Feijão guandu consorciado em pastagem reduz emissão de metano em até 70%

Compartilhar

Por Gisele Rosso, da Embrapa | O uso da variedade de feijão guandu BRS Mandarim, em consórcio com os capins Marandu e Basilisk, aumentou o ganho de peso dos bovinos e emitiu menos metano por quilo obtido.

A emissão diária do gás por quilo de ganho de peso foi de 614,05 gramas no pasto consorciado, cerca de 70% a menos do que no degradado, com 2.022,67 gramas.

O uso da leguminosa no consórcio impactou também a produtividade. Os animais ganharam 58% a mais de peso em comparação ao pasto degradado, em um ano.

Tecnologias para mitigar metano já estão à disposição de pecuaristas no Brasil.

O uso eficiente da leguminosa guandu BRS Mandarim consorciada com os capins Marandu e Basilisk aumentou o ganho de peso dos bovinos e emitiu menos metano por quilo obtido. A emissão diária do gás por quilo de ganho de peso foi de 614,05 gramas no pasto consorciado, cerca de 70% a menos do que no degradado, com 2.022,67 gramas.

A produtividade também foi melhor no tratamento consorciado com guandu – os animais ganharam 478 gramas por dia, enquanto no degradado, 302 gramas por dia de média de ganho de peso anual. Um aumento de 58% em relação ao pasto degradado. 

A tecnologia pode ser vantajosa não só para os pecuaristas, mas também para o País, que, em 2021, durante a 26ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP26), na Escócia, assumiu o compromisso de reduzir 30% das emissões de metano até 2030.

De acordo com Alexandre Berndt, chefe-geral da Embrapa Pecuária Sudeste (SP), qualquer tecnologia que reduza metano, com baixo custo, e que contribua para a eficiência do sistema de produção e para a sustentabilidade é desejável e deveria ser adotada.

A pesquisa, desenvolvida em parceria entre a Embrapa Pecuária Sudeste, a Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP) e o Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo (Cena/USP), de Piracicaba (SP), avaliou o desempenho e a emissão de metano entérico (resultante do processo digestivo) de novilhos Nelore em três diferentes sistemas de produção, incluindo o consórcio com guandu BRS Mandarim. 

Os pesquisadores apresentaram o resumo do trabalho durante o VIII Congresso Internacional de Gases de Efeito Estufa em Sistemas de Produção Animal (GGAA 2022), realizado de 5 a 7 de junho, em Orlando, Flórida, EUA.

Experimento aliou consórcio forrageiro e recuperação de pastagens

O experimento ocorreu de julho de 2020 a julho de 2021, na Fazenda Canchim, sede do centro de pesquisa da Embrapa Pecuária Sudeste. Os 27 animais utilizados, entre 15 e 16 meses, foram pesados mensalmente e o metano medido pela técnica do gás traçador de hexafluoreto de enxofre (SF6) por cinco dias consecutivos na estação das águas e na seca. 

Os tratamentos foram: 

1) pastagem recuperada das gramíneas Urochloa decumbens cultivar Basilisk e Urochloa brizantha cultivar Marandu com calagem e adubação de correção com fósforo (P), potássio (K), enxofre (S) e micronutrientes e fertilização nitrogenada com 200 kg de nitrogênio (N) por hectare ao ano na estação chuvosa divididos em três aplicações, com taxa moderada de lotação animal; 

2) pastagem degradada com baixa taxa de lotação animal; 

3) pastagem recuperada com calagem e fertilização corretiva com P, K, S e micronutrientes e consorciada das gramíneas Urochloa decumbens cultivar Basilisk e Urochloa brizantha cultivar Marandu com guandu BRS Mandarim, com taxa de lotação animal moderada. 

O médico veterinário Althieres Furtado, mestrando na área de Nutrição e Produção Animal da FMVZ/USP, sob orientação do professor Paulo Henrique Mazza Rodrigues, conta que foram realizadas três repetições de cada tratamento, com ajuste da taxa de lotação pela técnica put and take. O método coloca e retira animais da pastagem, de acordo com a oferta da forragem em cada época do ano. 

Os bovinos no tratamento consorciado com guandu ganharam 478 gramas por dia, seguido do recuperado, com 387 gramas por dia e, por último, no degradado, com 302 gramas por dia de média de ganho de peso anual. 

A emissão diária de metano por quilo de ganho de peso foi de 2.022,67 no pasto degradado; 1.053,55 no recuperado; e 614,05 gramas de metano por quilo de ganho de peso no consorciado. A recuperação com o consórcio de guandu emitiu 70% a menos e a recuperação com uso do fertilizante nitrogenado emitiu 48% a menos que o pasto degradado.

Segundo o pesquisador André Pedroso, da Embrapa, esse resultado foi possível porque além de diminuir a emissão de metano entérico, o consórcio com feijão guandu e a recuperação de pastagens melhoraram o desempenho dos animais, com aumento no ganho de peso médio diário.

Furtado diz que os pesquisadores esperavam esse efeito. “Várias são as formas de reduzir a produção de metano pelo animal. Além de melhorar o aporte nutricional disponível aos bovinos, os taninos presentes nas estruturas da planta do guandu BRS Mandarim agem no rúmen e, consequentemente, diminuem a emissão”, explica. 

