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Saúde da mulher | Problemas como dificuldade de chegar ao orgasmo ou falta de libido têm tratamento, mas tabus e desconhecimento dificultam o diagnóstico

Por Luísa Teixeira Mendonça, da UFRGS | Se você é mulher, provavelmente já fingiu orgasmo ou conhece alguma amiga que já passou por isso. No entanto, mascarar a falta do ápice do prazer, apesar de comum, não deve ser encarado como algo normal. A dificuldade de chegar ao orgasmo – assim como outras questões que impedem uma vida sexual plena – pode ser caracterizada como uma disfunção sexual.

A coordenadora do Ambulatório de Fisioterapia Pélvica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Luciana Paiva, explica que, quando falamos em sexualidade, não estamos nos referindo apenas ao ato sexual, mas também aos sentimentos e à forma como nos relacionamos com o outro. Os vínculos, os desejos e os prazeres fazem parte desse momento. A disfunção sexual, portanto, é multifatorial e pode ocorrer em qualquer momento da vida. A professora explica que essas disfunções, entretanto, acabam sendo subnotificadas porque a maioria das pessoas têm vergonha de falar sobre isso.

Em uma pesquisa publicada na Revista Brasileira de Sexualidade Humana, foi feito um levantamento sobre a prevalência de disfunções sexuais femininas em unidades de saúde de Curitiba. Foram entrevistadas 100 mulheres em quatro unidades de saúde da cidade, das quais 49% relataram alguma dificuldade sexual e 37% apresentaram disfunção sexual. Os pesquisadores também constataram um desconhecimento dessas mulheres a respeito do assunto.

A fisioterapeuta pélvica e sexóloga Thais Freire conta que a maior dificuldade que as pacientes apresentam é a falta de libido. Depois disso, vem a dificuldade de atingir um orgasmo. E o que chama a atenção, também, é o grande número de casos de mulheres que conseguem apenas eventualmente (e com dificuldade) chegar ao orgasmo.

Para desvendar a origem do problema, Luciana, que também é professora da disciplina de Saúde da Mulher e do Homem no curso de Fisioterapia da UFRGS, relata que o primeiro passo é entender que a disfunção sexual sempre é secundária a alguma coisa. Normalmente é uma resposta negativa a alguma situação – seja uma doença, uma medicação ou uma vivência. A docente também lembra a importância de uma vivência sexual plena.

“Quando a gente pensa na vida sexual feminina, precisamos lembrar que a própria Organização Mundial da Saúde fala que o componente da vida sexual faz parte da qualidade de vida. A partir disso, então, se pressupõe que é multidimensional essa qualidade de vida e que a vida sexual faz parte desse processo”

Luciana Paiva

Mulheres também brocham

A origem embrionária do tecido que forma o pênis e o clitóris é a mesma, assim como a origem da excitação do homem e da mulher, que vem do sistema nervoso central. Quando o homem tem uma ereção, isso gera uma maior circulação de sangue no local, que incha, dilata e fica mais sensível ao toque. O clitóris passa pelo mesmo processo. Thais Freire explica que esse processo é muito mais visível no homem, porque, ao contrário da mulher, o órgão reprodutor está fora do corpo. Ela sugere que as mulheres se olhem com um espelho quando estão excitadas e quando não estão, pois é possível visualizar a diferença dessas alterações.

Como a excitação do homem e da mulher é conduzida pelas mesmas vias, as respostas corporais acabam sendo muito parecidas. “Aconteceu alguma coisa, ficou frio, o cara falou uma besteira no ouvido, [a mulher] tá chateada, não tá com a cabeça naquele dia, então isso [a mulher perder o interesse] pode acontecer de fato. Mas aí que está o problema, porque a maioria das mulheres ignora essa situação, coloca um lubrificante e vai assim mesmo.” A sexóloga complementa que, muitas vezes, dores eventuais nas relações sexuais têm como motivação a mulher não estar excitada, porque, quando a excitação ocorre, o corpo se transforma para aquele momento: o clitóris fica maior, a vagina relaxa e o canal vaginal quase dobra de tamanho.

