Com atividades lúdicas, as inteligências artificiais podem melhorar desenvolvimento cognitivo e ajudar em quadros de depressão de idosos
Por Camilly Rosaboni, do Jornal da USP | A ideia de robôs auxiliando humanos em suas demandas profissionais e pessoais pode não ser tão futurista quanto parece. Cientistas de um grupo de pesquisa na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, atuantes na área de Sistemas de Informação e Gerontologia, estão avaliando o uso de aplicações para robôs sociais ou robôs de companhia para auxiliar em atividades diárias, como cuidar de idosos. As máquinas simulam ações humanas e podem ajudar no engajamento social e qualidade de vida de idosos com problemas cognitivos e depressão.
Os pesquisadores da EACH têm apoio do Centro de Inteligência Artificial (C4AI) – fruto de uma parceria da IBM, da Fapesp e da USP – e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), – com dois financiamentos aprovados, sob a responsabilidade da professora Meire Cachioni – para juntar robôs sociais e a população idosa.
A facilidade em unir pesquisadores dos programas de Sistemas de Informação e de Gerontologia no próprio campus da EACH facilitou o projeto. “Pensamos que seria um bom ambiente para fazer o desenvolvimento da pesquisa, porque teríamos profissionais e pesquisadores que entendem tanto da programação de robôs sociais quanto da interação com idosos”, conta Sarajane Marques Peres, integrante do grupo de pesquisa da EACH e do C4AI. Entre os pesquisadores de Gerontologia que atuam no projeto, estão: Meire Cachioni, Ruth Caldeira de Melo e Mônica Sanches Yassuda.
Ao todo, o grupo de cientistas da EACH está adaptando robôs para três projetos com idosos. O primeiro caso envolve idosos com um grau leve de demência em casas de repouso (instituições de longa permanência de idosos), de forma que as máquinas inteligentes possam ajudar em seu desenvolvimento cognitivo por meio de atividades lúdicas. A partir de testes futuros com músicas e conversas, “nós esperamos ver uma melhora no engajamento cognitivo do idoso pela interação com o robô”, observa Marcelo Fantinato, docente e integrante do grupo de pesquisa da EACH.
A segunda hipótese levantada é a de que os robôs possam ajudar idosos depressivos que moram sozinhos. A máquina disponibilizaria tarefas lúdicas e aplicaria protocolos que serviriam para realizar uma avaliação preliminar sobre o grau de depressão do idoso. “O robô não fornece diagnóstico porque essa é a função dos profissionais da área da saúde. Apenas indica o nível da doença, de forma preliminar e, com isso, pode-se encaminhar a pessoa aos devidos cuidados, incluindo a confirmação do diagnóstico profissional”, afirma Fantinato.
Porém, ainda são necessários ajustes para que a pessoa possa conviver em segurança e autonomia com o robô em sua casa. “Muita pesquisa e desenvolvimento precisam ser feitos nesse projeto em particular. Por enquanto, estamos testando em laboratório funcionalidade que implementam essas atividades”, explica o professor da EACH. Uma vez que esses testes estejam finalizados – com previsão para 2023 -, inicia-se a utilização da inteligência artificial em interações com idosos do USP 60+ nos laboratórios da EACH.
Autocrítica
O terceiro projeto se baseia na autocrítica. A hipótese levantada é de que a personificação de um robô influencia na interação com a tecnologia. “Precisamos entender qual é o nível de confiança dos idosos com essa tecnologia e a inserção dela em seu dia a dia”, conta Sarajane. “O resultado desse estudo pode interferir nos demais, porque nós podemos concluir que os idosos não confiam nos robôs e, então, buscaríamos aumentar essa confiança”, explica o professor Fantinato.
Com a pandemia da covid-19, os testes práticos foram postergados. “Nós fizemos uma interação com os robôs antes da pandemia, com o pessoal do USP 60+ , mas só conseguimos obter algumas impressões prévias”, observa Sarajane. A interação entre robôs e idosos está programada para 2023.
Em entrevista ao Jornal da USP, Sarajane fala sobre a receptividade dos idosos com a novidade tecnológica. “Tivemos dois tipos de reações: uma muito positiva, com as pessoas querendo ter esses robôs em suas casas, e outra menos positiva, dizendo que eles não substituem relações humanas”, conta ela. Além disso, a pesquisadora explica que a efemeridade pode ser um problema. “No começo, é legal por ser uma novidade. E depois isso pode mudar”, complementa.
O projeto conta com duas linhas de robôs. Uma é da marca estrangeira Asus e outra da empresa brasileira Human Robotics. A diferença interfere no aproveitamento de cada máquina. “Como a Human Robotics é uma empresa brasileira, a interação e autonomia são maiores com ela. Se temos algum problema, ela ajuda a arrumar”, conta Sarajane. Os cientistas vêm trabalhando com o robô brasileiro Robios, da Human Robotics. Além disso, as linguagens de programação e as estratégias de armazenamento de dados podem mudar entre os diferentes modelos de robôs.
As empresas que gerenciam os dados garantem sua proteção às pessoas que utilizarem os robôs. “Há o compromisso da empresa de não divulgar os dados, então quando ela nos dá o serviço de armazenamento da informação, ela tem esse protocolo de proteção”, explica Sarajane.Ao Jornal da USP, os pesquisadores contam a importância dessas iniciativas tecnológicas na Universidade. “Se nós não educarmos e criarmos as situações, elas vão ser impostas por uma outra cultura”, observa Sarajane. “O nosso papel é trabalhar essa autonomia no contexto brasileiro e preparar a sociedade”, complementa ela. “Eu destaco também a vantagem de estarmos em um ambiente que propicia o desenvolvimento desse tipo de projeto, que é a USP e principalmente a EACH por sua característica multidisciplinar”, ressalta Fantinato.
Este texto foi originalmente publicado pelo Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.