Algumas empresas adotam discursos em prol da responsabilidade social mas, na prática, a realidade é outra
Bluewashing significa “lavagem azul”, em tradução livre. É uma prática enganosa, realizada por empresas que promovem, em suas ações publicitárias, práticas de responsabilidade social, mas agem em desacordo com todas elas.
O termo bluewashing é derivado de outro: greenwashing. O greenwashing (lavagem verde) ocorre quando as empresas se intitulam sustentáveis e prometem ações a favor do meio ambiente, mas apenas enganam os consumidores, enquanto visam os lucros dessa publicidade ilusória. Seguindo o mesmo raciocínio, substitui-se o “green” pelo “blue”, por uma associação com a cor azul da bandeira da Organização das Nações Unidas (ONU), entidade reconhecida pelo trabalho pautado na causa social.
De acordo com a Dra. Irene Garmelo-Gomez, da Henley Business School, na Inglaterra, organizações de diversos segmentos se comprometem com metas e planos propostos pela ONU, como o Pacto Global ou os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Por outro lado, apesar de usarem as propostas incansavelmente em suas publicidades, pouca (ou nenhuma) ação é praticada.
Bluewashing e ESG
Também conhecido por socialwashing, o bluewashing está diretamente relacionado ao “Social” do ESG (Environmental, Social and Governance). A sigla foi criada por volta de 2005, pelo ex-secretário geral da ONU, Kofi Annan. ESG é um conjunto de boas práticas de governança corporativa, com foco no desenvolvimento sustentável e socialmente responsável.
O termo ESG surgiu pela primeira vez num relatório publicado pela ONU, em conjunto com o Banco Mundial, o Who Cares Wins. Uma provocação, endereçada aos 50 CEOs das maiores financeiras do mundo, desafiava as corporações pela integração de fatores ambientais, sociais e de governança aos seus negócios.
Já em 2020, a prática foi impulsionada graças a uma carta aberta de Larry Fink, CEO de uma das mais importantes investidoras do mundo. Na carta, Fink relacionou lucro a propósito, dando importância ao tripé da sustentabilidade na condução dos negócios. Desde então, empresas do mundo todo passaram a aderir a prática de ESG. Mas algumas, só na propaganda.
ESG washing
Segundo Gomez, pautas sociais e ambientais estão em alta, o que contribui para a conscientização de parte da população. Por sua vez, nessa busca por sustentabilidade e responsabilidade social, a pressão sobre as empresas aumenta.
Desse modo, as corporações passam a adotar práticas responsáveis e sustentáveis, e fazem questão de mostrar para o público que são empresas conscientes. O problema mora justamente aí. Muitas empresas dizem implantar práticas ESG, prometem mais do que cumprem ou simplesmente enganam os consumidores.
Nesse sentido, os consumidores iludidos com a publicidade enganosa podem acabar contribuindo, sem saber, para práticas que impactam de forma negativa o meio ambiente (greenwashing) ou apoiando empresas que atuam com violações aos direitos sociais (bluewashing) e ainda, que ferem causas ligadas a comunidade LGBT+ (pinkwashing).
A especialista aponta que muitas empresas, principalmente da indústria da moda, praticam o bluewashing. Em específico, nas questões que ferem os direitos humanos, com jornadas abusivas de trabalho a custos ínfimos, sem suporte ou benefícios sociais.
Pacto Global
O Pacto Global da ONU é uma iniciativa para a prática de sustentabilidade corporativa. O objetivo é promover dez princípios relacionados a trabalho, direitos humanos, meio ambiente e anticorrupção entre empresas e outras organizações.
A proposta reforça que as práticas de governança são fundamentais para a manutenção da ética, dentro e fora das organizações. Além disso, seguir esses princípios é uma forma de garantir que os negócios sejam feitos de forma consciente, respeitando o meio ambiente e a sociedade, evitando riscos para a organização. O Pacto Global abrange 160 países e conta com mais de 21 mil membros. O Brasil participa com mais de 2 mil empresas.
No Brasil, a iniciativa atua com 11 dos 17 ODSs. Os temas de atuação são Água e Oceanos, Contra a Corrupção, Direitos Humanos, Clima, Agricultura Sustentável e Comunicação e Engajamento de Stakeholders.
Socialwashing
Um artigo, publicado pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), analisou o papel das práticas ESG aplicadas ao princípio dos direitos humanos, do Pacto Global da ONU.
Segundo a publicação, as organizações que aderem ao Pacto Global acreditam estarem prontas para demonstrar, com suas ações, que podem fazer a diferença na sociedade, e sabem que serão avaliadas por seus atos. Ainda, essas ações tendem a influenciar positivamente seus stakeholders.
Funcionários, gestores, executivos, acionistas e proprietários, os próprios sindicatos trabalhistas, além de clientes, fornecedores, governos e seus órgãos, e a sociedade civil podem formar os stakeholders de uma organização.
Uma coisa leva a outra, e quando as organizações passam a se envolver com questões de cooperação, comportamento ético e solidariedade, elas passam a desempenhar um papel integrador na sociedade.
Por outro lado, muitas organizações ferem os direitos humanos, tendo uma visão absolutamente voltada para o lucro. O artigo cita como exemplo a pandemia de Covid-19, demonstrando o desequilíbrio nessas relações. Na época da pandemia, quando tantas pessoas perderam o emprego, as dez empresas com as maiores receitas do mundo ficaram ainda mais ricas.
A importância da responsabilidade social corporativa se justifica à medida que as ações das organizações podem violar, direta ou indiretamente, os direitos humanos. Nesse ponto, o consumidor desempenha um papel fundamental, buscando informações e garantindo contribuir com empresas sérias que desviem de práticas de lavagem, como o bluewashing.