Por Marcos Fava Neves, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, Vinícius Cambaúva e Vitor Nardini Marques, mestrandos na FEA-RP
Por Marcos Fava Neves em Jornal da USP – Vamos às reflexões dos fatos e números do agro em janeiro e o que acompanhar em fevereiro. Na economia brasileira, com relação às expectativas econômicas para este e o próximo ano, o relatório Focus (Bacen) de 17 de janeiro trouxe expectativas para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de 2022 em 5,09%, e de 2023 em 3,4% Já para o PIB (Produto Interno Bruto), espera-se um crescimento de 0,29% neste ano e de 1,75% em 2023. Na taxa Selic, o mercado espera 11,75% ao final de 2022 e 8% ao final de 2023. No câmbio devemos ter R$ 5,60 ao final de 2022 e R$ 5,46 ao final de 2023.
O início de janeiro ficou marcado pela volta no crescimento dos casos de covid-19 no Brasil, após a ocorrência em diversos países, com destaque para os da Europa. Economistas afirmam que a alta nos casos pode afetar as cadeias de produção global, possibilitando menor crescimento econômico e a possibilidade de aumento da inflação. Precisamos ficar de olho neste aspecto. Ver o tempo de duração desta onda e a gravidade das internações, torcendo para que seja rápida e não tão grave.
No agro mundial e brasileiro, o índice de preços de alimentos da Agência das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) acumulou alta de 28,1% no ano de 2021, atingindo 133,7 pontos no final do mês de dezembro. O aumento foi generalizado considerando-se o intervalo de 12 meses: cereais aumentaram 27,2%; óleos bateram alta histórica de 65,8%; o açúcar subiu 29,8% alcançando o maior patamar desde 2016; já carnes e produtos lácteos tiveram os menores crescimentos, 12,7% e 16,9% respectivamente. Somando as variáveis dos preços dos insumos, pandemia global e condições climáticas instáveis, devemos carregar o problema da inflação dos alimentos por mais um ano.
No boletim de janeiro de 2022, a Companha Nacional de Abastecimento (Conab) indica que a produção de grãos na safra 2021/22 deve ficar em 284,4 milhões de toneladas; volume 2,3% menor que o estimado no relatório anterior ou 6,7 milhões de toneladas a menos – efeito das fortes secas, que vamos comentar na sequência. Ainda assim, a produção total deve ficar 12,5% maior que a registrada no ciclo anterior. Já a área deve crescer 4,5% nesta safra, ficando em torno de 72,1 milhões de hectares. Para a cultura da soja, a estimativa é de produção de 140,5 milhões de toneladas (+2,3%) em uma área de 30,4 milhões de hectares (+3,8%). No milho, a produção esperada é de 112,9 milhões de toneladas (+29,7%), em uma área de 20,9 milhões de hectares (+5,1%). O cereal é outra cultura que tem sido fortemente afetada pelo clima; vale lembrar que no relatório anterior, a estimativa era de 117,2 milhões de toneladas. Por fim, o algodão deve entregar 2,71 milhões de toneladas de pluma (+14,8%) em uma área estimada em 1,53 milhão de hectares (+12,5%). Apesar de positivos, grande parte dos números foi revista para baixo, devido aos eventos com o clima.
O clima é, em mais uma safra, o principal desafio dos produtores brasileiros. De um lado, o alto índice de chuvas em regiões do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), especialmente nos estados de Tocantins e da Bahia, tem prejudicado as lavouras por conta do excesso de umidade. De outro, no Mato Grosso do Sul e em outros estados do Sul do Brasil, a estiagem durou semanas e jogou pra baixo as estimativas de produção – ambos efeitos opostos do fenômeno La Niña. No Paraná, o governo do Estado já indica uma produção de grãos 40% menor nesta safra verão por conta das secas; enquanto no vale do São Francisco, onde o volume de chuvas em dezembro foi equivalente ao esperado para o ano todo, os prejuízos calculados já somam R$ 45 milhões aos produtores de uva e manga. Mais do que nunca, é hora de acompanhar estes eventos e entender como será o comportamento do mercado com as notícias do clima.
Do lado das operações, a Conab aponta que, até o dia 8 de janeiro, o plantio de algodão no Brasil alcançava 35,5% da área total, contra 31,4% na mesma data de 2021. Para a cultura do milho, o órgão indica o início da colheita, com progresso em 3,0% da área total, frente a 2,1% na mesma data de 2020/21; destaque para o Rio Grande do Sul que já alcança 13,0% de área colhida. Até o momento, a Conab não aponta números para a colheita da soja, que em muitas regiões segue aguardando uma pausa nas chuvas e a redução na umidade dos grãos para início das operações. Vale lembrar que o atraso na colheita da leguminosa pode comprometer o desempenho da 2ª safra de milho, como vimos no ciclo passado.
