Empresa spin-off da Unicamp licenciou tecnologia que usa o extrato de shimeji para desenvolver clareadores dentais mais sustentáveis e com menos efeitos adversos
Por Ana Paula Palazi em Jornal da Unicamp — Uma formulação inovadora para produção de clareadores dentais naturais a partir de cogumelos comestíveis do tipo shimeji foi desenvolvida em pesquisas conduzidas na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A invenção permitirá a remoção de manchas nos dentes sem o uso de produtos químicos abrasivos e com menos efeitos adversos do que os métodos disponíveis no mercado.
A tecnologia é resultado de um estudo interdisciplinar que envolveu pesquisadores da Unifesp e de três Faculdades da Unicamp: Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF), Faculdade de Ciências de Alimentos (FEA) e Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP). O método, com patente já depositada, possibilita o reaproveitamento de partes descartadas na produção de cogumelos, reduzindo a geração de resíduos da indústria e gerando valor à cadeia produtiva ao dar um destino nobre a partes que iriam para o lixo. “O clareador dental à base de extrato de shimeji foi desenvolvido pensando na sustentabilidade que mantém o tripé ambiental, econômico e social. Podemos dispor de grande quantidade de matéria-prima de baixo custo sem precisar aumentar a produção de cogumelos, e apoiando os pequenos produtores, que se beneficiariam da agregação de valor a um resíduo”, avalia Juliano Bicas, professor da FEA.
O invento, protegido com estratégia da Agência de Inovação Inova Unicamp, foi licenciado em 2021 para a Webbe Startups, uma spin-off acadêmica da Unicamp que tem como atividade principal o resultado de uma pesquisa ou conhecimento gerado na Universidade.
A startup foi criada pela biotecnologista e empreendedora em série Dayse Alexia e tem como objetivo acelerar a criação de produtos comercialmente viáveis em um modelo de negócios escalável a partir da propriedade intelectual protegida da Unicamp.
Mercado aquecido – O clareamento dental é um dos procedimentos clínicos mais utilizados nos consultórios odontológicos. A procura por produtos “amigos da natureza” tem se intensificado nos últimos anos. O diferencial da tecnologia da Unicamp está na forma natural de clareamento, com potencial para reduzir reações adversas como irritação na gengiva e na mucosa oral ou sensibilidade temporária dos dentes.
A invenção não exige substâncias isoladas, que requerem processos de produção mais complexos e caros. O extrato é obtido do chapéu ou do talo do shimeji, com um mínimo de tratamento, sendo considerada uma tecnologia “verde”.
A professora da Faculdade de Odontologia, Débora Leite Lima, explica que as técnicas de clareamento dentário mais usadas levam peróxidos de hidrogênio e de carbamida na composição e removem os pigmentos sem alterar a estrutura dental. No entanto, esses produtos podem causar alterações microscópicas do esmalte e a desmineralização dos dentes. O processo é reversível pela salivação e aplicação de flúor, mas se o paciente fizer uso de medicamentos que diminuem o fluxo salivar a capacidade de remineralização do esmalte pós-clareamento pode sofrer interferências. “O agente clareador do cogumelo vem em uma frente mais conservadora para o esmalte dental. Qualquer paciente poderia ser beneficiado, principalmente aqueles com alergia ou sensibilidade às outras formulações, ou que façam uso de medicação que interfira no processo, como alguns remédios para ansiedade”, comenta Lima.
Mecanismo de ação – O cogumelo apresenta diversas enzimas conhecidas por suas propriedades despigmentantes. Segundo Gislaine Leonardi, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF), o mecanismo de ação do extrato ainda não foi totalmente esclarecido, mas os estudos conduzidos na Unicamp indicam a existência de uma explicação que vai além dessas enzimas. “Testamos diferentes cogumelos de supermercado e percebemos que o shimeji do tipo preto é o que funciona melhor. Quando o cogumelo é aquecido antes do tratamento ele tem uma ação de clareamento superior. Isso sugere que o efeito clareador pode não estar ligado às enzimas. Seguimos na pesquisa para saber o que produz esse efeito”, complementa.
O extrato de cogumelo foi considerado seguro em testes in vitro e em amostras de blocos dentários bovinos. O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Unicamp. O próximo passo prevê testagens de concentração e aplicação técnica para que o clareador possa seguir para a fase de testes clínicos em humanos.
A Webee pretende testar o produto em três formulações diferentes: gel para clareamento com uso de moldeira para os dentes, creme dental e enxaguatório bucal. Para avançar no desenvolvimento do modelo comercial, a empresa-filha da Unicamp vai contar com recursos do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. “Estamos finalizando os trâmites burocráticos para avançar no processo. Vemos um grande potencial nessa tecnologia. Os resultados são muito próximos ao dos tratamentos atuais, mas com potencial redução de impacto no meio ambiente e maior conforto para os pacientes a partir do uso de um produto 100% natural”, diz a fundadora da Webbe e pesquisadora responsável do projeto com o PIPE.
O modelo de licenciamento via spinoff – O licenciamento de uma tecnologia para uma empresa nascente via spin off é um dos modelos adotados pela Inova Unicamp. O processo demanda uma comunicação diferenciada com as empresas, que, em sua maioria, detêm o domínio técnico da tecnologia, mas precisam de apoio para análise do modelo de licenciamento a ser adotado. “A comunicação entre pesquisadores, Inova Unicamp e empresa foi fundamental para a concretização do licenciamento. Ela propiciou, a cada parte, o entendimento e o atendimento das expectativas. Esse modelo nos aproxima mais da empresa. Constantemente somos solicitados a acompanhar a trajetória do desenvolvimento da tecnologia. A proximidade com os inventores é uma via de mão dupla: todos aprendemos”, disse Iara Ferreira, diretora de Parcerias da Inova Unicamp.
Inventores premiados neste licenciamento
As professoras Gislaine Ricci Leonardi (FCF Unicamp), Maria Cibelle Pauli (UNIFESP), Débora Alves Nunes Leite Lima (FOP Unicamp) e os professores Juliano Lemos Bicas (FEA Unicamp) e Rodrigo Ramos Catharino (FCF Unicamp) foram premiados na categoria Propriedade Intelectual Licenciada no Prêmio Inventores 2022.
Spin-off homenageada
Inspirada nas abelhas, que são colaborativas, organizadas e que, mesmo pequenas, geram impacto positivo no ecossistema, a WeBee nasceu com o objetivo de criar soluções em negócios sustentáveis que impactem o mundo com tecnologia.
Programação de homenagens
Essa matéria faz parte da série de reportagens produzida pela Inova Unicamp sobre tecnologias licenciadas. Elas podem ser lidas no site da Inova e também em formato e-book na Revista Prêmio Inventores, com lançamento previsto para junho. Também está agendado um webinar com conteúdo sobre propriedade intelectual e transferência de tecnologia para o dia 8 de junho, com inscrições abertas ao público em geral.
Confira os premiados no site do Prêmio Inventores da Unicamp.
Os patrocinadores do Prêmio Inventores 2022 são ClarkeModet, 3M e Neger Telecom.
Este texto foi originalmente publicado por Jornal da Unicamp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não representa necessariamente a opinião do Portal eCycle.