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No âmbito do Protocolo de Kyoto, os projetos MDL com maior registro na Convenção do Clima foram os relacionados às energias renováveis

Por Lira Luz Benites Lazaro, pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados da USP, em Jornal da USP | Embora haja alta irradiação solar na região latino-americana, apenas foram registrados 25 projetos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) para a fonte solar fotovoltaicos até julho de 2021, dos quais apenas um do Brasil. Esta baixa adesão ao MDL pode estar relacionada a dois fatores principais. Em primeiro lugar, o baixo preço dos créditos certificados de redução de emissões (CERs). Em segundo lugar, devido à incerteza nas negociações no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima para um acordo além do Protocolo de Kyoto e sua continuidade no âmbito do Acordo de Paris.

Ao longo das negociações do artigo 6 do Acordo de Paris, os governos procuraram garantir que as novas regras do mercado de carbono internacional aprendessem com o histórico misto do MDL, isto é, reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE), ajudando assim os países desenvolvidos a cumprir seus compromissos quantificados e, por outro lado, promover o desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento.No âmbito do Protocolo de Kyoto, os projetos MDL com maior registro na Convenção do Clima foram os relacionados às energias renováveis. O MDL desempenhou um papel importante no aumento da participação no mercado de fontes renováveis e nos investimentos na diversificação das fontes de energia. Contribuiu para os planos de transição energética, uma vez que o papel das energias renováveis na redução da dependência de combustíveis fósseis é reconhecido como essencial para a transição para fontes de baixo carbono.

Nossa análise dos projetos de MDL na energia solar indicam lacunas nas contribuições para o desenvolvimento sustentável nas suas dimensões econômica, social e ambiental. Por exemplo, a transferência de tecnologias é mencionada nos projetos, mas na verdade o que ocorre é a importação de equipamentos e o treinamento de trabalhadores locais para manusearem essas tecnologias, o que indica uma dependência aos mercados externos e não implica necessariamente no desenvolvimento da indústria solar local. O envolvimento da comunidade e a igualdade de oportunidades de gênero continuam a ser desafios. A geração de emprego, na etapa de implantação dos empreendimentos, foi a contribuição mais presente nos projetos.

Enfatizamos que questões de uso de terra para cultivo de alimentos e para instalação de painéis solares ainda são negligenciadas nestes projetos. Geralmente, não existe um planejamento espacial adequado para a instalação de energia solar ou eólica na América Latina, pois grandes fazendas solares podem ocupar espaços destinados à agricultura, conflitando com a produção de alimentos e a demanda de terra associada. Assim, o planejamento espacial e energético não deve ser percebido como separado e distinto, mas sim como um continuum de análises setoriais que levam a soluções ótimas, e os conflitos de terra são problemas potenciais emergentes do impulso para esses projetos. Assim, os indicadores de uso da terra devem ser considerados nas políticas energéticas e climáticas para reduzir os usos competitivos de terras agrícolas, florestas manejadas e os impactos do desmatamento para construção e instalação de usinas solares fotovoltaicas.

Ressalta-se a necessidade de políticas nacionais de energia e clima na região, estabelecer diretrizes/normas para avaliar os cobenefícios para o desenvolvimento sustentável de projetos de redução de GEE, alinhadas com as novas regras do mecanismo de mercado de carbono, Agenda 2030 da ONU, e a transição energética. Os projetos de MDL, desde que entraram em vigor em 2005, receberam críticas por serem percebidos como uma falsa solução para mitigar as mudanças climáticas, porque legitimam o aumento das emissões de GEE ao fornecer uma maneira barata para os países poluidores evitarem tomar medidas sérias sobre as mudanças climáticas e pela sua pouca contribuição para o desenvolvimento sustentável.

Conforme discutimos no artigo recém-publicado na Energy Policy, que teve participação de colegas da Universidade Federal de Bahia e Durham Energy Institute, essas críticas refletem as contradições de algumas soluções de mudança climática que podem trazer externalidades negativas e perversidades tanto para o meio ambiente quanto para as comunidades em que esses projetos são implementados. Porquanto o próprio conceito de transição energética envolve dilemas éticos, não implicando necessariamente uma transição ou transformação política. Esses projetos, sejam eles de energias fósseis ou renováveis, seguem mentalidades coloniais e de dependência em muitos países em desenvolvimento.

Por fim, defende-se que o novo mecanismo de mercado do Acordo de Paris, artigo 6.4, não deve apenas priorizar a dimensão econômica – comercialização dos créditos de carbono, mas também ser mais enfático em termos de normas/regras para verificar se os projetos de redução de GEE contribuem para o desenvolvimento sustentável, sem que surjam novos custos de transação.


Este texto foi originalmente publicado pelo Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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