Em âmbito internacional, o relatório do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) relativo à safra global 2021/22 reestimou a produção de milho em 1.206,9 milhões de toneladas; 0,1% menor que o valor do mês anterior, mas 7,5% maior que a oferta da safra passada. A redução neste mês se deu especialmente pela revisão na oferta dos seguintes países: no Brasil, a produção foi de 118,0 (dezembro) para 115,0 milhões de toneladas (-2,5%); na Argentina, de 54,5 para 54 milhões de toneladas (-0,9%); e na União Europeia de 70,4 milhões de toneladas para 69,9 (-0,5%). Na China, a estimativa de produção do cereal foi mantida em 272,5 milhões de toneladas; e nos EUA o dado foi revisto para cima, agora em 383,9 milhões de toneladas (+0,3%). Já os estoques globais do milho foram estimados em 303,0 milhões de toneladas, alta de 3,7% em comparação com o ciclo 2020/21.
Na soja, a produção global também foi reajustada para baixo este mês, indicada agora em 372,6 milhões de toneladas; 2,4% menor que o relatório de dezembro, mas 1,7% maior que a produção de 2020/21. A redução na oferta global é resultado das seguintes revisões neste mês: no Brasil, a produção foi reestimada de 144,0 milhões de toneladas para 139,0 milhões de toneladas (-3,5%); na Argentina, de 49,5 milhões de toneladas para 46,5 milhões de toneladas (-6,0%); e no Paraguai, de 10,0 milhões de toneladas para 8,5 milhões de toneladas (-15,0%). A produção nos EUA foi mantida em 120,7 milhões de toneladas. Com isso, os estoques globais da oleaginosa devem ficar em 95,2 milhões de toneladas, redução de 4,7% em relação ao registrado no ciclo 2020/21. Vamos ver como será a reação dos mercados, mas é essencial seguirmos acompanhando estes números nos próximos meses!
Em dezembro de 2021, as exportações do agronegócio brasileiro alcançaram mais um recorde para o mês, na comparação com o mesmo período de 2020; foram US$ 9,88 bilhões vendidos (+36,5%) e volume de 15,6 milhões de toneladas (+11,4%). A alta nas receitas foi justificada tanto pelo aumento no volume embarcado, como na alta de 22,5% nos preços dos produtos. O top 5 na pauta de exportação foi composto com: 1°) complexo soja com US$ 2,26 bilhões (+341,4%), quase 23,0% de todas as receitas do agro, sendo que os grãos arrecadaram US$ 1,36 bilhão; 2°) carnes com US$ 1,67 bilhões (+10,9%), das quais a bovina vendeu US$ 725,4 milhões (-2,0%), a de frango US$ 701,8 milhões (+29,9%) e a suína, US$ 189,37 milhões (+0,6%); 3°) na terceira posição aparecem os produtos florestais, com vendas em US$ 1,39 bilhão em dezembro (+50,9%); 4°) cereais, farinhas e preparações em quarto, com US$ 1,05 bilhão (+4,3%); 5°) e, por fim, temos o complexo sucroenergético com receitas em US$ 854,1 milhões (-12,2%).
Já as importações do setor em dezembro de 2021 somaram US$ 1,43 bilhão, alta de 5,6%. Trigo e milho foram os dois principais produtos comprados no mercado externo pelo Brasil: US$ 126,4 milhões (+88,9%) e US$ 106,4 milhões (+181,7%), respectivamente. Com isso, o setor entregou um saldo positivo de US$ 8,45 bilhões no mês.
Em 2021, o agro brasileiro acumulou recordes nas vendas externas! Foram US$ 120,6 bilhões em exportações (+19,7%) que, descontados os US$ 15,5 bilhões em compras (+19,2%), nos renderam um saldo de US$ 105,1 bilhões (+19,9%); US$ 17,4 bilhões a mais em um ano! É o nosso agro que segue contribuindo para o fortalecimento da economia e o desenvolvimento da nossa nação!
