A astrobotânica é um tanto diferente do que é retratado no famoso filme de 2015, “Perdido em Marte”, entenda um pouco sobre essa área
Astrobotânica é um ramo da astrobiologia que estuda a vida vegetal e as interações entre plantas em ambientes espaciais. O termo foi cunhado pelo astrônomo soviético Gavriil Adrianovich Tikhov, em 1945.
A principal pesquisa de Tikhov centrou-se na procura de vida extraterrestre, particularmente na presença de vegetação em Marte. Durante o período, muitos astrônomos acreditavam na presença de canais na superfície do planeta, e que as variações de cor em sua superfície representavam mudanças da vegetação local.
Na Terra os pigmentos que as plantas usam para a fotossíntese (como a clorofila) refletem a luz vermelha (700–750 nm). A partir disso, o especialista teorizou que, se as luzes das estrelas refletissem de outros planetas um pico no espectro em 700-750 nm, isso indicaria a presença de vegetação.
Porém, durante a observação, Tikhov não detectou a presença de clorofila no planeta. Portanto, mudou sua pesquisa para a detecção de plantas sem clorofila, especialmente plantas que crescem em ambientes extremos, para estudar e medir o seu espectro de reflectância.
Durante seu período ativo, Tikhov foi responsável pela fundação do Departamento de Astrobotânica do Observatório de Alma-Ata, onde outros astrônomos, estudantes, biólogos, botânicos e físicos se uniram ao estudo. E, embora o departamento tenha sido desmanchado após a morte do especialista, o seu trabalho possibilitou a evolução da astrobotânica.
Astrobotânica moderna
A astrobotânica moderna concentra-se no uso de modelos para prever a habitabilidade de exoplanetas (planetas fora do sistema solar da Terra) e na busca por evidências de vida microbiana.
O interesse da população sobre esse meio de estudo ascendeu durante 2015, após o lançamento do filme de ficção científica “Perdido em Marte”, ou “The Martian”, do diretor Ridley Scott. A história é centrada na história do astronauta fictício Mark Watney, que, para sobreviver em Marte após uma missão espacial mal-sucedida, planta batatas no planeta vermelho.
Em meio a popularidade do filme, inúmeras pessoas começaram a se perguntar sobre a possibilidade desse cenário.
“Quando digo às pessoas que minha pesquisa é sobre plantas no espaço, alguém costuma perguntar: “Ah, como Perdido em Marte?” Estou sempre dividida entre responder ‘sim’ e ‘não’. A astrobotânica real é muito diferente das façanhas fictícias de Mark Watney, o botânico/engenheiro astronauta preso em Marte na história. No entanto, existem alguns paralelos definidos entre a vida e a ficção”, diz Aurora Toennisson, estudante do NC Space Plant.
No entanto, Toennisson e outros especialistas focam seus estudos na terra firme, e não no espaço. De fato, a maioria dos programas de astrobotânica são voltados para simulações de plantações extraterrestres.
“Os astrobotânicos têm alguns truques na manga para fazer as plantas terrestres “pensarem” que estão no espaço”, explica a estudante.
Modelos de plantações espaciais
Existem diversos modelos de plantações extraterrestres presentes no campo da astrobotânica. Um exemplo funciona na “Large Diameter Centrifuge” (LDC), da Estação Espacial Europeia (ESA).
Baseada no centro técnico ESTEC da ESA, na Holanda, a LDC é uma centrífuga de quatro braços com 8 m de diâmetro que possibilita o acesso a uma gama de hipergravidade de até 20 vezes a gravidade da Terra durante semanas ou meses de cada vez.
Lá, um time de pesquisadores da Universidade Mahidol, da Tailândia, exploram a plantação de farinha d’água em territórios extraterrestres. A farinha d’água é uma planta nativa da Ásia, conhecida por ser a menor planta com flores da Terra.
“Ficamos interessados na farinha d’água porque queríamos modelar como as plantas respondem às mudanças nos níveis de gravidade. Como a farinha de água não tem raízes, caules ou folhas, é basicamente apenas uma esfera flutuando em um corpo d’água. Isso significa que podemos concentrar-nos diretamente nos efeitos que as mudanças de gravidade terão no seu crescimento e desenvolvimento.
