.

Cerca de três mil anos depois disso, a expansão agrícola no sudeste da Ásia levou ao cultivo generalizado de arroz em campos alagados. E, possivelmente, a aumentos globais nas concentrações de metano (CH4). Embora ainda haja debate a respeito da contribuição destas práticas de uso da terra para as precoces concentrações dos gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera durante o Holoceno, a crescente alteração humana da paisagem é cada vez mais reconhecida.

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Fases do Antropoceno

Primeira fase

De acordo com Paul J. Crutzen, vencedor do Prêmio Nobel de Química de 1995, o início do Antropoceno ocorreu por volta de 1800, com a chegada da sociedade industrial, caracterizada pela utilização maciça de hidrocarbonetos (principalmente o petróleo para produção de energia e como fonte de matérias-primas).

Desde então, a concentração de dióxido de carbono na atmosfera, causada pela combustão desses produtos, não para de crescer. A grande concentração do grupo de gases do efeito estufa na atmosfera contribui como forte agravante para o aquecimento global.

Dessa forma, considera-se que a primeira fase do Antropoceno vai de 1800 a 1945 ou 1950 e corresponde, portanto, à formação da era industrial.

Durante grande parte da história humana, os níveis de crescimento populacional e consumo energético não se modificaram. O motivo principal era pelo fato das sociedades disporem de mecanismos ineficientes para fornecer energia, dependentes em grande parte de forças naturais (como o vento e água corrente) ou combustíveis orgânicos, como a turfa e o carvão.

Uma grande reviravolta teria ocorrido quando o inventor escocês James Watt realizou melhorias na máquina a vapor. Essa mudança, no final do século XVIII, permitiu uma maior eficiência no processo de geração de energia. Esse fato contribuiu para o início da Revolução Industrial.

Essa transformação pôde ser observada por meio de muitos exemplos. Um deles foi o fato de que, pela primeira vez, era possível utilizar energia suficiente para gerar fertilizantes a partir do nitrogênio atmosférico. Isso permitiu elevar a produtividade de terras agrícolas, e, juntamente com os avanços da medicina, garantiram um grande aumento das populações humanas.

Efeitos

A intensa queima de combustíveis fósseis levou a um consequente aumento nos níveis dos gases do efeito estufa na atmosfera. Já a intensificação de práticas agrícolas levou a um aumento nos níveis de metano (CH4) e de óxido nitroso (N2O) na atmosfera.

A intensificação do uso de combustíveis e atividades agrícolas também levou à produção de dióxido de enxofre (SO2) e óxidos nitrosos (NOx). E, uma vez na atmosfera, esses compostos convertem-se em sulfato (SO4) e nitratos (NO3) e provocam a acidificação de ecossistemas terrestres e aquáticos.

Segunda fase

A segunda fase vai de 1950 a 2000 ou 2015 e vem sendo chamada de “A Grande Aceleração”. Entre 1950 e 2000, a população humana dobrou de três bilhões para seis bilhões de pessoas. E o número de automóveis passou de 40 milhões para 800 milhões.

O consumo dos mais ricos se destaca do restante da humanidade, alimentado pela disponibilidade geográfica de petróleo abundante e barato no contexto do pós-Segunda Guerra (também chamado de Guerra Fria) e pela difusão de tecnologias inovadoras que catalisaram um vasto processo de consumo de massa.

Na segunda fase da Era Antropocênica (1945-2015), registrou-se uma aceleração considerável das atividades humanas sobre a natureza. “A grande aceleração se encontra em estado crítico”, afirmou Crutzen, porque mais da metade dos serviços fornecidos pelos ecossistemas terrestres já enfrentam degradação.

Vale ressaltar que, no período após a Segunda Guerra Mundial, foram criadas redes inteligentes e globais de comunicação e finanças. Diversos representantes de países se reuniram em Bretton Woods, em New Hampshire nos Estados Unidos, em 1944 (ainda antes do fim da Segunda Guerra), para reconstruir a economia global entre os países do bloco capitalista. Essa conferência proporcionou a criação do Fundo Monetário Internacional e eventualmente do Banco Mundial.

A conferência citada também possibilitou a troca de saberes entre diversos cientistas e engenheiros internacionais, permitindo a concretização de avanços tecnológicos, como o desenvolvimento de energia nuclear e a construção de plataformas de petróleo em águas profundas (que acabaram também se mostrando problemáticos em termos ambientais).

No início da década de 1960, os subsídios para a agricultura eram distribuídos em larga escala ao redor do globo. Isso resultou no intenso uso da terra e na constante aplicação de fertilizantes. Promovendo o rápido enriquecimento de nutrientes em ecossistemas de água doce e a diminuição da biodiversidade.

