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Embriões de crustáceo conhecido como chama-maré sobreviveram menos em ambiente mais quente e ácido, que mimetiza condições climáticas previstas para o fim do século

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André Julião | Agência FAPESP – Embora tenham apenas três centímetros de carapaça, os caranguejos chama-marés podem ser grandes aliados para entender os efeitos das mudanças climáticas globais. Em estudo publicado na revista Estuarine, Coastal and Shelf Science, pesquisadores brasileiros apoiados pela FAPESP mostraram como o aumento da temperatura e a acidificação dos oceanos previstos para ocorrer até o fim do século podem afetar o ciclo de vida desses crustáceos.

Expostos a uma elevação de temperatura de 4 oC e a uma redução de pH de 0,7 em relação à média do ambiente em que vivem, os embriões da espécie Leptuca thayeri sofreram uma aceleração no crescimento. No entanto, um número maior de indivíduos morreu antes de atingir o último estágio embrionário, em comparação aos que permaneceram nas condições regulares do hábitat.

“Esse caranguejo tem uma grande importância ecológica: faz tocas que ajudam no ciclo de matéria orgânica e suas larvas servem de alimento para muitas outras espécies. Portanto, podemos considerar que as alterações causadas aos embriões dessa espécie pelas mudanças climáticas terão um efeito cascata. Animais que apresentam um desenvolvimento embrionário mais longo, como esses, estão sob maior ameaça”, explica Tânia Márcia Costa, professora do Instituto de Biociências do Campus do Litoral Paulista (IB-CLP) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em São Vicente, que coordenou o estudo.

O trabalho foi apoiado pela Fundação no âmbito do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).

A elevação de temperatura foi simulada nos experimentos com base na previsão feita pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), para o fim do século. Já a alteração de pH teve como parâmetro um estudo publicado na Nature, em 2003, por pesquisadores dos Estados Unidos.

Apesar do tamanho diminuto, os chama-marés impressionam pela densidade com que são encontrados nos manguezais: cerca de cem animais por metro quadrado. Considerados “engenheiros de ecossistemas”, ao cavar tocas com frequência para se abrigar, se reproduzir e cuidar dos ovos, eles retiram matéria orgânica do fundo e a levam para a superfície, onde serve de alimento para outros organismos menores, como o grupo de São Vicente mostrou em artigo publicado em 2017.

“Faltam estudos sobre os efeitos combinados de estressores climáticos nos organismos, principalmente nas fases iniciais da vida. Esses geralmente são os estágios mais sensíveis ao aumento de temperatura, diminuição do pH e outros estresses associados às mudanças climáticas. Fora isso, os poucos trabalhos existentes utilizam valores muito genéricos de temperatura e acidez, quando os manguezais são muito dinâmicos e têm seus próprios microclimas”, diz Juan Carlos Farias Pardo, doutorando na Universidade de Agder (UiA) e no Norwegian Institute for Water Research (NIVA), ambos na Noruega.

O estudo foi realizado durante seu mestrado no IB-CLP da Unesp, com bolsa da FAPESP.

No laboratório

Para reproduzir com mais fidelidade o hábitat dos chama-marés – conhecidos também como caranguejos-violinistas – os pesquisadores passaram meses indo a campo para medir temperatura, salinidade e acidez da água das tocas em que as fêmeas com ovos vivem. Esses valores foram usados posteriormente em laboratório como controle para os experimentos.

Os ovos foram retirados do abdômen das fêmeas e dispostos em diferentes tratamentos. Em tanques com água de salinidade igual à do hábitat, os embriões foram expostos a diversas combinações de temperatura (26 oC ou 30 oC) e pH (6,9 e 6,2 unidades). As observações foram realizadas por dez dias, ao final dos quais os embriões são considerados totalmente desenvolvidos, com olhos formados e fortes batimentos cardíacos.

Nos experimentos, os embriões da água mais quente e ácida se desenvolveram mais rápido que os do grupo controle. Porém, ao longo dos dez dias, os que cresceram sob temperatura e acidez maiores apresentaram maior mortalidade do que aqueles que se desenvolveram em condições iguais às do hábitat. O volume dos ovos foi menor na água mais quente e com acidez normal, e maior nos mesmos 30 oC com mais acidez.

“Vimos que o desenvolvimento mais rápido não é necessariamente melhor. Ao mesmo tempo que cresceram em maior velocidade sob o efeito dos estressores, eles morreram mais. Por sua vez, o volume maior dos ovos na água mais ácida pode ser uma consequência de uma troca gasosa menos eficiente, que faz com que fiquem inchados”, afirma Pardo, acrescentando que o grupo agora prepara novos trabalhos voltados a avaliar as fases posteriores do desenvolvimento dos caranguejos.

“Mesmo que 100% dos embriões sobrevivessem a essas alterações climáticas, essa é só a primeira fase do desenvolvimento. Até se tornarem adultos, eles têm naturalmente uma mortalidade muito grande, uma vez que são alimento para muitas espécies. Fora isso, não sabemos o que esse nível de estresse, ainda no embrião, vai ocasionar nas outras fases”, explica Costa.

Em outros trabalhos, o grupo já havia mostrado como o aumento de temperatura força adaptações fisiológicas de duas outras espécies de chama-maré e influencia, em uma terceira, até mesmo a ampliação do território.

Em um novo projeto apoiado pela FAPESP, Costa vai avaliar como o estresse das mudanças climáticas afeta as interações entre herbívoros e plantas, predadores e presas.

O artigo Multiple-stressor effects of warming and acidification on the embryonic development of an estuarine fiddler crab pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0272771421001499.
 


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