A circulação termoalina é uma corrente oceânica essencial para a vida na Terra
Circulação termoalina global (CTG), termossalina ou circulação termohalina, é um conceito que se refere ao movimento das águas oceânicas por todos hemisférios, responsável pelo aquecimento e resfriamento de certas regiões. A palavra “termoalina” vem da palavra “termohalina“, em que o prefixo “termo” faz referência à temperatura, e o sufixo “halina” faz referência ao sal.
Esse fenômeno oceanográfico tem como principal motor a diferença de densidade entre as correntes marítimas – que é determinada pela quantidade de sal e pela temperatura da água. Com o aquecimento global e o derretimento das calotas polares, a concentração de sal diminui, o que pode cessar a circulação termoalina.
Alguns cientistas têm alertado que esse cenário poderia ser catastrófico para a humanidade ao elevar significativamente a quantidade de gás sulfídrico (H2S) no oceano e na atmosfera. Esse gás, com alto potencial de danificar a camada de ozônio, foi o responsável pelas extinções em massa do passado. Entenda:
Como funciona a circulação termoalina
No oceano como um todo, a água salgada fica na parte da superfície – por ser mais quente que a água com menor quantidade de sal. Essas duas regiões não se misturam, exceto em alguns casos especiais, como acontece na circulação termoalina.
O planeta Terra, caracterizado por diferenças latitudinais, recebe uma quantidade maior de energia solar no equador, que é a região mais próxima ao sol. Dessa forma, nessa área, a quantidade de evaporação de água do mar é maior, o que causa, consequentemente, uma maior concentração de sal.
Outro fenômeno que aumenta a concentração de sal no oceano é a formação de gelo. Dessa forma, tanto nas regiões de maior evaporação de água do mar, quanto nas áreas em que há formação de gelo, há maior concentração de sal.
A parte que contém maior concentração de sal é mais densa do que a que contém menos sal. Dessa forma, quando uma parte de oceano que contém maior salinidade entra em contato com uma parte com menor salinidade, há formação de uma corrente. A região de maior densidade (com maior concentração de sal) é engolida e submersa pela região de menor densidade (com menor concentração de sal). Essa submersão cria uma corrente muito grande e lenta, chamada de circulação termoalina.
Confira como se dá o movimento da circulação termoalina na animação feita pela Nasa no vídeo abaixo:
Essa animação mostra uma das principais regiões onde ocorre o bombeamento de corrente marinha, no oceano atlântico norte ao redor da Groenlândia, Islândia e Mar do Norte. A corrente oceânica da superfície traz nova água para essa região do Atlântico Sul por meio da Corrente do Golfo, e a água retorna ao Atlântico Sul por meio da corrente de Águas Profundas do Atlântico Norte. O influxo contínuo de água quente no oceano polar do Atlântico Norte mantém as regiões ao redor da Islândia e do sul da Groenlândia praticamente livres de gelo marinho durante o ano todo.
A animação também mostra outra característica da circulação oceânica global: a Corrente Circumpolar Antártica. A região em torno da latitude 60 sul é a única parte da Terra onde o oceano pode fluir por todo o mundo sem terra no caminho. Como resultado, as águas superficiais e profundas fluem do oeste para o leste ao redor da Antártida. Esse movimento circumpolar liga os oceanos do planeta e permite que a circulação de águas profundas do Atlântico aumente nos oceanos Índico e Pacífico e a circulação de superfície se feche com o fluxo para o norte no Atlântico.
A cor do oceano do mundo no início da animação representa a densidade da água superficial, com as regiões escuras sendo mais densas e as regiões claras sendo menos densas. Na animação, o movimento está acelerado para melhorar a compreensão do fenômeno. Mas, na realidade, esse movimento é muito lento e é difícil medi-lo ou simula-lo.
O cessar da circulação termoalina pode ser desastroso
Nas últimas duas décadas, tem havido uma crescente preocupação da comunidade científica a respeito do cessar da circulação termoalina. À medida que as temperaturas globais aumentam, as calotas e regiões árticas da Groenlândia começaram a derreter com um ritmo alarmante. O Ártico, que contém cerca de 70% de toda a água doce da Terra, dilui a concentração de sal no oceano.
A diminuição na concentração de sal interrompe o fluxo da corrente gerada pelo gradiente de densidade. De acordo com estudo publicado pela revista Nature, o fluxo líquido da circulação termoalina diminuiu em 30% desde a década de 1950.
Essa desaceleração da circulação termoalina pode explicar a diminuição das temperaturas em certas regiões. Embora as temperaturas globais gerais aumentem, a ausência de correntes quentes nas regiões que ocorrem naturalmente resultará em temperaturas mais baixas.
Mas ainda há muita incerteza sobre os efeitos das correntes de resfriamento. Se as temperaturas caírem um pouco, elas podem simplesmente neutralizar os efeitos do aquecimento global em regiões como a Europa.
Isso não quer dizer que o resto do mundo terá tanta sorte. Em um cenário mais sombrio, uma drástica redução na circulação termoalina pode causar uma queda considerável das temperaturas. Se a desaceleração continuar, a Europa e outras regiões que dependem da circulação termoalina para manter o clima razoavelmente quente e ameno, podem esperar por uma era do gelo.
Um resultado mais preocupante de um cessar da circulação termoalina é o desencadeamento potencial de um evento anóxico – águas anóxicas são áreas de água do mar, água doce ou subterrânea que estão esgotadas de oxigênio dissolvido e são uma condição mais grave de hipoxia.
Eventos anóxicos têm sido associados a interrupção das correntes oceânicas e eventos de aquecimento global no período pré-histórico da Terra. À medida que os oceanos se tornam mais estagnados, a vida marinha se torna mais ativa. Organismos oceânicos como o plâncton, que não têm movimentos suficientes para contrariar as correntes, têm a oportunidade de se reproduzir em grande número.
À medida que a biomassa do oceano aumenta, a quantidade de oxigênio no oceano começa a cair. A vida nos oceanos precisa de oxigênio para sobreviver, mas com muitos organismos, a obtenção de oxigênio se torna difícil. Regiões que têm baixo teor de oxigênio podem se transformar em zonas mortas, áreas nas quais grande parte da vida marinha não pode sobreviver.
Durante esses eventos anóxicos no passado da Terra, grandes quantidades de gás sulfídrico foram liberadas dos oceanos. Esse gás nocivo está associado a extinções em massa, pois mamíferos e plantas não podem sobreviver com sua presença na atmosfera.
Os mesmos pesquisadores também demonstraram que a liberação desse gás teria danificado a camada de ozônio. Essa teoria foi apoiada por registros fósseis que mostraram cicatrizes relacionadas à radiação ultravioleta (UV). Quantidades maciças de radiação UV facilitariam ainda mais a extinção de organismos terrestres. A vida humana, tal como a conhecemos, nestas condições ambientais, será impossível.
Um dado que assusta ainda mais é que, em todas as vezes em que ocorreram extinção em massa e cessar da termoalina, a Terra apresentava temperaturas globais recordes e altos níveis de carbono na atmosfera. Durante a extinção Permiano-Triássica, os níveis atmosféricos de carbono atingiram 1000 ppm. As concentrações atuais estão em 411,97 ppm (partes por milhão). A Terra ainda está longe de atingir níveis de carbono catastróficos, mas isso não é motivo para deixar essa questão para lá.
É preciso haver a compreensão de que, uma vez que a circulação termoalina pare, ela não pode ser reiniciada sem que se passe um pouco menos de um milhão de anos!