Leitões originados dos machos criados em celas demonstraram uma percepção ampliada da dor, indicando que o ambiente ao qual o pai é exposto pode influenciar diretamente o bem-estar do filho
Um estudo recente, respaldado pela Fapesp e divulgado na revista Frontiers in Animal Science, revelou que o ambiente de confinamento dos suínos machos, e não somente das fêmeas como anteriormente se supunha, desempenha um papel crucial na forma como os filhotes lidam com o estresse, impactando diretamente no bem-estar desses animais.
O estudo faz parte do projeto “A contribuição do macho para o desenvolvimento de fenótipos robustos e o papel mitigador do bem-estar das fêmeas suínas”, financiado pela FAPESP e coordenado por Márcia Zanella.
Durante os experimentos, 138 leitões com 25 dias de vida foram submetidos a testes comportamentais para avaliar seu estado emocional, juntamente com análises de saliva para verificar os níveis de cortisol, um indicador de estresse.
Somente após esses procedimentos é que foram realizados testes de paternidade para determinar a origem paterna de cada leitão, uma vez que o sêmen dos animais em condições distintas foi misturado antes da inseminação das fêmeas, resultando em leitões com diferentes pais.
Os doadores do sêmen foram submetidos a um dos três tipos de tratamento por quatro semanas: confinamento em celas onde apenas podiam se levantar e deitar, condições típicas de criações comerciais; alojamento em baias individuais com mais espaço; ou baias individuais enriquecidas.
Nas baias enriquecidas, os machos recebiam cuidados especiais, incluindo banhos diários, estímulos táteis como escovação diária, além de acesso a feno para mastigar ou deitar. A alimentação e a disponibilidade de água foram mantidas iguais em todos os tratamentos.
Os resultados revelaram que as condições de confinamento dos machos influenciaram significativamente a epigenética da prole. Os filhotes dos machos criados em celas demonstraram modificações nos estados emocionais associados à ansiedade e ao medo em todos os testes comportamentais realizados.
Epigenética, do grego “epi“, que significa acima, e genética, de “gene”, é um termo originalmente cunhado pelo biólogo Conrad Waddington, em 1940. Ele se referia à relação entre os genes e os seus efeitos nas características observáveis de um organismo ou população.
A epigenética diz respeito a alterações do DNA que não modificam sua sequência, mas afetam a atividade de um ou mais genes. Adicionar compostos químicos a genes, por exemplo, pode alterar sua atividade, sem necessariamente promover mudanças no DNA.
Além dos resultados mencionados, os testes de saliva revelaram um aumento nos níveis de cortisol nos filhotes dos machos criados em celas e baias após os testes comportamentais, enquanto nos leitões cujos pais foram alojados em baias enriquecidas, não houve diferença nas medições antes e depois dos testes.
Esses resultados corroboram um estudo anterior do grupo, que utilizou os mesmos animais e tratamentos. Neste estudo, os pesquisadores demonstraram que os machos criados em baias enriquecidas geraram mais leitões vivos que sobreviveram ao primeiro mês de vida.
Adicionalmente, os leitões originados dos machos criados em celas demonstraram uma percepção ampliada da dor, indicando que o ambiente ao qual o pai é exposto pode influenciar diretamente o bem-estar do filho.