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Por Luís Patriani em Mongabay

  • Pesquisa envolvendo cientistas de 18 países constatou que as florestas tropicais são mais resilientes do que se supunha, com grande capacidade de se recuperar sozinhas em poucas décadas.
  • Foram analisados 2.200 trechos de floresta na África Ocidental e nas Américas Central e do Sul, incluindo áreas de Mata Atlântica e Amazônia, e da África Ocidental.
  • Nas áreas estudadas, a fertilidade do solo havia sido restaurada em apenas dez anos depois do desmate; a partir de 25 anos, já se observava a regeneração da estrutura e do funcionamento da floresta.
  • A biodiversidade, porém, levou mais tempo para se recuperar plenamente – em média 120 anos.  

As florestas tropicais são mais resilientes do que se supunha e têm grande capacidade de regeneração natural quando o processo de reconstrução acontece em áreas abandonadas pouco degradadas e próximas a remanescentes de vegetação nativa.

Surpreendentemente rápidas em sua reconstituição, em menos de vinte anos as matas secundárias podem recuperar importantes características e funções das matas originais, como a fertilidade do solo e parte relevante dos estoques de carbono.

No entanto, para alcançar este potencial de reconstrução de baixo custo e amparar iniciativas de restauro e conservação, é preciso entender suas diferentes características, cessar o desmatamento e manter de pé as florestas antigas e saudáveis que estiverem nas proximidades.

É o que apontou um estudo inédito feito pela 2ndFOR, uma rede de pesquisa colaborativa em florestas secundárias que envolve mais de cem cientistas em 18 países, publicado recentemente na revista Science.

Área de Floresta Amazônica em regeneração no município de Tefé, no Amazonas. Foto: Frans Bongers.

O trabalho desenvolvido pelo consórcio internacional, que inclui o Brasil, inovou por conta de dois pontos principais em sua estratégia de investigação. O primeiro foi a abordagem que procurou entender o desenvolvimento de cada função da floresta e a relação entre estes atributos ao longo do tempo de sucessão. A maior parte das observações até então focava na recuperação de um ou outro serviço ecossistêmico como sequestro de carbono, biodiversidade ou melhoria do solo.

O segundo ponto de destaque é abrangência do estudo. Os projetos existentes se debruçavam na análise de alguns locais específicos. O artigo da 2ndFOR reuniu uma base de dados juntando áreas secas e úmidas de florestas tropicais e subtropicais em todo o mundo, incluindo mais de 2.200 parcelas de florestas da Américas Central e do Sul, entre elas áreas de Mata Atlântica e Amazônia, e da África Ocidental.

“Estudamos diferentes florestas localizadas em diversos tipos de clima, solo e situação de paisagem. Por termos uma amostra muito grande e bem distribuída, nossos resultados devem se aproximar muito da “verdade de campo”, do padrão geral médio de regeneração de florestas tropicais”, diz Pedro Brancalion, professor do Departamento de Ciências Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e um dos autores do artigo.

Agora é a vez das florestas

Brancalion ressalta a importância de avaliar outros tipos de novas florestas, além das secundárias, para definir metas e modelos de recuperação de acordo com as características de cada uma delas.

“Notamos que faltava avançar o conhecimento sobre todos os tipos de novas florestas, como plantios de restauração, agroflorestas e monocultivos abandonados de eucalipto. As pessoas investem em restauro porque querem usufruir dos benefícios, como sequestro de carbono, conservação de biodiversidade, proteção de mananciais de água e do solo. Nosso estudo dá uma ideia geral de como e quando alcançar estes diferentes objetivos em função das características e do local das florestas”, diz o pesquisador.

Pastagem em regeneração próxima a floresta primária no estado de Oaxaca, no México. Foto: Jorge Meave.

Solo se regenerou em dez anos

A equipe da 2ndFOR analisou 12 atributos florestais relacionados a quatro grupos de características da floresta: solo (densidade aparente, carbono e nitrogênio); funcionamento do ecossistema (espécies de árvore fixadoras de nitrogênio, densidade da madeira e área foliar específica); estrutura da mata (biomassa acima do solo, diâmetro máximo das árvores e heterogeneidade estrutural) e biodiversidade (riqueza, diversidade e composição de espécies).

Em dez anos, a fertilidade do solo foi recuperada, seguida pelo restauro do funcionamento do ecossistema, atingido em menos de 25 anos. A regeneração da estrutura e da diversidade da floresta, segundo o estudo, acontece entre 25 e 60 anos. E em 120 anos ocorre a retomada da biomassa acima do solo e a composição de espécies, considerado o atributo mais sensível ao desmatamento.

“Na cronologia do tempo, vimos que as características do solo se recuperam em menos de 10 anos. Foi surpreendente”, conta Catarina Jakovac, Professora do Departamento de Fitotecnia do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).“O solo tem uma resistência maior ao distúrbio, a exemplo da transformação de uma floresta madura em lavoura, desde que não haja uma condição de extrema degradação, como mineração.”,

Por outro lado, segundo Jakovac, a equipe de cientistas se surpreendeu com a demora da recuperação da biomassa acima do solo – como caules, troncos e galhos -, que desempenha papel fundamental para o sequestro de carbono da atmosfera.

Já as tímidas taxas alcançadas pela composição de espécies, parâmetro usado para definir a biodiversidade do ambiente, era esperadas. Muitas plantas vulneráveis têm sementes grandes e encontram dificuldade à medida que seus dispersores são animais extintos em algumas regiões, como é o caso da anta.

“Talvez nunca tenha exatamente as mesmas espécies de antes do desmatamento porque muitas delas são raras e é difícil para estas plantas se estabelecer em uma floresta secundária”, explica Jakovac.

No gráfico acima, os resultados do estudo revelam a taxa de regeneração de quatro grupos de atributos da floresta tropical (solo, estrutura, funcionamento do ecossistema e biodiversidade) sobre áreas desmatadas ao longo de 20, 40, 80 e 120 anos.  Imagem: 2ndFOR/Pixels&Ink, CC BY-ND.

Na Década da Restauração dos Ecossistemas (2021-2030), proposta pela ONU, notícias como a divulgada pela 2ndFOR encontram desafios para não serem deturpadas em tempos de desinformação e negacionismo.

De acordo com Pedro Brancalion, que atualmente ocupa o cargo de vice-coordenador do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, há muitos interesses em jogo e pessoas estão interessadas em destruir matas conservadas para a produção agrícola intensiva dando a justificativa de que irão compensar em outro lugar.

“A mensagem traz responsabilidade porque pode dar a ilusão de que é possível destruir e depois recuperar”, diz Brancalion. “Uma analogia que faço é com o uso das máscaras de oxigênio num voo: o adulto põe primeiro para que tenha condição de ajudar as crianças depois. O mesmo ocorre com as florestas. É preciso proteger as maduras para permitir que as que vão se regenerar tenham boas condições ecológicas. Toda floresta secundária é filha de florestas do entorno. Protegendo o que sobrou eu tenho uma chance no futuro de promover uma regeneração. Mas se promover regeneração sem proteger o que sobrou não chegaremos a lugar nenhum”.


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