Um dos responsáveis por trazer a tecnologia para o Brasil explica como o sistema se equilibra para evitar o mau cheiro
A composteira doméstica é uma solução plausível para a redução do lixo orgânico produzido em casa, já que não corre o risco de entupir encanamentos (como ocorre com os trituradores de pia) e de causar transtornos com demais resíduos nos lixões. Com a matéria anterior da série sobre lixo orgânico apresentando a novidade, muitos internautas ficaram em dúvida a respeito da praticidade e higiene do produto, apesar de seus efeitos benéficos ao meio ambiente.
A eCycle entrou em contato com Cesar Danna, do site de soluções para resíduos orgânicos Minhocasa, um dos responsáveis por trazer a tecnologia da composteira para o Brasil. Confira entrevista:
eCycle – É possível que a composteira cause problemas como mau cheiro e se torne um estorvo?
Cesar Danna – Sim, é possível quando não se segue a orientação de manejo. O mau cheiro ocorre quando acontece a fermentação dentro do sistema, ou seja, é gerado o gás metano. Em outras palavras, quando se deposita mais lixo orgânico úmido (parte rica em nitrogênio) do que o sistema tem a capacidade ou está dimensionado para absorver, ou ainda quando a quantidade necessária de folhas secas (parte mais rica em carbono) não é adicionada em quantidade suficiente, que deve ser o dobro em volume referente à quantidade da parte úmida. O mau cheiro ou minhocas migrando para a caixa da torneira ou para a última caixa de cima ainda vazia, é indicio de desequilíbrio no sistema. Isso é fácil de ser corrigido, diminuindo ou até mesmo fazendo uma pausa de uma semana na colocação do resíduos úmidos e adicionando uma quantidade generosa de folhas secas (carbono), além de revolver bem para que ajude na aeração do sistema e consequente equilíbrio do pH, tornando propício novamente o ambiente para a vida e reprodução das minhocas.
eCycle – O que a pessoa tem que fazer para manter a composteira limpa, além de não colocar certos tipos de alimentos?
Cesar Danna – A vermicomposteira não exige muitos cuidados em relação à higiene. Por ser um sistema fechado, está sanada a questão em relação aos vetores de doenças como ratos e baratas que não tem acesso à matéria orgânica dentro do minhocário. Seguindo a orientação correta de manejo do manual, não acontecerá a fermentação, que é o que ocasiona o mau cheiro e o desequilíbrio do sistema. Com relação à parte externa, basta de vez em quando passar um pano úmido para tirar a poeira que porventura tenha se acumulado. Uma dica é passar óleo de citronela nas paredes das caixas pelo lado de fora. Ele deixa um cheiro agradável, além de ser um excelente repelente natural para algum inseto que possa se aproximar.
eCycle – Como você teve a ideia de trazer a patente da composteira para o Brasil?
Cesar Danna – Tivemos uma experiência de oito anos vivendo em Sydney, na Austrália, onde eu e Kika Danna e Cristina Garcez, fundadores do Minhocasa, realizamos estudos de mestrado em educação ambiental e permacultura. Durante esse período, vivenciamos uma política pública no bairro onde morávamos no sentido de se fazer a gestão descentralizada dos resíduos orgânicos gerados nas residências. O raciocínio é bem lógico: se mais da metade da nossa lixeira doméstica é de origem orgânica, quando passamos a transformar essa parte do lixo em casa de uma maneira segura, o primeiro ponto a favor é que a logística de coleta diminui muito, serão necessários menos caminhões para coletar esses resíduos em nossas casas, a vida útil dos aterros sanitários e dos lixões aumentará consideravelmente e, principalmente, o impacto ambiental negativo gerado pela falta de manejo adequado da parte orgânica do lixo (que resulta hoje no chorume e gás metano) deixa de existir. O que acontecia era que o cidadão ou a família que tivesse o interesse em fazer a gestão do lixo orgânico em sua casa, era subsidiado com um minhocário da prefeitura local e recebiam um treinamento para a utilização. Aquelas famílias que realmente colocavam em prática e não enviavam mais a parte de orgânicos para a coleta ainda recebiam um abatimento de IPTU, já que todo o custo operacional da prefeitura diminuiu com aquele cidadão ou família.
A partir daí, quando retornamos ao Brasil, em 2002, trouxemos a idéia e começamos a desenvolver os minhocários para a realidade do brasileiro, já que os hábitos alimentares são muito diferentes. Por aqui ainda temos o hábito de comer muitos alimentos in natura e muitas famílias almoçam em casa. Devido ao tipo de resíduo e volume serem bem diferentes, levou-se três anos de desenvolvimento, experimentação e testes até chegarmos nos Kits Minhocasa que hoje já são em torno de seis mil espalhados por todo o Brasil.