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A vulnerabilidade social muitas vezes obriga pessoas a trocarem alimentos de qualidade por alimentos baratos. A consequência disso é o crescimento de doenças como a obesidade.

Uma alimentação balanceada é essencial para a saúde do ser humano. Inúmeras são as doenças relacionadas à baixa ingestão de nutrientes adequados, como hipertensão, problemas cardiovasculares, diabetes, câncer, osteoporose, além da obesidade. O consumo de alimentos ricos em gorduras e açúcares simples, em sódio, contaminados com agrotóxicos, e com outros aditivos alimentares, é prejudicial em diversos níveis para nosso organismo. Estudos comprovam a relação do consumo de alimentos com agrotóxicos e a diabetes e de alimentos processados com o câncer, por exemplo.

Além da consciência sobre o conteúdo nutricional dos alimentos, existe outro fator determinante para uma escolha de alimentos de baixo valor nutricional: a vulnerabilidade social. Poucos são os que podem realmente escolher a qualidade da comida que chega à mesa. Por mais que alimentos orgânicos sejam o ideal, essa realidade ainda está muito distante para a maioria dos consumidores. A insegurança alimentar é um fator de risco, não somente para a inanição, mas para doenças relacionadas à uma alimentação deficiente, como a obesidade.

O que é a insegurança alimentar?

Para entender o que é insegurança alimentar, temos de ter em mente que não significa necessariamente a abundância dos alimentos. 

Insegurança alimentar é quando o acesso e a disponibilidade de alimentos são escassos. Se uma família não tem acesso regular e permanente à alimentação, em quantidade e qualidade adequadas, ela está em situação de insegurança alimentar. As escalas de insegurança abrangem situações de alimentação de má qualidade até a fome em larga escala. A situação pode ser crônica ou transitória e o acesso pode ser limitado a algum momento do ano, devido à falta de dinheiro e outros recursos. A situação econômica familiar está intimamente ligada à insegurança alimentar, existindo principalmente em países pobres e em desenvolvimento. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil, a insegurança alimentar atinge 52 milhões de brasileiros.

As duas faces do mesmo problema

Fome e obesidade
Legenda: pobreza na maior parte do mundo / pobreza na América (EUA)

Normalmente, quando a imagem de deficiência alimentar vem à mente, pensamos em um indivíduo com fome e excessivamente magro, parecido com o primeiro homem da charge acima. Contudo, mesmo que graus agudos de deficiência alimentar sejam sinônimos de fome, nem sempre a carência alimentar expressa automaticamente tal fenômeno.

A troca da qualidade dos alimentos com o objetivo de otimizar os recursos financeiros é muito comum nas famílias de baixa renda, e a consequência é a obesidade. Essa carência alimentar é mais difícil de identificar, porém, é potencialmente perigosa. A má alimentação gera uma cascata de vulnerabilidades, que muitas vezes se traduz em doenças. Essa fome, parcialmente saciada com uma dieta pobre em carboidratos complexos e rica em açúcares simples e gorduras, compromete ainda mais a qualidade de vida de pessoas já prejudicadas socialmente.

A questão da alimentação não se resume apenas a ter comida na mesa ou não, ela também envolve a qualidade, procedência e elaboração dessa comida. Não se trata apenas de comer, mas de comer bem. A privação de comida, fome severa e a obesidade são a ponta de um iceberg muito maior do que temos noção. As deficiências de micronutrientes como ferro, vitamina A e iodo são crescentes. Bilhões de pessoas sofrem hoje as consequências do modelo de alimentação fast food, que mina a saúde e aumenta os casos de diabetes, alergias, colesterol alto, hiperatividade infantil, etc.

Imagem de OpenClipart-Vectors por Pixabay 

Cada vez mais pessoas são empurradas a comprar produtos baratos e menos nutritivos. Embora a situação de insegurança alimentar no Brasil tenha diminuído com o auxílio de programas federais, a falta de qualidade do alimento é um problema exponencial, que gera muita preocupação. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta a obesidade como um dos maiores problemas de saúde pública no mundo. A projeção é que, em 2025, cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam com sobrepeso, e mais de 700 milhões, obesos. No Brasil, números da pesquisa Vigitel 2014 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) indicam que mais da metade de população está acima do peso (52,5%) e, destes, 17,9% são obesos.

A fome e a obesidade são dois lados da mesma moeda: um sistema alimentar que não funciona e condena milhões de pessoas à má nutrição. De acordo com o relatório O Estado Mundial da Agricultura e da Alimentação 2013, publicado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), 870 milhões de pessoas no mundo passam fome, enquanto 500 milhões têm problemas de obesidade. Como afirma Raj Patel em seu livro Obesos e famélicos (Los Libros de Lince, 2008): “A fome e o sobrepeso globais são sintomas de um mesmo problema. (…) Os obesos e os famélicos estão vinculados entre si pelas cadeias de produção que levam os alimentos do campo à nossa mesa”.

A cadeia agroalimentar foi afastando progressivamente a produção do consumo. Cada vez mais empresas agroindustriais apropriam as diferentes etapas da cadeia, o que gera uma perda de autonomia tanto dos camponeses quanto dos consumidores. O modelo agrobusiness busca o lucro econômico em detrimento das necessidades alimentares das pessoas e do respeito ao meio ambiente.

Para transformar esse paradigma, é fundamental promover uma agricultura local, diversa, camponesa e sustentável, que respeite o território, entendendo o comércio internacional como um complemento à produção local. Atualmente, grande parte dos grupos de consumo se encontra nos núcleos urbanos. A distância e a dificuldade para contatar diretamente com os produtores são maiores nessas condições. Contudo, obter informações sobre o conteúdo nutricional e preços menores para os alimentos mais saudáveis, incluindo frutas e legumes, é necessário. Estratégias inovadoras para tornar mais acessíveis os produtos nutritivos são essenciais para transformar as escolhas alimentares saudáveis em escolhas fáceis.

Escândalos alimentares, como a doença da vaca louca, os frangos com dioxinas, a gripe suína e as carnes processadas e o câncer, demonstram a importância de dedicarmos mais atenção à qualidade dos alimentos que consumimos e à sua origem. A alimentação é uma questão de saúde pública. Devemos reivindicar que o acesso a comida de qualidade seja mais justo. Comer importa, e comer bem mais ainda.

Confira no vídeo a reportagem feita pela TV Brasil “Fome e obesidade: Os retratos da pobreza”.

 


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