Relatório revela que compromissos nacionais de redução de emissões vinculados ao Acordo de Paris estão muito aquém do necessário para prevenir os impactos das mudanças climáticas
Um novo relatório da ONU revela que os compromissos nacionais de redução de emissões vinculados ao Acordo de Paris estão muito aquém do necessário para prevenir os impactos mais perigosos das mudanças climáticas.
É crucial que os países que ainda não submeteram seus planos prevejam ações muito mais ambiciosas este ano e que os países que apresentaram promessas mais fracas em 2020 revisem seus compromissos para que se tornem mais robustos.
No Acordo de 2015, os países adotaram um processo por meio do qual apresentariam, a cada cinco anos, compromissos climáticos mais ambiciosos (conhecidos como contribuições nacionalmente determinadas ou NDCs). Reconhecendo que as promessas apresentadas cinco anos atrás eram insuficientes para cumprir os objetivos de longo prazo do Acordo de Paris, o processo foi pensado para que, gradativamente, o mundo avançasse em um caminho para limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C. O primeiro desses “ciclos de ambição” está em andamento, com a expectativa de que os países apresentem novas NDCs antes da COP26 em Glasgow, em novembro deste ano.
O relatório da ONU avalia 48 NDCs de 75 países submetidas até o final de 2020. O documento conclui que esses compromissos reduzirão as emissões em cerca de apenas 2,8% em relação às promessas apresentadas há cinco anos pelos mesmos países. Em escala global, para limitar o amento da temperatura a 1,5°C, as NDCs novas ou atualizadas precisam reduzir as emissões até 2030 em cerca de 55% abaixo das promessas iniciais.
Embora o relatório da ONU aponte um quadro sombrio, esse não é o cenário completo. O que os demais países fizerem coletivamente ao longo dos próximos meses será decisivo. Os países que ainda não enviaram suas NDCs atualizadas ou novas – além dos que já indicaram que apresentarão metas mais fortes – representam 75% do total das emissões globais. E há razões para acreditar que essas nações irão além do que foi feito até aqui.
Uma delas é que, até agora, 58 países que juntos representam mais da metade das emissões globais se comprometeram com metas de atingir emissão líquida zero até meados do século. Muitos deles – incluindo a China e os Estados Unidos – ainda não submeteram a atualização de suas NDCs, mas seus compromissos em zerar as emissões líquidas sugerem que as NDCs terão de ser ambiciosas. Japão, Coréia do Sul e Nova Zelândia – que inicialmente submeteram NDCs que não aumentavam a ambição, mas depois se comprometeram com metas de atingir o zero líquido até 2050 – agora afirmam que fortalecerão suas NDCs antes da COP26.
Juntas, e se atingidas, essas metas de zero líquido limitariam o aquecimento global a 2,1°C – menos do que a projeção de 3°C para a qual o mundo se encaminha. Mas cumprir essa promessa vai exigir que os países tomem medidas de curto prazo – e é aí que as NDCs se tornam essenciais. Os holofotes agora estão sobre os países que ainda precisam apresentar NDCs mais ambiciosas para 2030 – em especial os maiores emissores.
A seguir, avaliamos os compromissos de redução de emissões nos planos climáticos nacionais submetidos até agora e o que precisa acontecer antes da COP26:
Quais países aumentaram a ambição de suas NDCs?
Mais de 40 países (incluindo os 27 estados-membro da União Europeia) submeteram planos para promover uma redução de emissões ainda mais profunda do que em suas NDCs iniciais.
A UE27 fortaleceu sua meta de 2030: de uma redução de “pelo menos 40%” em relação aos níveis de 1990 para “pelo menos 55%”. O Reino Unido, em sua primeira NDC depois de sair da União Europeia, se comprometeu com uma redução de 68%, indo além do que teria sido sua contribuição na NDC inicial da UE28.
Na América Latina, a Argentina se comprometeu, na meta para 2030, com uma redução 26% abaixo de sua promessa inicial; a Colômbia, 37% abaixo; e Chile, Costa Rica e Peru também fortaleceram seus compromissos.
Por fim, diversos estados insulares e outros países vulneráveis em desenvolvimento, como Fiji, Jamaica, Quênia e Senegal, também adotaram compromissos mais ambiciosos.
