Possíveis saídas de acordos e revogações enfrentam desafios legais e econômicos
O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, batizado por alguns ambientalistas de “trumpocalipse”, pode acarretar um novo retrocesso nas políticas climáticas do país, afetando acordos internacionais e financiamentos voltados à energia limpa e ações climáticas globais. Contudo, ao contrário do que muitos imaginam, reverter os avanços alcançados em leis ambientais e energéticas durante o governo Biden não será uma tarefa simples, exigindo maioria legislativa para cancelar leis e enfrentar compromissos internacionais já firmados. Além disso, embora os EUA seja um dos países com a maior pegada ambiental, a agenda climática global já não depende mais de uma única nação.
Em 2017, Trump cumpriu sua promessa de retirar os EUA do Acordo de Paris. Agora, essa saída poderia ser repetida, acompanhada por uma medida ainda mais extrema: o abandono da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), que sustenta a base das negociações climáticas globais desde 1992. Tal retirada seria uma ruptura significativa e exigiria consentimento do Senado para que futuras administrações reconduzissem o país ao tratado, prejudicando a liderança global dos EUA no combate às mudanças climáticas.
Apesar de ser um xenófobo confesso, Trump também persegue os povos nativos, em sua primeira eleição diminui a Reserva Nacional Bears Ears em 85%. Criada durante a administração Obama para proteger 5,4 mil quilômetros quadrados de terras sagradas e culturais para os povos indígenas, a área foi reduzida para pouco mais de 800 quilômetros quadrados, fragmentando o território e liberando grande parte para exploração de petróleo, gás e mineração. Essa medida gerou forte reação da relatora especial da ONU sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, que condenou a redução como um “tremendo retrocesso” para a proteção de direitos indígenas, expondo milhares de sítios arqueológicos e terras sagradas a riscos de profanação e destruição. Essa inércia norte-americana pode abrir caminho para que potências como a China e o Brasil assumam a vanguarda climática, desencadeando uma nova dinâmica internacional.
Nesse novo mandato, Trump poderá visar diretamente a produção de combustíveis fósseis, propondo medidas para ampliar a exploração de terras federais, diminuir regulações e apoiar a construção de novos terminais de exportação de gás natural liquefeito (GNL). Em um cenário global onde os Estados Unidos já são os maiores produtores de petróleo, a viabilidade de expandir essa produção permanece incerta, pois, além da provável resistência do mercado, empresas de petróleo e gás têm priorizado recompra de ações e dividendos, refletindo um panorama de menores expectativas para investimentos de longo prazo. Tarifas sobre importações, sugeridas por Trump, também poderiam reduzir a demanda de petróleo, impactando diretamente o setor.
Outra política que deve ser afetada é a taxa federal sobre emissões de metano — um importante regulador ambiental estabelecido pela administração Biden para controlar as emissões de gases de efeito estufa de instalações específicas. Trump sinaliza interesse em revogar essa medida, uma vez que o metano, apesar de ser o principal componente do gás natural, é um dos gases mais potentes no aquecimento global.
Para além dos combustíveis fósseis, há o compromisso crescente dos EUA com o financiamento global de ações climáticas. O governo Biden aumentou significativamente as contribuições ao Fundo Verde para o Clima, destinando bilhões de dólares para apoiar o desenvolvimento de energias renováveis em países emergentes. Com Trump, espera-se que esses investimentos sejam drasticamente reduzidos, o que poderá desacelerar o avanço de soluções sustentáveis em áreas dependentes desse suporte.
No entanto, a reversão de políticas energéticas nacionais pode ser uma batalha mais complicada. As grandes leis de investimento em infraestrutura e energia limpa, como o Infrastructure Investment and Jobs Act e o Inflation Reduction Act, exigem aprovação parlamentar para serem revogadas, e muitos dos estados que apoiam Trump são os principais beneficiários dessas leis. Isso cria um cenário paradoxal, pois a indústria de petróleo e gás, aliada de Trump, também recebe incentivos substanciais dessas legislações, especialmente em iniciativas de captura de carbono e biocombustíveis avançados.
Mesmo que não consiga desfazer integralmente as políticas atuais, Trump poderá reduzir benefícios fiscais para veículos elétricos e desacelerar os avanços na regulamentação de emissão de poluentes veiculares, dificultando a competitividade dos veículos movidos a bateria. Ao mesmo tempo, ele pode atuar para reduzir o alcance do Escritório do Programa de Empréstimos do Departamento de Energia, que tem impulsionado setores de energia limpa com um orçamento ampliado em mais de 200 bilhões de dólares sob a gestão Biden.
Paradoxalmente, um segmento de energia que Trump tende a apoiar é a nuclear, reconhecida como uma alternativa limpa para reduzir as emissões. Em contraste, suas críticas à energia eólica e solar podem atrasar investimentos em renováveis, embora, no contexto atual, essas tecnologias estejam se tornando financeiramente mais atraentes que combustíveis fósseis como carvão e gás.
Uma eventual retirada dos EUA do Acordo de Paris somada à volatilidade regulatória e às políticas econômicas de Trump poderão minar a confiança dos investidores e desviar recursos de fontes renováveis.