“Além disso, [a planta] produz muito oxigênio por meio da fotossíntese. E a farinha d’água também é uma boa fonte de proteína, consumida há muito tempo no nosso país – acompanhada de ovo frito na sopa, ou consumida como parte de uma salada. Você consome 100% da planta quando a come, por isso é uma promessa em termos de agricultura baseada no espaço”, diz Tatpong Tulyananda, líder da equipe da Universidade Mahidol.
É possível cultivar plantas em Marte?
No filme de Ridley Scott, o astronauta Mark Watney é capaz de cultivar batatas no solo de Marte — regolito. Porém, esse tipo de solo é caracterizado pela falta de nutrientes essenciais às plantas, má absorção de água e contaminação por metais pesados.
Além disso, a temperatura extremamente baixa do planeta, em combinação com altos níveis de radiação ultravioleta solar, tornariam o trabalho de cultivar plantas em Marte quase impossível.
E, embora, cientistas da NASA trabalhem na criação de plantas “modificadas”, capazes de sobreviver às condições extremas do planeta, acredita-se que esse seria um trabalho “colhido” no futuro.
Plantas extraterrestres
Enquanto a cultivação de plantas em território extraterrestre ainda é explorada, diversos programas já sucederam no campo da astrobotânica.
Durante a exploração espacial soviética, por exemplo, diversas sementes foram levadas em missões espaciais, em foguetes, e algumas até alcançaram a lua. A primeira estufa espacial, conhecida como Oasis, por exemplo, fez parte da primeira estação espacial, a Salyut 1, lançada em órbita em abril de 1971. Lá, cientistas realizaram a primeira tentativa de cultivar plantas no espaço.
Um modelo posterior do Oasis produziu os primeiros vegetais cultivados no espaço já consumidos por humanos, na Salyut 4, em 1975. Mas foi na micro estufa experimental Fiton-3, na estação Salyut 7, em 1982, que a primeira planta floresceu e produziu sementes no espaço — a planta Arabidopsis thaliana, comumente usada como “planta modelo” em experimentos de botânica.
Veggie – o programa de astrobotânica da NASA
Após o sucesso dessas plantações, diversos outros programas de astrobotânica possibilitaram o cultivo de plantas no espaço. Entre eles, está o famoso programa Veggie, da NASA, uma fonte de alimentos autossuficiente e sustentável para os astronautas da Estação Espacial Internacional.
Além disso, o programa oferece uma forma de entretenimento e relaxamento para os agentes espaciais, que se beneficiam com alguns dos efeitos da jardinagem à saúde humana.
“O Sistema de Produção de Vegetais, conhecido como Veggie, é uma horta espacial que reside na estação espacial. O objetivo do Veggie é ajudar a NASA a estudar o crescimento das plantas em microgravidade, ao mesmo tempo que adiciona alimentos frescos à dieta dos astronautas e aumenta a felicidade e o bem-estar no laboratório em órbita.
A horta vegetariana tem aproximadamente o tamanho de uma bagagem de mão e normalmente acomoda seis plantas. Cada planta cresce em um “travesseiro” cheio de meio de crescimento à base de argila e fertilizante. As almofadas são importantes para ajudar a distribuir água, nutrientes e ar em um equilíbrio saudável ao redor das raízes. Caso contrário, as raízes se afogariam na água ou seriam engolfadas pelo ar devido à forma como os fluidos no espaço tendem a formar bolhas.
Na ausência de gravidade, as plantas utilizam outros fatores ambientais, como a luz, para orientar e guiar o crescimento. Um banco de diodos emissores de luz (LEDs) acima das plantas produz um espectro de luz adequado ao crescimento das plantas. Como as plantas refletem muita luz verde e usam mais comprimentos de onda vermelhos e azuis, a câmara Veggie normalmente brilha em rosa magenta.”, explica o site da agência espacial.