É muito comum pensarmos que as bactérias são inimigas, mas nosso corpo abriga trilhões de micro-organismos, e a maior parte deles nos faz bem. Recentemente, um grupo de biólogos sintéticos (que combinam biologia e engenharia de nanopartículas em suas pesquisas) procurou utilizar os micróbios para o benefício humano por meio de modificações genéticas em bactérias, de modo que eles pudessem detectar câncer e diabetes em camundongos e humanos, respectivamente.
Essa história remonta ao longínquo ano de 1892, quando o cirurgião William Coley injetou colônias de bactérias em mais de 100 pacientes, a fim de que elas encolhessem tumores inoperáveis. Em algumas das tentativas, o tratamento chegou a funcionar – em parte porque os micróbios preferem tecidos de tumor (ricos em nutrientes e possuem poucas células imunológicas para derrubar os agentes patogênicos). Porém os resultados deixaram a desejar e, com o surgimento de outros tratamento mais efetivos, como quimioterapias, a técnica caiu em desuso.
Um estudo publicado na Science Translational Medicine, demonstra que biólogos sintéticos já começaram a modificar bactérias para prevenir e combater o câncer e outras doenças, de modo a secretar toxinas dentro dos tumores, por exemplo.
Sangeeta Bhatia, uma engenheira biomédica do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), em conjunto com seus colegas, trabalharam na detecção de câncer utilizando nanopartículas metálicas. Na presença de tumor, as partículas liberam o peptídeo (composto formado pela união de dois ou mais aminoácidos em ligações peptídicas), que pode ser encontrado na urina; entretanto, segundo Bhatia, este primeiro teste era muito superficial como indicador exato da doença.
Os pesquisadores sabiam que os micróbios têm uma certa “atração” por tumores, e que muitas vezes penetram na massa celular à medida que estes crescem e se replicam. Com isto, a equipe de Bhatia se juntou à de Jeff Hasty, bioengenheiro da Universidade da California de San Diego (UCSD).
Juntos, reprogramaram geneticamente bactérias para que, quando dadas à camundongos como alimento, produzissem um sinal luminoso visível no teste de urina.
As pesquisas iniciaram usando uma espécie de bactéria inofensiva chamada Escherichia coli (presente em iogurtes) do tipo Nissle 1917.
Primeiro, as bactérias foram dadas aos camundongos e foi confirmado que atravessavam o trato intestinal e colonizavam tumores no fígado.
As bactérias então foram estruturadas para que produzissem uma enzima chamada LacZ ao encontrar tumores.
Em seguida, os pesquisadores injetaram nos camundongos compostos precursores de emissores de luz, que são moléculas feitas de uma parte de açúcar e de outra de luciferina (um composto capaz de produzir luz, mas que quando unido ao açúcar fica impotente). A enzima LacZ rompe a ligação entre os dois e permite que a luciferina emita luz.
Os ratos com câncer de fígado tiveram seus tumores povoados pelas bactérias E. coli; elas, estavam geneticamente modificadas para produzir a enzima LacZ, que romperia as ligações açúcar-luciferina, lançando o composto luminoso na urina, que de amarela passava a vermelha. O resultado foi positivo, o que proporcionou um diagnóstico muito mais exato que o anterior.
Bhatia relata que, enquanto os exames que usam imagem convencionais lutam para detectar tumores de fígado menores que 1 cm², esta nova técnica foi capaz de identificar tumores com 1 mm².
Em um estudo separado, liderado pelo bioquímico estrutural Jerome Bonnet, da Universidade Montpellier, seguiu uma estratégia parecida para detectar um sinal fundamental da diabetes: o já conhecido teor elevado de glicose presente na urina de pacientes humanos.
Neste caso, a intenção da equipe não era injetar E. coli no organismo, apenas adicioná-la a amostras de urina, causando alterações na coloração. Essa técnica não substitui medições padrão da glicose, mas o esquema de detecção pode ser reutilizado para encontrar outras doenças, servindo de plataforma para uma ampla gama de diagnósticos.
“Eles são ambos avanços agradáveis para o campo”, diz Jim Collins, biólogo sintético do MIT. Mas ele adverte que as abordagens continuam ainda muito distantes de serem aprovadas para uso clínico. Timothy Lu, também do MIT, concorda: “No seu conjunto, este par de papeis demonstra que a biologia sintética será útil não só para usos terapêuticos, mas para diagnósticos também”.
Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos.
Saiba mais