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Adoção de técnicas para aumentar a eficiência no uso desses produtos, inoculação de microrganismos em sementes e mapeamento de novas fontes de insumos têm potencial de amenizar a necessidade de importação

Por Tiago Jokura, da Pesquisa Fapesp | Em março, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento lançou uma nova versão do Plano Nacional de Fertilizantes (PNF) com o objetivo de reduzir a dependência de matéria-prima importada para a produção de fertilizantes químicos. As metas são agressivas: diminuir as importações dos atuais 85% para 60% até 2030 e 45% até 2050. Uma estratégia do plano é levar ao produtor rural conhecimento que permita aumentar a eficiência do uso desses produtos e manejar o solo de modo sustentável. Com esse objetivo, a Embrapa iniciou em maio a Caravana Embrapa FertBrasil, jornadas em 48 polos agrícolas do país para preparar técnicos e agricultores para aproveitar fontes de fertilizantes pouco utilizadas, como a biomassa, e ensinar técnicas para reduzir perdas na aplicação. A expectativa é aumentar a eficiência no uso de fertilizantes. “Essa medida deve permitir aos produtores rurais economia nas despesas com esses insumos”, afirma o agrônomo José Carlos Polidoro, da Embrapa Solos, no Rio de Janeiro.

Aprimorar o manejo é importante, mas não suficiente. “É preciso também implementar políticas de estímulo à fabricação nacional a partir de tecnologias que já dominamos”, afirma o engenheiro de materiais Caue Ribeiro, da Embrapa Instrumentação, em São Carlos.

Atualmente, há cerca de 20 projetos industriais interrompidos no país que têm como meta produzir fertilizantes nitrogenados, fosfatados e potássicos – contendo, respectivamente, os elementos químicos nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K), essenciais ao crescimento das plantas. Esses fertilizantes são usados em proporções diferentes a depender do tipo de cultura e das características do solo.

Um desses projetos é a unidade de fertilizantes nitrogenados que a Petrobras começou a construir em 2011 em Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, cujas obras só foram retomadas neste ano. “Existem ainda projetos para produção de fertilizantes fosfatados em São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e de fertilizantes potássicos na Amazônia, com limitações ligadas a restrições ambientais ou de viabilidade”, comenta Polidoro.

O Brasil é o terceiro maior produtor de alimentos no mundo, perdendo apenas para a China e a Índia. Em 2019, a agricultura brasileira gerou 1,08 bilhão de toneladas de cereais, hortaliças, frutas, oleaginosas, raízes e tubérculos, o equivalente a 11% da produção mundial, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) apresentados no World Food and Agriculture Statistical Yearbook 2021. Essa produção exige o uso de grandes quantidades de fertilizantes químicos, o que torna o país o quarto maior consumidor em volume total desses insumos. Segundo o anuário, foram 16,5 milhões de toneladas em 2019, ante 19,9 milhões nos Estados Unidos, 29,9 milhões na Índia e 47,5 milhões na China.

A dependência externa de matéria-prima cresceu mais de quatro vezes nas duas últimas décadas e se tornou mais evidente com a invasão da Ucrânia pela Rússia. A necessidade de importação deixa a agricultura nacional vulnerável a elevações de preço definidas pelos poucos países responsáveis pelo fornecimento mundial – esses aumentos ocorrem tanto por influência do incremento na procura nos últimos anos quanto pelo cenário geopolítico, caso da guerra na Ucrânia. A Rússia é o maior produtor da principal commodity do mercado mundial de fertilizantes: o granulado NPK, o mais usado no Brasil, contendo os três elementos. “Cerca de 22% dos fertilizantes importados pelo Brasil vêm da Rússia”, conta o agrônomo Paulo César Teixeira, da Embrapa Solos. “O governo brasileiro tem buscado outros fornecedores e aparentemente não haverá escassez no curto prazo.”

A dependência externa de quase todo o fertilizante usado no país é, em parte, fruto de políticas adotadas nas últimas três décadas. A produção nacional, iniciada nos anos 1970, era estatal e foi privatizada nos anos 1990. Os produtores passaram, então, a ter dificuldades em mantê-la por razões econômicas e estruturais, como o alto custo logístico e as dificuldades de extração e processamento da matéria-prima brasileira devido a características geofísicas. “As empresas preferiram começar a produzir fora e a trazer para o Brasil, algo facilitado em 1997 pela isenção de impostos estaduais e federais sobre a importação”, conta Polidoro. Os subsídios continuaram até 2021.