Grande Aceleração

A mudança na forma de se consumir energia e na maneira como a população passou a crescer foi tão dramática após a Segunda Guerra Mundial, a ponto desse período passar a ser conhecido como a “Grande Aceleração”.

Os impactos no meio ambiente, característicos desta época, incluem o aumento acelerado da emissão de gases do efeito estufa, o rápido aumento da poluição costeira e a exploração da pesca, e os aumentos preocupantes do número de espécies extintas. Esses impactos decorreram principalmente do crescimento da população, do elevado consumo de energia e das mudanças no uso da terra.

Na terceira fase, a partir de 2000 ou, segundo alguns, de 2015, a humanidade tomou consciência do Antropoceno. Na realidade, a partir dos anos 1980, os seres humanos começaram a tomar progressivamente consciência dos perigos que sua atividade produtiva de intenso padrão gerava para o planeta Terra. E também para a própria espécie, já que, com a destruição dos recursos naturais, ela não seria capaz de sobreviver.

Esforços globais nesse período geológico

Paul Crutzen e alguns especialistas detalharam os impactos que marcaram a entrada no Antropoceno. Segundo eles, após a humanidade ter modificado o ambiente como nunca foi feito antes é preciso agir rapidamente para tentar limitar os danos.

Em 2015, o mundo acompanhou o Acordo de Paris para definir objetivos e medidas práticas para conter as mudanças globais observadas. 

“Num certo sentido, o acordo sinaliza o reconhecimento quase unânime entre os países do mundo que é necessária uma urgente mudança em nível global para alterar a velocidade com que a humanidade está interferindo nos ciclos naturais do planeta. O desafio é estabilizar o sistema climático em curto intervalo de tempo, o que talvez seja o maior obstáculo que a humanidade coletivamente já enfrentou”, afirmou Carlos Nobre, pesquisador brasileiro do Grupo de Trabalho sobre o Antropoceno (AWG, na sigla em inglês).

Para os cientistas do AWG, o próximo passo rumo à oficialização da nova época geológica é definir os marcadores e uma data. Ela será considerada como o início oficial da época da humanidade.

As mudanças climáticas e os conflitos globais

Vemos hoje uma combinação explosiva entre os dilemas globais da crise climática e da desigualdade. Um grupo de dois bilhões de pessoas dispõe de um padrão de consumo elevado e se apropria dos consequentes benefícios materiais. Enquanto cinco bilhões vivem na pobreza e um bilhão na miséria absoluta. Nesse contexto, conflitos e desastres se tornam iminentes.

Um relatório preparado pelo Centro para o Clima e Segurança (Center for Climate and Security) identifica 12 “epicentros” nos quais a mudança do clima pode pressionar a segurança global, causando conflitos ao redor do mundo. Muitos desses epicentros decorrem da escassez de recursos naturais e do deslocamento de populações. Mas especialistas consideram a probabilidade de guerra nuclear e outras pandemias como fatores decisivos para definir locais que apresentam risco de conflitos.

Um exemplo desse risco são as nações-ilhas, como as Maldivas, que poderiam desaparecer sob o crescente nível do mar. Certamente isso representaria uma crise para a comunidade internacional, que nunca tratou de um Estado desaparecido e não tem normas legais para o reassentamento de refugiados nessa situação. Outro exemplo foi o aumento do risco nuclear caso os reatores voltem a se espalhar para reduzir as emissões dos combustíveis fósseis.

Problemas relacionados ao acesso à água e à sua escassez também podem representar desafios e conflitos em territórios. Atores não estatais já buscam o domínio sobre a água para controlar populações locais (como o desvio de cursos d’água escassos). Já foi possível observar atritos entre o Egito e a Etiópia pelo uso do rio Nilo.

Como enfrentar os desafios?

Apesar disso, especialistas têm apontado a arqueologia como excelente opção para enfrentar desafios do Antropoceno. Segundo os pesquisadores, a arqueologia pode fornecer insights sobre fatores que apoiam a sustentabilidade e fatores que funcionam contra ela.

Para isso, as pesquisas se baseiam em informações sobre as maneiras como as pessoas no passado:

  • Enriqueciam o solo;
  • Evitavam incêndios destrutivos;
  • Criavam cidades mais verdes.

Trata-se, assim, de reunir o melhor do passado, presente e futuro para direcionar a humanidade para um caminho responsável e construtivo. Enfrentando as mudanças climáticas e outros desafios do Antropoceno.

Se você quiser se aprofundar nas relações entre a mudança do clima e os conflitos globais, confira a revisão publicada em Adelphi.

Confira um vídeo sobre o Antropoceno. Para saber mais sobre ele, acesse: “Bem-vindo ao antropoceno: vídeo mostra os efeitos da ação da humanidade sobre a Terra“.

Equipe eCycle

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