Ciclo do microplástico: o que é importante saber

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Ciclo do microplástico é um conceito que se refere a todo caminho feito por utensílios de plástico fragmentados que, em vez de retornarem para a cadeia de produção, foram parar no ambiente.

De acordo com uma pesquisa realizada pela Universidade de Utah, no Estados Unidos, o ciclo do microplástico envolve escalas extremamente grandes.

Os microplásticos estão por toda a parte

Segundo os pesquisadores, um canudo descartado em 1980 ainda existe em forma de microplástico em sistemas como as correntes oceânicas. Ele ainda pode estar presente na atmosfera e no solo.

“Os microplásticos são tão difundidos que agora afetam o modo como as plantas crescem, flutuam no ar que respiramos e permeiam ecossistemas distantes. Eles podem ser encontrados em locais tão variados quanto a corrente sanguínea humana e as entranhas de insetos na Antártica.”, afirmou Janice Brahney em entrevista ao Science Daily.

O canudo é o principal problema?

Longe do que o senso comum imagina, apesar de prejudicial, o canudo não é a maior fonte de microplástico ambiental.

Boa parte da contribuição desse poluente provém do desgaste de pneus no asfalto, embalagens de alimentos, garrafas de refrigerante e sacolas plásticas. Os microplásticos destes materiais boiam na superfície das ondas e acabam sendo carregados pelo vento para a atmosfera, onde permanecem por até uma semana até serem carregados para outro sistema.

Outra fonte importante de emissão de plásticos é a poeira produzida nos campos agrícolas. Os plásticos são introduzidos no solo quando fertilizantes de operações de tratamento de resíduos são usados, prática também conhecida como plasticultura.

Tóxicos

Quando escapa para o ambiente, o microplástico atua como captador de poluentes orgânicos persistentes (POPs) altamente nocivos. Dentre esses poluentes estão os PCBs, os pesticidas organoclorados, o DDE e o nonilfenol.

Os POPs são tóxicos e estão diretamente ligados a disfunções hormonais, imunológicas, neurológicas e reprodutivas. Eles ficam durante muito tempo no ambiente e, uma vez ingeridos, têm a capacidade de se fixarem na gordura do corpo, no sangue e nos fluidos corporais de animais e humanos.

Estão presentes nos humanos

Ingerir microplásticos contaminados não é muito difícil, uma vez que, desde o final da II Guerra Mundial, eles já estão contaminando o ambiente e agora fazem parte da cadeia alimentar.

Entenda o impacto ambiental do lixo plástico para cadeia alimentar

Na Indonésia, trabalhadores da pesca já estão consumindo mexilhões contaminados por microplásticos. Mas não é somente na Indonésia, no Reino Unido e na Austrália, os mexilhões também estão contaminados por microplásticos. Quem come frutos do mar regularmente ingere cerca de 11 mil pedaços de microplásticos por ano.

Uma pesquisa revelou que o microplástico também pode ser facilmente encontrado na placenta humana.

Bisfenóis

Os bisfenóis, utilizados em larga escala pela indústria, estão presentes em tintas, resinas, latas, embalagens e materiais de plástico em geral. Quando escapam para o ambiente, colados nos microplásticos, além da poluição visual (antes de ser tornarem microplásticos) e física que causam, geram poluição química. Uma vez no ambiente e no organismo, o bisfenol se comporta como um disruptor endócrino, podendo causar esterilização, problemas comportamentais, diminuição da população, entre outros.

Conheça os tipos de bisfenol e seus riscos

Risco para a vida animal

Quando os microplásticos contendo bisfenol vão parar no ambiente, podem causar reduções em populações de golfinhos, baleias, veados e furões, prejudicar o desenvolvimento de ovos de aves, causar deformidades sexuais em répteis e peixes, alterações na metamorfose de anfíbios e muitos outros danos. Três pesquisas realizadas na Universidade Federal do Pará (UFPA) mostraram que 30% dos peixes amazônicos têm o intestino contaminado por microplásticos.

