Empresas do setor de óleo e gás deixam de ser obrigadas a investir até 1% da receita bruta em projetos para desenvolvimento tecnológico em parceria com universidades
Por Sidney Rodrigues Coutinho, do Conexão UFRJ | O Congresso Nacional, na semana passada, aprovou a medida provisória que institui o Programa de Aumento da Produtividade da Frota Rodoviária no País (Renovar), com a proposta de tirar das estradas caminhões e ônibus com 30 anos ou mais de uso. Todavia, para financiar a operação, senadores e deputados federais permitem às empresas de exploração e produção de petróleo e gás natural direcionar parte do investimento obrigatório em pesquisa, desenvolvimento e inovação para financiar o desmonte e a transformação de caminhões antigos em sucatas.
Há 25 anos, as empresas do setor de óleo e gás são obrigadas a investir entre 0,5% e 1% da sua receita bruta em projetos de pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico, como contrapartida ao direito de exploração das reservas de óleo e gás do país, conforme a Lei nº 9.478/97. Até o ano passado, bilhões de reais transformavam-se em projetos de interesse da própria indústria petrolífera, em parceria com universidades e outras instituições públicas de pesquisa.
O Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies) criticou a decisão e, em nota, afirmou que a aprovação da medida foi “um desastre sobre as conquistas da ciência que colocaram o Brasil na lista dos dez maiores produtores mundiais de petróleo, com reservas de 11,8 bilhões de barris”.
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) lamentou a decisão de desviar verbas da ciência para finalidades prejudiciais ao meio ambiente e à economia em médio ou mesmo curto prazos. Outras entidades, como a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) − compõem a Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento Brasileiro (ICTP.Br) −, também se manifestaram, em nota, para criticar a decisão do Congresso Nacional, que consideram equivocada.
Para a pró-reitora de Pós-Graduação e Pesquisa (PR-2) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Denise Freire, ainda não é possível fazer a estimativa do tamanho de perdas geradas pelo fim da obrigatoriedade de investimentos em ciência e tecnologia. “Mas toda a comunidade científica está muito indignada com a decisão. Todas as conquistas que tivemos nos últimos anos em infraestrutura de pesquisa foram graças a esses recursos, como o desenvolvimento da expertise em prospecção em águas profundas. Poucos países tinham uma legislação como essa no mundo, que beneficiava diversas áreas, inclusive as mais novas, como a biotecnologia”, disse Freire.
A medida provisória estava em vigor e precisava ser aprovada pelo Congresso até 11/8 para se tornar lei, como acontece com as iniciativas do Poder Executivo encaminhadas dessa maneira e que têm validade automática de até quatro meses, contados a partir da publicação no Diário Oficial da União. Como os senadores mantiveram as modificações aprovadas pela Câmara dos Deputados, os trechos alterados em relação à MP original serão enviados à sanção do presidente Jair Bolsonaro, na forma do Projeto de Lei de Conversão (PLV) nº 19/2022. Depois de aprovados, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) coordenará o Renovar, que terá as diretrizes estabelecidas com a participação dos setores do transporte, da indústria e da sociedade civil.
Este texto foi originalmente publicado por Conexão UFRJ de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.