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Pesquisadores da Unesp de Bauru desenvolvem nova rota para sintetizar e facilitar a utilização em sensores e outras aplicações do composto que confere pigmentação aos mamíferos

Imagem: Wikimedia Commons

Uma nova fronteira da eletrônica, a bioletrônica – como é denominado o campo de pesquisa que visa combinar componentes eletrônicos e biológicos, de modo a desenvolver dispositivos implantáveis miniaturizados, capazes de alterar e controlar sinais elétricos no corpo humano –, tem atraído o interesse de empresas como o Google e a farmacêutica GlaxoSmithKline (GSK). As duas multinacionais anunciaram recentemente uma joint venture para explorar essa área.

Um dos desafios para viabilizar o desenvolvimento desses dispositivos bioeletrônicos é identificar e possibilitar o uso de materiais que, além de apresentar condutividade eletrônica (à base de elétrons), também possuam condutividade iônica (à base de íons), em que está fundamentada a comunicação e o processo de condução de neurotransmissores, por exemplo. E que, além disso, sejam biocompatíveis com o corpo humano.

O mesmo desafio mobiliza também pesquisadores da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Bauru. Eles conseguiram desenvolver uma nova rota para sintetizar mais rapidamente e viabilizar o uso da melanina – composto polimérico que confere pigmentação à pele, aos olhos e ao cabelo dos mamíferos, apontado como um dos materiais mais promissores para utilização em dispositivos miniaturizáveis e implantáveis, como biossensores.

Alguns dos resultados de pesquisas do grupo foram apresentados durante palestra na Fapesp Week Montevideo em uma mesa sobre Ciência e Engenharia de Materiais.

Organizado pela Asociación de Universidades Grupo Montevideo (AUGM), a Universidad de la República (Udelar) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o simpósio, que ocorreu entre os dias 17 e 18 de novembro no campus da Udelar, em Montevidéu, teve como objetivo fortalecer as colaborações atuais e estabelecer novas parcerias entre pesquisadores da América do Sul nas diversas áreas do conhecimento. Participaram do encontro pesquisadores e dirigentes de instituições do Uruguai, Brasil, Argentina, Chile e Paraguai.

“Todos os materiais que têm sido testados atualmente para aplicações em bioeletrônica são completamente sintéticos”, disse Carlos Frederico de Oliveira Graeff, professor da Unesp de Bauru e coordenador do projeto, à Agência Fapesp.

“Uma das grandes vantagens da melanina é que, sendo um composto totalmente natural e biocompatível com o corpo humano, tem potencial para ser usado em dispositivos para fazer a interface entre neurônios cerebrais e a eletrônica, por exemplo”, afirmou.

Desafios de aplicação

De acordo com o pesquisador, um dos desafios para utilizar a melanina como material para o desenvolvimento de dispositivos bioeletrônicos é que o composto – assim como outros materiais à base de carbono, como o grafeno – tem baixa dispersão em meio aquoso, o que dificultava sua utilização na produção de filmes finos.

Além disso, o processo convencional de síntese da melanina é complexo. Envolve etapas difíceis de serem controladas, pode durar até 56 dias e resultar em estruturas desordenadas.

Por meio de uma série de estudos realizados nos últimos anos no âmbito do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) – um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) apoiados pela Fapesp, e do qual Graeff é um dos pesquisadores principais –, ele e seus colaboradores conseguiram obter melanina biossintética com boa dispersão em água e muito semelhante à natural por meio de uma nova rota de síntese.

O processo desenvolvido pelos pesquisadores leva apenas algumas horas e é baseado em mudanças de parâmetros, como a temperatura, e na aplicação de pressão de oxigênio para promover a oxidação do material.

Ao aplicar pressão de oxigênio, os pesquisadores conseguiram aumentar a densidade no material do grupo carboxílico – composto por dois átomos de oxigênio ligados a um carbono, sendo um através de uma ligação dupla e outro através de uma ligação simples -, que, entre outras funções, aumenta a solubilidade e a facilidade de se obter suspensões de melanina biossintética na água.

“Isso facilita bastante a obtenção de filmes finos de melanina com alta homogeneidade e qualidade”, explicou Graeff.

Por meio do aumento da densidade do grupo carboxílico, os pesquisadores também conseguiram tornar a melanina biossintética mais semelhante à biológica.

No processo de síntese natural da melanina, que ocorre nos organismos vivos, há uma enzima que facilita a produção de ácidos carboxílicos.

Na nova rota de síntese da melanina que desenvolveram, os pesquisadores conseguiram mimetizar quimicamente o papel dessa enzima e aumentar a densidade de grupos carboxílicos, explicou Graeff.

“Temos conseguido obter por síntese química um material mais próximo do biológico e fazer filmes de qualidade muito boa para utilizá-los em dispositivos bioeletrônicos”, afirmou.

Por meio de colaborações com colegas de instituições de pesquisa do Canadá, os pesquisadores brasileiros começaram a usar o material em uma série de aplicações, como contatos elétricos, sensores de pH e em células fotovoltaicas.

Mais recentemente, começaram a tentar desenvolver transistores – o componente eletrônico usado como amplificador ou interruptor de sinais elétricos, além de diversas outras funções.

“Nosso objetivo maior é obter transistores justamente para promover a junção da eletrônica com sistemas biológicos”, disse Graeff.



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