Combustíveis fósseis devem “permanecer sob o solo” para conter crise climática

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A grande maioria das reservas de combustíveis fósseis de propriedade de países e empresas deve permanecer sob o solo para que a crise climática seja contida. Foi isso o que concluiu uma nova análise, publicada hoje, 8, na revista científica Nature.

A pesquisa usou um modelo complexo de uso global de energia, que priorizou o uso de combustíveis fósseis mais baratos de extrair, como o petróleo saudita, no esgotamento do orçamento de carbono restante. Reservas caras e altamente poluentes, como as areias betuminosas do Canadá e o petróleo venezuelano, são mantidas sob o solo no modelo.

Assim, os pesquisadores descobriram que 90% do carvão e 60% das reservas de petróleo e gás não poderiam ser extraídas se houvesse até 50% de chance de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 °C – temperatura além da qual serão atingidos os piores impactos climáticos.

O estudo científico é a primeira avaliação desse tipo e revela a enorme desconexão entre as metas climáticas do acordo de Paris e os planos de expansão da indústria de combustíveis fósseis. Os pesquisadores descreveram a situação como “absolutamente desesperadora”.

Riscos para economias e indústria

Segundo o jornal britânico The Guardian, os pesquisadores disseram que “a maior parte dos projetos que envolvem combustíveis fósseis operacionais e planejados são inviáveis”. Em outras palavras, trilhões de dólares em ativos desses recursos naturais não renováveis podem se tornar inúteis.

As conclusões do relatório são “desanimadoras” para a indústria de combustíveis fósseis, sugerindo que a produção de petróleo, gás e carvão provavelmente já atingiu seu pico e diminuirá 3% ao ano a partir de agora. Estados que dependem fortemente da receita de combustíveis fósseis, como a Arábia Saudita e a Nigéria, correm um risco especialmente alto. Um ministro de um estado da Opep alertou recentemente sobre “agitação e instabilidade” se suas economias não se diversificarem a tempo.

O que diz a análise?

Para manter as temperaturas globais abaixo de 1,5 °C, a análise afirma:

  • Os Estados Unidos, a Rússia e os ex-países soviéticos possuem metade das reservas globais de carvão, mas precisarão manter 97% no solo; já a Austrália, 95%. China e Índia têm cerca de um quarto das reservas globais de carvão e precisarão manter 76% no solo.
  • Os estados do Oriente Médio têm mais da metade das reservas mundiais de petróleo, mas precisarão manter quase dois terços no solo, enquanto 83% do petróleo canadense de areias betuminosas não deve ser extraído.
  • Praticamente todo óleo ou gás não convencional, como o de fraturamento hidráulico, deve permanecer no solo e nenhum combustível fóssil poderá ser extraído do Ártico.

Os pesquisadores disseram que garantir uma transição justa para muitos trabalhadores da indústria de combustíveis fósseis é vital.

Christiana Figueres, chefe do clima da ONU quando o acordo climático de Paris foi assinado, afirmou ao The Guardian que: “Devemos manter os combustíveis fósseis no solo. Um futuro seguro não tem espaço para nenhuma nova extração de combustível fóssil. A mudança para energia limpa deve ser acelerada a fim de manter a atividade humana agora e proteger o bem-estar humano amanhã”.

Christophe McGlade, analista sênior da Agência Internacional de Energia (IEA), disse: “A pesquisa destaca como a retórica de lidar com as mudanças climáticas diverge da realidade. Nenhuma das promessas feitas até agora pelos principais países produtores de petróleo e gás inclui metas explícitas para reduzir a produção”.

Mike Coffin, analista do instituto financeiro Carbon Tracker, explicou que é fundamental que os investidores em empresas de petróleo e gás estejam cientes dos riscos da transição. Para ele, há um risco muito real de os ativos ficarem presos.

Seu último relatório mostrou que as empresas correm o risco de desperdiçar mais de um trilhão de dólares em projetos incompatíveis com um mundo de baixo carbono, com empresas como ConocoPhillips, ExxonMobil, Chevron e Shell mais expostas.

“O quadro desolador pintado por nossos cenários para a indústria global de combustíveis fósseis é muito provavelmente uma subestimativa do que é necessário”, disseram os pesquisadores. Isso porque o balanço de carbono usado dá apenas 50% de chance de 1,5 °C e porque os cientistas presumiram um nível significativo de remoção de CO2 da atmosfera usando uma tecnologia que ainda não foi comprovada em escala.

No entanto, pesquisadores disseram que houve alguns “sinais promissores”, com a produção global de carvão tendo atingido o pico em 2013 e a produção de petróleo próxima do pico de demanda. Eles acreditam que ações para cortar a produção poderiam incluir o fim de subsídios, impostos e até mesmo proibições de novas explorações. A Dinamarca e a Costa Rica fundaram recentemente uma aliança de países estabelecendo uma data final para os combustíveis fósseis.

Ministros de energia em países ricos em combustíveis fósseis rejeitaram recentemente as sugestões de que a exploração e a produção deveriam diminuir. Keith Pitt, da Austrália, disse: “Relatos sobre a morte iminente do carvão são muito exagerados e seu futuro está garantido bem além de 2030”. Mas a verdade é que existe um consenso entre os cientistas de que os combustíveis fósseis devem permanecer sob o solo para conter as mudanças climáticas.

Equipe eCycle

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