Estratégias urbanas para enfrentar o calor podem ampliar desigualdades climáticas

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Uma solução pensada para amenizar o calor nas cidades, como pintar telhados e calçadas de branco, pode aquecer áreas vizinhas e aumentar desigualdades climáticas, segundo um estudo publicado na Geophysical Research Letters. A técnica, conhecida como gerenciamento radiativo da terra (LRM, na sigla em, inglês), traz benefícios pontuais, mas seus impactos laterais geram preocupações.

O gerenciamento radiativo da terra (LRM) consiste em estratégias para reduzir a absorção de calor em regiões urbanas, utilizando superfícies reflexivas que desviam a luz solar. Essa abordagem tem como objetivo principal resfriar áreas densamente habitadas, especialmente em regiões mais vulneráveis às ondas de calor. Entretanto, de acordo com a modelagem conduzida por Yu Cheng e Kaighin McColl, essa técnica pode desencadear consequências climáticas imprevistas, afetando diretamente comunidades próximas às zonas aplicadas.

Enquanto dentro da área coberta pelo LRM há um efeito líquido de resfriamento, graças à reflexão solar, as regiões vizinhas enfrentam o impacto da redução de precipitação. O menor volume de chuva diminui a umidade do solo, reduzindo o resfriamento natural gerado pela evaporação. Como resultado, essas áreas podem experimentar um aumento considerável na temperatura, entre 1 e 4 vezes maior do que a redução obtida na zona tratada.

Os pesquisadores apontam que, caso o LRM seja amplamente adotado em regiões urbanas de maior renda, situadas ao lado de bairros periféricos, pode haver um agravamento das desigualdades climáticas. A aplicação da técnica em larga escala teria o potencial de concentrar benefícios em áreas mais privilegiadas, deixando comunidades de baixa renda expostas a condições ainda mais severas de calor.

Apesar dessas limitações, o estudo destaca que, quando aplicado em escalas menores – de até um quilômetro de diâmetro –, o LRM pode oferecer resfriamento sem impactos negativos expressivos na precipitação local. Por outro lado, em zonas muito maiores, com mais de 10 quilômetros de extensão, o efeito benéfico pode se sobrepor ao aquecimento periférico, ampliando áreas de resfriamento e diminuindo os riscos associados.

Os achados reforçam a importância de uma análise cuidadosa antes de implementar tais estratégias, especialmente em contextos onde a desigualdade socioeconômica já é marcante. Medidas que buscam adaptar as cidades às mudanças climáticas precisam considerar tanto os benefícios diretos quanto os possíveis efeitos colaterais, garantindo que soluções sejam inclusivas e equilibradas.

Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)

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