O machismo também influencia nos bloqueios sexuais. “Tem também uma questão da masculinidade. Os homens também têm essa coisa de pensar ‘eu que faço a mulher ter prazer, eu que faço a mulher ter orgasmo’, como se fossem o detentor do prazer feminino. Na verdade, não, é uma troca, uma vivência que se experimenta a dois ou sozinho. As mulheres e os homens também podem vivenciar os seus próprios prazeres sozinhos”, explica Luciana.

Quando buscar ajuda

Ao contrário do que se pensa, a disfunção não é algo que ocorre apenas no momento do ato sexual, pois o ciclo é composto de três etapas: desejo, excitação e orgasmo. Por isso, quando pensamos em disfunção sexual, precisamos entender em que momento desse ciclo o problema está ocorrendo. As disfunções podem estar presentes em situações diversas, como na falta de desejo, no sintoma de dor, no desconforto ou na diminuição da lubrificação. No caso de o problema ser a falta de orgasmo, essa disfunção é nomeada anorgasmia. O diagnóstico, entretanto, não é simples: Thais salienta que, além de a mulher não conseguir chegar ao ápice do prazer, isso precisa gerar um sentimento de angústia para, então, ser caracterizado como disfunção. 

Em dez anos de atuação no HCPA, Luciana ressalta que a maior parte das pacientes tem mais de 50 anos e apresenta incontinência urinária – problema que, segundo a docente, acarreta uma maior tendência ao desenvolvimento de disfunções sexuais. Por isso, é importante estar atenta a outros problemas de saúde, como corrimentos, infecções urinárias ou sexualmente transmissíveis, que, se não forem tratados da maneira correta, podem deixar sequelas e desencadear uma disfunção.

A estudante de Relações Públicas Júlia Carminatti, de 23 anos, conta que, mesmo indo ao ginecologista periodicamente, passou por uma disfunção sexual. No início da sua vida sexual, sentia dificuldade em ficar lubrificada: “Morria de medo porque eu não conseguia sentir prazer de jeito nenhum, era muito difícil pra mim”, comenta. Após passar por mais de 3 experiências ruins, resolveu buscar ajuda. Ao relatar a situação para a ginecologista que a acompanhava, obteve a recomendação de que, com o tempo, ganharia mais confiança e que poderia usar um lubrificante para amenizar a situação.

Ela, então, desabafou com uma amiga, que também passava por dificuldade parecida – tinha vaginismo – e resolveu consultar uma fisioterapeuta pélvica. Na primeira consulta, Júlia descobriu que tinha um pequeno problema de contração do músculo vaginal que, no futuro, poderia fazê-la desenvolver incontinência urinária. O tratamento consistiu em realizar exercícios físicos de contração e relaxamento do canal vaginal e escrever pequenos textos que simbolizavam uma história sexual. Nos textos, a estudante descrevia uma cena desde o início até o final para exercitar a imaginação, o que a ajudava a entender do que gostava ou não.

A qualidade de vida para Júlia não está relacionada a ser sexualmente ativa, mas ao fato de não apresentar mais problemas nessa área. Conta que, sem ajuda profissional, não teria explorado essa área da vida e não conseguiria se conhecer como se conhece hoje. Para ela, a mudança após o tratamento foi enorme: reconhece que antes tinha um bloqueio total e que hoje, além de se sentir confortável nas relações sexuais, também não tem vergonha de falar sobre isso. “Eu acho que é muito uma questão de saúde pra quem não tem como [buscar uma fisioterapeuta pélvica]. Eu acho que buscar conversar sobre isso, tudo bem que a gente tem um pouco de vergonha, mas acho que é uma coisa importante tu compartilhar essas experiências porque, às vezes, outras pessoas estão passando pela mesma coisa e podem te dar um norte”, sintetiza.

Este texto foi originalmente publicado pela UFRGS de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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