“Por causa dos valores elevados para a instalação de fábricas, dos impactos no ambiente e da logística envolvida, os fertilizantes nunca foram commodities atrativas para os produtores privados”, afirma o engenheiro-agrônomo José Oswaldo Siqueira, professor emérito da Universidade Federal de Lavras (Ufla) e ex-diretor científico do Instituto Tecnológico Vale (ITV). Por causa dessas características do mercado e do aumento da produção agrícola nacional, a importação de fertilizantes, que era de 20% no final dos anos 1990, cresceu desde então a um ritmo de 6% a 8% ao ano e ampliou o déficit.

Há, no entanto, espaço para aprimorar e reduzir o uso de fertilizantes químicos. É que o Brasil utiliza uma concentração elevada por área. São, em média, 304 quilogramas por hectare (kg/ha), inferior apenas à da China (393 kg/ha) e mais de duas vezes superior à média mundial (137 kg/ha).

Especialistas ouvidos por Pesquisa FAPESP afirmam que, além de uma desejável retomada da produção nacional, seria necessário fomentar a fabricação de fertilizantes mais eficientes, com menor perda de nutrientes e melhor aproveitamento pelas plantas.

Há pouco mais de uma década, Ribeiro, da Embrapa, e colaboradores da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos desenvolveram, com apoio da FAPESP e de agências federais de fomento, um material nanoestruturado à base de argila e ureia que permite a liberação lenta de nitrogênio e diminui sua perda por volatilização para a atmosfera, um dos principais fatores que reduzem a eficiência dos fertilizantes nitrogenados. Descrito em 2012 no Journal of Agricultural and Food Chemistry, o processo de produção dos grânulos rendeu uma patente à Embrapa. Os grânulos do novo fertilizante de liberação lenta foram testados no plantio de uma gramínea forrageira em casa de vegetação e em campo e se mostraram mais eficientes do que os fertilizantes comuns e uma versão de liberação lenta disponível comercialmente, segundo resultados publicados em 2017 na revista ACS Sustainable Chemistry and Engeneering. “Houve uma redução de até 90% da emissão de gases volatilizados para a atmosfera”, relata Ribeiro.

Para Polidoro, é possível ganhar mais autonomia com a adoção de boas práticas no manejo da adubação, a utilização de bioinsumos e resíduos de potencial uso agrícola, além de outros produtos, como os fertilizantes organominerais (combinações de NPK com fontes orgânicas).

A inoculação de microrganismos selecionados (bactérias ou fungos) em sementes de alguns grãos também pode reduzir a necessidade de adubação com nitrogênio. Pesquisas iniciadas no Brasil nos anos 1960 pela agrônoma Johanna Döbereiner (1924-2000), nascida na antiga Checoslováquia, mostraram que bactérias do gênero Rhizobium, que vivem no solo, transformam o nitrogênio da atmosfera em nutriente para certas leguminosas, como a soja. Esse processo gera uma economia de US$ 2 bilhões por ano para os produtores brasileiros.

Atualmente, bactérias e fungos selecionados podem ser aplicados junto com as sementes durante o plantio, favorecendo a fixação de nitrogênio e aumentando sua disponibilidade para as plantas. “Outros inoculantes, como as bactérias Azospirillum brasiliense, têm sido testados para fixação biológica de nitrogênio no milho e a Embrapa já desenvolveu soluções para elevar a disponibilidade de fósforo em outras culturas”, afirma Ribeiro.

Em outra alternativa, o Serviço Geológico do Brasil (SGB) vem mapeando em São Paulo e outros estados rochas de potencial interesse agrícola, contendo fósforo, potássio, macro e micronutrientes. Essas rochas podem ser trituradas até se transformarem em um pó fino que, depois, é depositado no solo. “Essa estratégia vem sendo usada de modo consistente por proprietários privados no país”, afirma o agrônomo Ruy Caldas, pesquisador colaborador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP. Em junho, o SGB e a Esalq assinaram um acordo de cooperação para investigar a eficácia dessa estratégia. Segundo Caldas, ela pode ter um impacto importante no setor sucroalcooleiro.

Este texto foi originalmente publicado pela Pesquisa Fapesp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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