Inserção de leguminosa em plantio consorciado é viável para a pecuária sustentável

Para a pesquisadora Patrícia Perondi Anchão Oliveira, da Embrapa, a pastagem degradada é sempre o pior de todos os cenários. De forma geral, o processo de degradação é caracterizado por perda de produtividade acentuada da pastagem (baixa produtividade), grandes áreas de solos expostos, plantas daninhas, erosões, sintomas evidentes de deficiência nutricional nas plantas e nos animais, e menor ritmo de crescimento das plantas, que se refletem nas questões ambientais.

“Nessas condições o solo encontra-se exaurido, comprometendo a produção e qualidade da forragem e o desempenho dos animais, fatos que aumentam a emissão de metano entérico, além de ocorrer o processo de perda de matéria orgânica do solo, que prejudica o sequestro de carbono”, ressalta.

Oliveira lembra que a recuperação de pastagens a partir da inserção de leguminosas é uma solução muito procurada no meio técnico-científico, um desafio de várias décadas, pois por meio da fixação biológica de nitrogênio, a leguminosa fornece esse nutriente tanto para alimentação dos animais quanto para melhoria do solo. “Em tempos de escassez e preços elevados dos fertilizantes nitrogenados e dos suplementos minerais proteicos, além de preocupações com as emissões de metano entérico, esse tipo de tecnologia se reveste de mais relevância ainda”, completa.

Estudos com consórcio de gramíneas e leguminosas podem melhorar o desempenho animal com sustentabilidade, acredita Furtado. “Ainda são necessárias pesquisas mais aprofundadas. No entanto, ao se pensar em uma produção de carne a pasto, com baixa emissão, essa seria uma alternativa viável”, destaca.

Tecnologias para redução de metano estão à disposição de pecuaristas

Segundo Berndt, o metano é um gás de vida curta. “Se conseguirmos reduzir a emissão do metano, o impacto sobre o aquecimento global será mais rápido. Ele tem uma vida de 10 a 20 anos, enquanto o dióxido de carbono – CO2, 100 anos”, explica.

Outras pesquisas da Embrapa Pecuária Sudeste avaliam tecnologias para atender a esse desafio. O centro de pesquisas investe em estudos sobre emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) há mais de 20 anos, tanto em sistemas de produção de bovinos de corte, quanto de leite, buscando a baixa emissão de gases como o metano entérico, a fim de diminuir o impacto da atividade no planeta.

Muitos deles já estão disponíveis para o pecuarista, como recuperação de pastagens degradadas, boas práticas de manejo animal e vegetal, uso adequado de insumos, bem-estar animal, redução do ciclo de vida e manejo nutricional. Para Berndt, a adoção dessas soluções tecnológicas e boas práticas, como sistemas integrados, manejo intensivo das pastagens e uso de aditivos na nutrição animal, é capaz de compensar as emissões geradas pela pecuária e tornar o sistema de produção mais sustentável.

O próprio consórcio com leguminosas é um bom exemplo de tecnologia que pode contribuir para a redução de metano dentro do manejo de pastagem. Algumas, como o guandu BRS Mandarim, têm compostos em suas estruturas, como taninos e saponinas, que podem ter ação sobre os microrganismos do rúmen e, por isso, interferem na fermentação, reduzindo as populações de organismos que produzem metano.

O principal desafio nacional, do ponto de vista do pesquisador, é a adoção em escala dessas soluções e práticas tecnológicas para reduzir significativamente a emissão de metano entérico. 

Como mensurar o metano?

As coletas de metano dos animais são feitas por meio automatizado ou manual. Na Embrapa Pecuária Sudeste são utilizadas as duas formas. No experimento, a mensuração utilizada foi a manual. Uma canga tubular é acoplada a um cabresto, colocado logo atrás da cabeça do bovino (assista ao vídeo abaixo), armazenando por 24 horas os gases emitidos pelo gado, sendo um deles um gás traçador fornecido ao animal com taxa de emissão conhecida, o que permite mensurar a emissão dos outros gases. Após o período, o tubo é retirado e vai para análises no laboratório. As coletas são feitas a partir de uma amostra de animais por um determinado tempo em diferentes períodos do ano.

Já o GreenFeed é uma tecnologia automatizada usada para medir, com maior rapidez e precisão, a emissão de metano (CH4) e gás carbônico (CO2) dos animais. O equipamento reconhece o bovino pelo brinco eletrônico e fornece uma quantidade de alimento ao animal assim que um sensor detecta sua presença no cocho; no mesmo momento, ele aspira e mede os gases emitidos durante a alimentação. Assim, a emissão é monitorada continuamente.

Contribuição para ODS

Os resultados dessa pesquisa contribuem com as alternativas para adaptação e mitigação frente aos efeitos das mudanças do clima, para o desenvolvimento mais sustentável da pecuária brasileira e diretamente para o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) número 13 da Organização das Nações Unidas (ONU), que é “Adotar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos”.


Este texto foi originalmente publicado pela Embrapa de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.

Carolina Hisatomi

Graduanda em Gestão Ambiental pela Universidade de São Paulo e protetora de abelhas nas horas vagas.

Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos.

Saiba mais