Prejuízos à saúde humana

Os alimentos embalados por recipientes contendo bisfenol se contaminam e, quando os consumimos, ingerimos também o bisfenol, cujo consumo está, comprovadamente, associado a diabetes, síndrome do ovário policístico, câncer, infertilidade, doenças cardíacas, fibromas uterinos, abortos, endometriose, déficit de atenção, entre outras doenças. Uma pesquisa confirmou que o intestino humano está repleto de microplásticos. Muitos deles, com o já mencionado bisfenol.

Como o ciclo do microplástico se inicia?

Na lavagem das roupas

Parte significativa das roupas são compostas por fibras têxteis sintéticas de plástico – um exemplo é o poliéster. Durante a lavagem das roupas, por meio do choque mecânico, os microplásticos se desprendem e acabam sendo enviados para o esgoto, indo parar em corpos hídricos e no ambiente. Se você achou isso um exagero, dê uma olhada neste estudo, que revelou que as lavagens de roupas feitas com fibras sintéticas soltam microplásticos.

Pesca fantasma

A pesca fantasma, também chamada de ghost fishing em inglês, é o que acontece quando os equipamentos desenvolvidos para capturar animais marinhos como redes de pesca, linhas e anzóis são abandonados, descartados ou esquecidos no mar. Esses objetos, na maioria da vezes feitos de plástico, colocam em risco toda a vida marinha, pois uma vez preso nesse tipo de engenhoca, o animal acaba ferido, mutilado e morto de forma lenta e dolorosa. Sem lucrar nem alimentar ninguém, a pesca fantasma afeta cerca de 69.000 animais marinhos por dia no Brasil. Para, no fim das contas, ser outra fonte de microplástico. Estima-se que 10% do plástico presente no oceano tem origem na pesca fantasma. Saiba mais sobre esse tema na matéria: “Pesca fantasma: o perigo invisível das redes pesqueiras“.

No ar

As fibras têxteis de plástico, como a poliamida, também vão parar no ar. Um estudo realizado em Paris, na França, estimou que a cada ano cerca de três a dez toneladas de fibras plásticas chegam nas superfícies das cidades. Uma das explicações é que o simples atrito de um membro do corpo com o outro, quando a pessoa está vestida com roupas de fibras têxteis sintéticas plásticas, já seria o suficiente para dispersar os microplásticos na atmosfera. Essa poeira de microplásticos pode ser inalada, juntar-se ao vapor e ir parar na sua xícara de café e no seu prato de comida, por exemplo.

No atrito dos pneus

Os pneus de carros, caminhões e outros veículos são feitos de um tipo de plástico chamado estireno butadieno. Ao passarem pelas ruas, o atrito desses pneus com o asfalto gera 20 gramas de resíduos microplásticos a cada 100 quilômetros percorridos. Para se ter uma ideia, na Noruega, é gerado um quilo de resíduos microplásticos de pneu por ano por pessoa.

Tintas látex e acrílicas

Uma reportagem investigativa mostrou que a tinta plástica utilizada em casas, carros e navios desprende-se destes por meio de intempéries e vai parar no oceano, formando uma camada bloqueadora de microplásticos na superfície do mar. A isto, podemos acrescentar as tintas látex e acrílicas utilizadas em artesanatos e os pincéis lavados nas pias.

Como fazer descarte de tinta

Microesferas dos cosméticos e produtos de higiene

Alguns sabonetes, cremes, pastas, géis e máscaras esfoliantes são um perigo para o ambiente. Esses produtos são feitos de microplásticos de polietileno que, após o uso, são despejados diretamente pela torneira na rede de esgoto. Mesmo quando há estações de tratamento, as microesferas de plástico dos cosmético não são retidas pela filtragem de partículas, pois são muito pequenas, e acabam indo parar no oceano. A boa notícia é que esses produtos já foram banidos em países como a Inglaterra.

Nurdles

Nurdles são pequenas bolinhas plásticas utilizadas na manufatura de vários itens plásticos. Diferente dos resíduos plásticos que se degradam até se tornarem microplásticos, os nurdles já são feitos com um tamanho reduzido (cerca de 5 mm de diâmetro). Eles são a maneira mais econômica de transferir grandes quantidades de plástico para fabricantes de uso final do material em todo o mundo. O problema é que navios e trens despejam acidentalmente essas bolinhas em estradas ou no mar; ou a parte que sobra da produção não é tratada adequadamente. Se alguns milhares de nurdles caem no mar ou em uma rodovia, é praticamente impossível fazer a limpeza. Em uma pesquisa realizada no início de 2017, foram encontrados nurdles em 75% das praias do Reino Unido.