Para mais de uma dúzia de outros países, não é possível quantificar o efeito de seus novos planos no que diz respeito às emissões de GEE, em geral devido à falta de dados na NDC inicial. Mas a maioria deles também estabeleceu compromissos mais robustos.
Brunei, Ruanda e os Emirados Árabes Unidos, por exemplo, estabeleceram pela primeira vez metas de reduções de emissões em diferentes setores da economia em suas NDCs. Outros países, incluindo Nepal e Nicarágua, fortaleceram ou adicionaram metas específicas por setor. Países como Ruanda e Bangladesh adicionaram ou reforçaram políticas referentes aos poluentes climáticos de vida curta altamente potentes, como os HFCs, metano e carbono negro.
Quais países não fortaleceram suas NDCs?
Muitos países – como Japão, Coreia do Sul, Nova Zelândia, Austrália e Singapura – submeteram NDCs com metas de redução de emissões idênticas às enviadas cinco anos atrás. No entanto, ainda há alguma esperança: Japão, Coreia do Sul e Nova Zelândia dessa vez indicaram a intenção de atualizar suas metas em preparação para a COP26, dando continuidade a suas promessas de atingir o zero líquido das emissões de GEE até 2050. Austrália e Singapura, por outro lado, não sinalizaram nenhuma intenção de fortalecer suas metas.
Quais países submeteram NDCs mais fracas?
Ainda pior, Brasil e México atenuaram suas metas de redução de emissões em comparação aos compromissos que haviam estabelecido em 2015. À primeira vista, as metas dos dois países para 2030 parecem as mesmas dos planos iniciais – respectivamente, uma redução de 43% em relação aos níveis 2005 e de 22% em relação ao cenário atual, se nada for feito. No entanto, as NDCs atualizadas contêm outros pontos revistos que reduzem o impacto das metas para 2030: o Brasil aumentou a estimativa das emissões de 2005 em 38%, enquanto o México aumentou a projeção do cenário atual em 1,8%. Como resultado, as emissões permitidas para 2030, de acordo com as novas promessas, serão maiores do que sob as NDCs iniciais.
Entenda a mudança no compromisso climático do Brasil.
Quais países ainda não revelaram seus planos climáticos nacionais? E quais devem aumentar a ambição?
Mais de 80 países se comprometeram a apresentar NDCs mais ambiciosas. Esse grupo inclui grandes economias, como China, Estados Unidos, Canadá e África do Sul. Os Estados Unidos e o Canadá afirmaram que vão concluir suas NDCs antes da Cúpula dos Líderes sobre o Clima, no dia 22 de abril de 2021, e o presidente americano Joe Biden deixou claro que a ação climática será uma de suas principais prioridades na presidência.
Para que possamos alcançar a meta de 1,5°C, os países restantes precisarão adotar uma abordagem muito mais agressiva do que vimos até agora. Para começar, os Estados Unidos devem se comprometer a reduzir as emissões em 50% em relação aos níveis de 2005 até 2030, e a China pode atingir o pico de suas emissões de CO₂ até 2026 e se comprometer com metas ambiciosas para outros gases que não o CO₂. Outras economias relevantes, como Índia e Indonésia, que ainda não se comprometeram a fortalecer suas NDCs, também precisarão intensificar os esforços se quisermos controlar a crise climática.
Como saber se, juntos, os novos planos climáticos nacionais nos colocam no caminho necessário para limitar níveis perigosos de aquecimento?
Em escala global, para limitar o aquecimento a 1,5°C e prevenir os piores impactos das mudanças climáticas, as emissões de gases do efeito estufa precisam estar 55% abaixo da rodada inicial de NDCs. Se os países que já submeteram suas NDCs até agora continuarem a ficar tão aquém do necessário, os países que ainda não enviaram seus compromissos teriam que fazer reduções ainda mais profundas para compensar.
Em vez disso, todos, em especial as grandes economias, devem reunir toda a ambição que puderem – independentemente de já terem apresentado sua NDC, se comprometido a fazê-lo ou se ainda estão resistindo. A crise climática não pode esperar.
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