O plantio de árvores em larga escala é uma das alternativas para contrabalançar ao menos parcialmente os efeitos da mudança climática global. Muitas iniciativas nesse sentido estão em andamento, visando sequestrar enormes quantidades de carbono e, assim, compensar em parte as emissões antropogênicas de gases de efeito estufa, que constituem uma das principais causas do aumento da temperatura do planeta.
Porém, se alguns esforços de plantio ou replantio resultaram em formações florestais exuberantes e biodiversas, outros produziram resultados contrários, aumentando as emissões de dióxido de carbono (CO2) e produzindo impactos deletérios de longo prazo sobre as paisagens, a biodiversidade e os meios de subsistência. Pesquisadores com sólidas credenciais internacionais têm expressado em relação ao tema opiniões que podem ser sintetizadas na fórmula: “Reflorestar, sim. Mas é preciso saber onde e como” (leia mais em: agencia.fapesp.br/31709).
Uma contribuição nesse sentido foi publicada recentemente, em artigo de revisão, no periódico Global Change Biology: “Ten golden rules for reforestation to optimize carbon sequestration, biodiversity recovery and livelihood benefits” (Dez regras de ouro para o reflorestamento, para otimizar o sequestro de carbono, a recuperação da biodiversidade e os benefícios de subsistência).
Pedro Brancalion, professor do Departamento de Ciências Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), foi um dos autores do estudo, que recebeu apoio da FAPESP por meio do Projeto Temático “Compreendendo florestas restauradas para o benefício das pessoas e da natureza – NewFor”, coordenado pelo pesquisador no âmbito do Programa BIOTA-FAPESP.
“A Assembleia Geral da ONU [Organização das Nações Unidas] declarou que o período de 2021 a 2030 será a ‘Década da Restauração de Ecossistemas’. O objetivo principal é restaurar ecossistemas degradados, criando medidas eficientes para combater a crise climática, alimentar, hídrica e da perda de biodiversidade. A grande questão que se coloca não é saber se devemos ou não reflorestar. Mas, sim, como fazer isso”, diz Brancalion à Agência FAPESP.
“Reflorestar é uma estratégia para obter determinado objetivo e não um fim em si mesmo. Se encaramos o reflorestamento como um fim em si mesmo, o sucesso será medido pelo número de mudas plantadas. Mas esse número, que produz muito impacto na mídia porque é uma coisa bem simples de entender, está longe de ser o indicador adequado”, continua o pesquisador.
Brancalion apresenta três perguntas que deveriam ser respondidas antes de qualquer iniciativa séria de reflorestamento em larga escala: “Primeira: há outras estratégias que permitam atingir o mesmo objetivo com menores custos e impactos? Isso demanda, entre outras coisas, avaliar como os objetivos do reflorestamento poderiam ser atingidos de outras formas, ou mesmo como o aumento da cobertura florestal poderia ser promovido por outros métodos, como a regeneração natural. Segunda: onde plantar? Não é em regiões como as savanas, que se especializaram há milhões de anos como biomas com características próprias, muito diferentes das florestas. Mesmo em áreas degradadas é preciso saber como um possível reflorestamento afetaria as atividades produtivas locais, como a pecuária e a agricultura. Terceira: como plantar? Com relação a isso, há todo um manejo técnico a ser considerado, que vai da escolha das espécies de árvores até os cuidados com as mudas já plantadas”, diz.
Foi para oferecer subsídios a essa tomada de decisão que os autores do artigo em pauta apresentaram suas “dez regras de ouro para o reflorestamento”.
São elas: (1) proteger, em primeiro lugar, a floresta já existente; (2) trabalhar em conjunto, envolvendo todas as partes interessadas; (3) maximizar a recuperação da biodiversidade para atender a vários objetivos; (4) selecionar áreas apropriadas para restauração; (5) valer-se da regeneração natural sempre que possível; (6) selecionar espécies que favoreçam a biodiversidade; (7) empregar material vegetal resiliente, com variabilidade genética e proveniência apropriadas; (8) planejar com antecedência a infraestrutura, capacidade e fornecimento de sementes; (9) aprender fazendo, utilizando uma abordagem de gestão adaptativa; (10) garantir a sustentabilidade econômica do projeto.
“Uma observação importante em relação ao item 5 é que, muitas vezes, se associam grandes aumentos de cobertura vegetal com plantio. Mas, na maioria dos casos, isso se deve à regeneração espontânea de áreas que haviam sido utilizadas para a agricultura ou a pecuária e foram depois abandonadas. Passarinhos plantam árvores todos os dias”, comenta Brancalion.
“Em resumo: o reflorestamento é uma necessidade, porém, deve ser planejado e conduzido com critério. O jornalista Henry Louis Mencken já dizia: ‘Para todo problema complexo, existe sempre uma solução simples, elegante, e completamente errada’. É isso que precisamos evitar. Estamos diante de um problema complexo em escala planetária – talvez o maior desafio que nossa espécie já tenha enfrentado. É urgente responder a ele, mas isso não poderá ser feito de maneira simplista”, conclui o pesquisador.
O artigo Ten golden rules for reforestation to optimize carbon sequestration, biodiversity recovery and livelihood benefits pode ser acessado em onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/gcb.15498.
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