Por Gil Alessi em Repórter Brasil | O Banco Central do Brasil publicou na quinta-feira (29/6) uma resolução que veda a concessão de crédito rural para fazendas que possuem embargos ambientais em qualquer bioma. Na prática, a decisão amplia todos os ecossistemas brasileiros, uma medida que já era prevista para empreendimentos agrícolas localizados na Amazônia Legal.
O impacto mais celebrado por ambientalistas, entretanto, deve ser no Cerrado, onde o desmatamento do cresceu 25,29% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) – e parte dessa destruição ocorre em fazendas cuja produção é financiada por bancos que se aproveitavam dessa brecha legal, como mostrou no ano passado a Repórter Brasil.
“É um passo importantíssimo para apertar os desmatadores onde dói mais: no bolso. Deve inibir infratores de invadir terra pública e pegar empréstimo em banco depois”, afirma Suely Araújo, especialista-sênior em Políticas Públicas do Observatório do Clima. Mas ela destaca que para ser eficaz, a medida precisa ser combinada “com ações de incentivo a quem produz dentro da lei”.
O desmatamento do Cerrado em 2022 foi o maior registrado nos últimos seis anos, mas ao contrário do que acontece com a Amazônia, não reduziu com a mudança de governo e o fortalecimento de políticas de combate aos crimes ambientais. Apenas no primeiro trimestre deste ano, o desmatamento do bioma cresceu 35%, de acordo com informações do Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado.
Além de ser a savana mais biodiversa do planeta e lar de animais em risco de extinção, como o lobo guará e o tamanduá bandeira, o Cerrado é conhecido como “o berço das águas” por abrigar as nascentes de importantes bacias hidrográficas brasileiras, tais como a Amazônica, a do rio São Francisco e a do Parnaíba.
A proteção do Cerrado e dos demais biomas brasileiros não é a única novidade da resolução. “A exclusão de imóveis sobrepostos a florestas públicas do crédito rural é fundamental. Era uma proposta antiga de especialistas, que enxergavam nesse processo a combinação de dois crimes: a grilagem e o desmatamento”, diz Beto Mesquita, da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura.
Mas existe um ponto da resolução que inspira preocupação: “Ela veda a concessão de crédito para imóveis que tenham sobreposição com terras indígenas, mas apenas as homologadas, que já passaram por todo o processo de titulação. E nós entendemos que as áreas que estão nas fases iniciais de demarcação também deveriam ter uma atenção maior”, diz Mesquita. “Esperamos que esse ponto avance nas próximas resoluções”.
Em dezembro de 2022, a Repórter Brasil mostrou que três fazendeiros com embargos ambientais no cerrado haviam recebido R$ 8,7 milhões em financiamentos do BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Estes produtores rurais desmataram milhares de hectares de mata nativa. Os produtos destas fazendas terminaram, inclusive, na cadeia produtiva de grandes traders do setor agropecuário.
À época, o BNDES afirmou que as instituições financeiras parceiras, que na prática operacionalizam o empréstimo, são as responsáveis pela análise e acompanhamento do uso do recurso até o fim do contrato – e em caso de descumprimento, elas podem ser penalizadas.
Mas mesmo a regra antiga – que vedava empréstimos a produtores que desmataram a Amazônia – não era cumprida totalmente, como revelado pela Repórter Brasil, que apontou financiamento de R$ 29 milhões do BNDES para desmatadores comprarem tratores.
Este texto foi originalmente publicado pelo Repórter Brasil de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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