Alta resistência do besouro ajuda a encontrar soluções para a engenharia, seguindo os princípios na biomimética
O “besouro diabólico de ferro”, como foi apelidado o inseto Phloeodes diabolicus, está inspirando engenheiros nos Estados Unidos a criar materiais mais resistentes. Estudo publicado na revista Nature mostrou que a estrutura do exoesqueleto do super-besouro pode ajudar a tornar máquinas, como turbinas de aeronaves, mais seguras e duráveis. A equipe é formada por engenheiros da Universidade de Purdue e da Universidade da Califórnia em Irvine.
Essa espécie de super-besouro possui lâminas no abdômen, semelhantes a peças de quebra-cabeça, que se travam quando o besouro é atingido por forças desproporcionais, evitando fraturas no exoesqueleto. Os pesquisadores simularam esse mecanismo de defesa com modelos das lâminas impressos em 3D. Usando placas de aço compressivas, eles descobriram que o besouro diabólico de ferro pode suportar uma carga de até 150 newtons – pelo menos 39 mil vezes maior que seu peso corporal – sem sofrer um impacto fatal.
Para se ter uma ideia, um pneu de carro aplicaria uma força de cerca de 100 newtons ao passar por cima do besouro em uma superfície de terra. Graças à sua surpreendente resistência, o super-besouro seria capaz de resistir a um atropelamento de carro! No estudo, a equipe ainda testou outras espécies de besouros, que não suportaram nem metade da força aplicada no “diabólico de ferro”.
De onde vem a resistência do super-besouro?
A partir das análises da estrutura do besouro, os engenheiros descobriram que sua espantosa resistência se deve aos seus dois élitros, asas anteriores modificadas por endurecimento em algumas espécies de insetos. Os élitros são semelhantes a uma armadura que se encontra em uma linha, chamada de sutura, estendendo-se por toda a região do abdômen do besouro. Em besouros voadores, os élitros servem para proteger as asas e facilitar o voo.
No caso do super-besouro diabólico, que não possui asas, os élitros assumem uma nova função: eles ajudam a distribuir a força aplicada de maneira mais uniforme pelo corpo, tornando-o muito mais resistente. Os pesquisadores explicam que a sutura funciona como um quebra-cabeça. Ela conecta várias lâminas exoesqueléticas, que seriam as peças do quebra-cabeça, no abdômen do besouro, sob os élitros.
A estrutura de quebra-cabeça protege o exoesqueleto do besouro de maneiras diferentes, dependendo da força aplicada. Para descobrir mais sobre o processo, os pesquisadores testaram os limites do exoesqueleto do besouro e caracterizaram os diversos componentes estruturais envolvidos, a partir da observação de tomografias. Os experimentos foram combinados com simulações de computador e modelos impressos em 3D que isolaram algumas estruturas para entender melhor como elas agem para salvar a vida do besouro.
Os estudos concluíram que a sutura em formato de quebra-cabeça do besouro oferece duas linhas de defesa para ele. A primeira é o travamento das lâminas de interconexão, para evitar que elas sejam puxadas para fora da sutura. A segunda é a capacidade que a sutura e as lâminas possuem de se deformarem de maneira mais graciosa, atenuando os impactos no exoesqueleto. Ambas as estratégias dissipam energia para impedir uma quebra fatal do pescoço, onde o exoesqueleto do besouro tem maior probabilidade de fraturar.
Assim, mesmo que uma força máxima seja aplicada ao exoesqueleto do besouro a deformação peculiar das lâminas permite que elas saiam da sutura com mais cuidado. Se essas lâminas travassem um pouco mais ou um pouco menos, a liberação repentina de energia faria o pescoço do inseto se quebrar.
Ainda não se sabe se o besouro diabólico de ferro tem uma maneira de se curar após sobreviver a um atropelamento. No entanto, conhecer essas estratégias já pode solucionar problemas em vários tipos de máquinas.
Assista ao vídeo (em inglês) disponibilizado pela Universidade de Purdue para entender melhor como funciona o processo:
Biomimética: como a engenharia pode se inspirar no super-besouro
Os pesquisadores envolvidos no projeto afirmam que um dos desafios da engenharia é juntar diferentes materiais sem limitar sua capacidade de suportar cargas. O diabólico besouro de ferro, porém, pode apresentar estratégias para contornar essas limitações. Nas turbinas a gás de aeronaves, por exemplo, metais e materiais compostos são unidos por um fixador mecânico, que adiciona peso e introduz tensões que podem levar a fraturas e corrosão.
Esses fixadores acabam diminuindo o desempenho do sistema e, por isso, têm de ser substituídos de vez em quando. Mas as suturas interfaciais do besouro diabólico de ferro fornecem uma falha robusta e mais previsível que pode ajudar a resolver esses problemas. Os pesquisadores construíram um fixador composto de fibra de carbono que imita a sutura do super-besouro – e descobriram que esse fixador é tão forte quanto um modelo padrão, mas é ainda mais resistente.
Esse trabalho revela que é possível substituir materiais fortes e frágeis por outros que podem ser fortes e resistentes, dissipando energia à medida que se quebram. O projeto segue os princípios da biomimética, ciência que estuda os princípios criativos e estratégias da natureza como inspiração e encontrar soluções para os problemas da humanidade em áreas como arquitetura, tecnologia, biologia, medicina e, evidentemente, engenharia.