Nas cadeias da pecuária, a carne bovina encerrou 2021 com queda de 7,0% nos volumes exportados e alta de 9,0% nas receitas; total de 1,867 milhão de toneladas e US$ 9,236 bilhões. A queda nos volumes é resultado das restrições impostas pela China, fato que citamos em nossa coluna nos meses anteriores. Já a alta nas receitas se deu por conta da valorização da proteína bovina no mercado internacional. No ano passado, os EUA se tornaram o segundo principal importador da carne bovina brasileira, apenas atrás da China. No total, 104 países ampliaram a compra da proteína brasileira, enquanto outros 68 reduziram a importação, segundo a Abrafrigo (Associação Brasileira de Frigoríficos).
Ainda sobre os grandes números de 2021, o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) alcançou a incrível marca de R$ 1,129 trilhão, o que representa um crescimento de 10,1% frente a 2020 (R$ 1,025 trilhão), segundo dados apurados pelo Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). As lavouras faturaram R$ 768,4 bilhões (+12,7%), enquanto que a pecuária somou montante de R$ 360,8 bilhões (+4,9%). Com relação às culturas, grande destaque ficou por conta de soja, milho e algodão, que juntos representaram quase 50% do total. Para 2022, o governo espera um VBP de R$ 1,162 trilhão, 2,9% superior ao obtido no ano passado. Estamos na torcida!
No segundo semestre do ano passado (julho a dezembro), os produtores rurais brasileiros contrataram R$ 159,7 bilhões em crédito rural, volume 30% maior que o registrado no mesmo período de 2020. Os maiores saltos se deram nas seguintes categorias: “apoio à comercialização” com 65% (R$ 17,3 bilhões); “custeio” com 29% (R$ 86,6 bilhões); “investimentos” com alta de 24% (R$ 46,7 bilhões); e “industrialização”, que foi 23% maior (R$ 8,8 bilhões). Vale ressaltar, no entanto, que apesar do crescimento no volume financeiro, o número de contratos foi 7% menor no período.
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) vem trabalhando para construção de uma agropecuária mais sustentável. Dentre os principais focos da organização para 2022 está a redução nas emissões de gases de efeito estufa. As grandes apostas estão no melhoramento genético vegetal das plantas forrageiras para melhorar sua digestibilidade, melhoramento genético animal para encurtar o período de abate e uso de aditivos que reduzam a emissão de metano.
O Grupo Mantiqueira iniciou suas operações no varejo de ovos e acessórios para preparação do alimento. Duas lojas de 50 m² foram inauguradas em dezembro, uma em Moema e outra em Chácara Santo Antônio, em São Paulo, com o objetivo de se aproximar do consumidor final. O grupo ainda pretende expandir as atividades trabalhando em um formato de franquias, oferecendo seu portfólio de ovos e outros produtos complementares.
Em relatório informativo divulgado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), relativo à média dos preços das principais commodities do agro brasileiro em 2021, temos o seguinte balanço: o Índice de Preços dos Alimentos da FAO fechou o ano com média de 186,60 pontos (+28,1%); a soja ficou com preços em R$ 170,0/saca (+40,1%); o milho em média de R$ 91,60/saca (+55,8%); o algodão com R$ 11.582/tonelada (+70,7%); e o câmbio fechou 2021 com média de R$ 5,41/US$ (+3,2%).
Para concluir a nossa análise geral do agro, os preços dos principais produtos no fechamento desta coluna eram: a soja para entrega em cooperativa de São Paulo estava em R$ 172/saca e R$ 173/saca para junho e R$ 167 para fevereiro de 2023, um pequeno aumento. No milho, a cotação atual está em R$ 97,00/saca e a entrega em agosto de 2022 fechou em R$ 73/saca. O algodão fechou em R$ 224/arroba e para junho de 2022 em 184/arroba; e o boi gordo em R$ 330/arroba, com sensível aumento.
Os cinco fatos do agro para acompanhar em fevereiro são:
• Diariamente, o clima e a qualidade das lavouras no Hemisfério Sul, principalmente Brasil e Argentina. Desde a evolução dos efeitos da seca nas lavouras do Sul e MS e até o excesso de chuva (BA, GO, MG) vem trazendo problemas, acompanhar de perto;
• A situação mundial de crise energética (escassez de carvão, preços do petróleo, do gás natural e outros);
• O comportamento de compra, de preços e da oferta de defensivos e fertilizantes;
• Os efeitos da variante ômicron (aumento da incidência do coronavírus) na Europa e Ásia, acompanhar dia a dia o que acontece nos países e principalmente no Brasil;
• A evolução do quadro político e econômico no Brasil e as consequências no câmbio.