Material semelhante aos nurdles são os pellets, feitos da mesma maneira mas em formato cilíndrico. Os pellets também vão parar no ambiente devido às perdas no transporte e contaminam corpos hídricos, solo e animais.

Descarte incorreto

Durante o ano, pelo menos oito milhões de toneladas de lixo de resíduos de plástico que foram descartados incorretamente (ou que escapam pelo vento) vão parar nos oceanos, lagos e rios do mundo todo.

Esses descartes, se fossem encaminhados corretamente para a reciclagem, poderiam voltar para a cadeia energética. Mas, uma vez no oceano, se fragmentam em microplásticos e acabam entrando na cadeia alimentar, inclusive na dieta humana.

Cada canudo, sacola, tampa, rótulo e embalagem descartados incorretamente se quebrarão e formarão microplásticos. O plástico não desaparece, só fica menor.

Canudinhos

Diariamente, são descartados um bilhão de canudinhos. Só no Estados Unidos, são jogados fora meio milhão de canudinhos por dia. Se utilizarmos de exemplo canudos de seis milímetros de diâmetro, o volume ocupado pelo total usado pelos brasileiros em um ano equivaleria a um cubo de 165 metros de aresta, 50 metros mais alto que o edifício Copan, em São Paulo. Estima-se que eles compõem cerca de 4% de todo o plástico encontrado no oceano. Quando vão parar no ambiente (mesmo quando descartados em aterros, podem ser levados pelo vento), antes de virarem microplásticos, acabam indo parar no organismo de animais, inclusive em narinas de tartarugas. Sabia mais sobre o tema na matéria: “Canudo de plástico: impactos e alternativas ao consumo“. https://e88188182f61eaaed2ea54f7f7e2842c.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

O que fazer?

  • O primeiro passo é diminuir o consumo de plástico na medida do possível;
  • Não consuma animais marinhos e contribua com iniciativas que retirem redes de pesca e outros plásticos do mar;
  • Evite consumir alimentos armazenados em recipientes de plástico;
  • Troque sua escova de dentes de plástico por uma de bambu;
  • Tente usar absorventes de pano ou coletor menstrual;
  • Se você é pai ou mãe, tente consumir fraldas biodegradáveis ou de pano;
  • No lugar de tecidos de fibra sintética, utilize algodão orgânico;
  • Quando comprar alimentos, cosméticos e produtos em geral, prefira aqueles que venham em embalagens de vidro, papel ou sem embalagens, como shampoos e sabonetes em barra;
  • Reutilize! Pratique o upcycling uma maneira de reinventar objetos;
  • Seja um praticante de plogging, a corrida sustentável
  • Tome cuidado com a reutilização de garrafinhas d’água, veja o porquê na matéria: “Garrafa de água de plástico: perigos da reutilização” – utilize garrafas não descartáveis para transportar sua água;
  • Zere o consumo de itens de plástico supérfluos, como, canudinhos, glitter, copos descartáveis, sacolas, etc;
  • Pegue e dê carona. Cada carro a mais é sinônimo de mais microplásticos no ar e na água;
  • Zere o consumo de cosméticos com esfoliantes sintéticos, substitua-os por receitas naturais, como a borra de café. Confira 6 receitas de esfoliantes caseiros;
  • Repense seu consumo e o que você pode fazer para reduzir o plástico presente na sua vida;
  • Dê prioridade aos plásticos biodegradáveis;
  • Descarte corretamente e encaminhe para reciclagem;
  • Conheça a New Plastics Economy, uma iniciativa que, aplicando os princípios da Economia Circular, reúne setores importantes do ramo do plástico para repensar e reformular o futuro, começando pelas embalagens;
  • Pressione empresas e governos para que diminuam o uso do plástico, utilizem embalagens retornáveis e com design menos nocivo (como embalagens com tampa acoplada) e garantam o retorno do plástico utilizado à cadeia de produção. Afinal de contas, nem todo plástico reciclável destinado corretamente é reciclado.
Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)

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