Desbaste de guanandi, espécie nativa do Brasil, em fazenda localizada no interior de São Paulo
Por Alan Batista, Miguel Calmon, Suzanna Lund, Leonor Assad, Claudio Pontes e Rachel Biderman em WRI Brasil – O Brasil assumiu compromissos nacionais e internacionais que demandam a recuperação de milhões de hectares de áreas e florestas degradadas e a implantação de sistemas agrícolas sustentáveis. Esses compromissos e demandas são cruciais para reduzir a degradação dos nossos ecossistemas, gerar serviços ecossistêmicos para o bem-estar da sociedade e mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
Porém, a recuperação em larga escala de áreas e de florestas degradadas enfrenta vários gargalos. O baixo conhecimento técnico e o entendimento dos custos e dos modelos de negócios florestais com espécies nativas e sistemas agroflorestais estão entre eles. O Projeto Verena, liderado pelo WRI Brasil e com a participação de diversos parceiros, trabalhou nos últimos cinco anos para demonstrar a viabilidade econômica de modelos de silvicultura com espécies nativas e sistemas agroflorestais.
O conhecimento acumulado pelo Projeto Verena de 2016 a 2019 está apresentado em uma publicação. O relatório “Investimento em silvicultura de espécies nativas e sistemas agroflorestais no Brasil: uma avaliação econômica“, publicado pelo WRI Brasil, sintetizou esse conhecimento. A publicação mostra a viabilidade econômica dos modelos estudados, tendo em conta análises dos riscos de mercado dos ativos florestais, taxas de câmbio, inflação, volumes de produção e volatilidade de preços.
Resultado maior, risco menor
O relatório apresenta os resultados da modelagem econômica e financeira de 12 estudos de caso de silvicultura de espécies nativas e SAFs no Brasil. São resultados muito promissores. A silvicultura de espécies nativas e os sistemas agroflorestais proporcionam uma taxa interna de retorno média de 12%. Praticamente não há diferença de retorno econômico quando comparado ao reflorestamento com espécies exóticas, como eucalipto. Além disso, as nativas têm uma vantagem: a análise mostra um risco de mercado menor. Por outro lado, as espécies nativas ainda precisam de um capital inicial maior e têm um período de retorno do investimento mais longo.
Além dos resultados econômicos positivos, o relatório mostra que há um enorme potencial de demanda para a silvicultura de espécies nativas brasileiras no mercado nacional e internacional. O estudo parte de estimativas da demanda nacional e global por madeira, que mostram uma grande oportunidade para negócios madeireiros sustentáveis. A silvicultura de espécies nativas brasileiras tem um grande potencial para atender esse mercado, ao mesmo tempo em que desestimula o desmatamento de florestas naturais oferecendo ao mercado consumidor um produto que respeita as regras ambientais, retira carbono da atmosfera e evita a degradação.
Segundo o levantamento do Verena, as projeções sugerem que, se seguirmos em um cenário de business-as-usual, em 2050 o Brasil produzirá cerca de 500 milhões de m³ de madeira, tendo um papel secundário na produção madeireira. Se apostar em uma economia de baixo carbono que incentive a silvicultura para a recuperação de terras e produção de madeira, o Brasil poderá se tornar um dos principais produtores do mundo e produzir 1 bilhão de m3 de madeira.
A importância de modelos como exemplo
Além de demonstrar a viabilidade econômica da silvicultura de espécies nativas e de sistemas agroflorestais, o Verena buscou preencher uma lacuna importante para atrair investimentos para a recuperação de áreas degradadas: disseminar exemplos já existentes e bem-sucedidos.
No mercado de capital global, já existe conhecimento e um histórico de investimentos, riscos e retornos para diversos setores da economia. Em alguns segmentos de empresas de capital aberto, esse histórico tem mais de 100 anos. Ou seja, há informação suficiente para que investidores avaliem os riscos antes de tomar uma decisão.
Para as espécies de árvores nativas brasileiras, há registros científicos que também datam de centenas de anos, mas não existe um histórico desse tipo relacionado a investimentos, com dados econômicos, de inflação, de risco e de retorno.
A identificação e modelagem de casos de negócios com silvicultura de nativas e SAFs que estão em atividade é essencial para trazer segurança e conhecimento aos investidores. Por isso, o relatório apresenta 12 estudos de caso de empresas que operam com espécies nativas brasileiras. Entre os casos, há silvicultura na Amazônia, como a Amata, e na Mata Atlântica, como a Symbiosis, além de casos de sistemas agroflorestais com uma grande diversidade de espécies, incluindo cacau, café, citrus, açaí, mogno, banana, entre outros.
Os ganhos com pesquisa e desenvolvimento
Para aumentar a competitividade da silvicultura de espécies nativas e realmente dar escala ainda precisamos enfrentar alguns gargalos.
Um deles é o da Pesquisa & Desenvolvimento. Um programa de P&D para a silvicultura de espécies nativas pode garantir um melhor ambiente de negócios e aumentar a produtividade, assim como aconteceu com as principais culturas agrícolas e florestais do Brasil. Além disso, pode reduzir os custos das operações florestais, como manejo, colheita e processamento, resultando em grandes ganhos de eficiência em longo prazo.
A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, em colaboração com o WRI Brasil e vários parceiros, lançou recentemente o Programa de Pesquisa & Desenvolvimento em Silvicultura de Espécies Nativas (PP&D-SEN). A ideia é conectar instituições de pesquisa, universidades, empresas, governos, sociedade civil e financiadores, e formar uma rede inicial de 20 sítios de pesquisa para o desenvolvimento de pesquisas de espécies da Amazônia e da Mata Atlântica.
A expectativa é melhorar a eficiência, diminuir os custos e aumentar os ganhos de produtividade dessas espécies no curto e médio prazo. Segundo um estudo de 2019 do WRI Brasil, o working paper “Prioridades e Lacunas de Pesquisa & Desenvolvimento em Silvicultura de Espécies Nativas no Brasil”, P&D pode aumentar entre 35% e 56% o rendimento da maioria das espécies nativas. Um dos cenários de investimento do estudo estimou um retorno de US$ 2,39 para cada US$ 1 investido.
Como impulsionar a silvicultura de nativas
Apesar dos benefícios mostrados pelo relatório e pela experiência do projeto Verena nos últimos anos, a velocidade e a escala da recuperação de áreas degradadas ainda estão aquém do desafio climático que estamos enfrentando.
Por isso, este ano o projeto Verena atualizou sua Teoria de Mudança (TdM) para impulsionar a silvicultura de nativas no Brasil. A nova TdM busca trabalhar com inteligência de dados, apresentar soluções para grandes cadeias do agronegócio e construir um hub de articulações como forma de desenvolver e incentivar uma economia florestal a partir da silvicultura de nativas, da restauração de florestas e paisagens e de sistemas produtivos agropecuários mais resilientes para gerar grandes benefícios sociais, ambientais e econômicos para o país e o planeta.
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