A fermentação entérica é uma parte natural do processo de digestão de animais ruminantes, em que os açúcares são quebrados em moléculas mais simples para absorção na corrente sanguínea. Esse processo ocorre no rúmen — uma parte do estômago dos ruminantes, que possui quatro compartimentos distintos.
Como os ruminantes não conseguem naturalmente digerir a celulose, ela é feita através de uma relação simbiótica entre os animais e espécies e cepas de microrganismos presentes no ambiente ruminal anaeróbico. Entre as centenas de espécies de microrganismos do rúmen, acredita-se que apenas de 10 a 20 façam parte da digestão.
Os micróbios decompõem e fermentam os alimentos, produzindo metano (CH4) como subproduto — conhecido como metano entérico — que é expelido pelo animal através de arrotos.
Embora seja um processo natural do organismo desses animais, a fermentação entérica possui diversos impactos no meio ambiente devido à extensa ocupação da pecuária no planeta. De fato, acredita-se que ela seja responsável por até 30% das emissões antropogênicas globais de metano, ou até 40% do total de emissões globais do setor agrícola.
A fermentação entérica ocorre quando micróbios anaeróbicos, chamados metanógenos, decompõem e fermentam os alimentos presentes no trato digestivo de ruminantes, produzindo compostos que o hospedeiro animal absorve. Esse processo possibilita a digestão de materiais vegetais que de outra forma não seriam digeríveis.
Os principais fatores que afetam a fermentação entérica são população microbiana e nível de atividade no rúmen, que são afetados por:
A produção de metano consequente da pecuária é calculada através do valor calórico alimentar dos animais, que é convertido em CH4. Segundo a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), “níveis mais altos de conversão se traduzem em emissões mais elevadas, dado o consumo constante de energia alimentar. Da mesma forma, níveis mais elevados de ingestão se traduzem em emissões mais elevadas.”
No entanto, devido à relação entre a quantidade de alimentação e a porcentagem de rendimento de CH4, fatores de emissão e equações de emissão diretas podem ser usados apenas para aproximações gerais.
Entretanto, em casos em que o tipo de animal, a qualidade da alimentação e a quantidade de alimentação são estreitamente caracterizados e combinados com valores percentuais confiáveis de rendimento de CH4, os fatores de emissão de CH4 são mais precisos.
O metano entérico é considerado um poluente climático de vida curta (PCVC), ou seja, demora dias ou décadas para se dissipar no ar. E, embora ele e outros PCVCs se dissipem relativamente rápido, ainda possuem um grande impacto na atmosfera.
O CH4, por exemplo, retém 84 vezes mais calor do que dióxido de carbono nas duas primeiras décadas depois de ser lançado no ar e é considerado um gás do efeito estufa 20 vezes mais potente que o CO2.
As emissões desse gás pelas atividades humanas, como a pecuária, são um dos mais expressivos condutores das mudanças climáticas, impactando indiretamente os ecossistemas e a saúde humana, além de possuir um papel de precursor do ozônio.
Devido ao grande impacto da fermentação entérica dentro das mudanças climáticas, especialistas buscam inúmeras alternativas para a mitigação de suas emissões. Entre as intervenções mais comuns estão:
A diminuição da fermentação de compostos orgânicos no rúmen permite que ocorra mais digestão nos intestinos, onde ocorre menos fermentação entérica. Similarmente, a mudança da dieta dos animais também inibe a ação de metanógenos e limita a produção de hidrogênio necessária para a formação de CH4.
Além disso, acredita-se que o uso de aditivos em rações de gado, como a tanina e as algas marinhas, também pode reduzir as emissões de metano da pecuária. De acordo com uma pesquisa realizada pela Universidade de New Hampshire, as algas vermelhas da espécie Chondrus crispus introduzidas na dieta de vacas leiteiras em pequenas quantidades (0,5% da sua dieta de ração seca) podem reduzir as emissões de metano em 12%.
A metil-coenzima M redutase (McR) desempenha um papel crucial na metanogênese anaeróbica. Ela é responsável por catalisar a etapa final do metabolismo do metano. Diante disso, muitos especialistas investiram em inibidores de metanogênese, como derivados halogenados e nitro de hidrocarbonetos, ácidos graxos e álcoois.
Por exemplo, compostos sulfonados halogenados podem reduzir as emissões de metano in vitro de 70% até 80%. (1)
Os óleos essenciais são líquidos oleosos voláteis e aromáticos extraídos de materiais vegetais, como flores, sementes, botões, folhas, ervas, madeira, frutas, galhos e raízes. Muitos desses produtos possuem ação antimicrobiana, capaz de inibir a ação de metanógenos.
O óleo de alho, por exemplo, já demonstrou contribuir para a melhor digestibilidade da ração em vacas leiteiras, além de reduzir as emissões de metano in vitro. (2, 3, 4)
Algumas empresas, como a startup americana ArkeaBio, trabalham na confecção de vacinas para vacas capazes de suprimir a atividade dos micróbios responsáveis pela produção de metano na fermentação entérica.
“Uma vacina seria realmente o Santo Graal da redução do metano na pecuária, dado o seu potencial para ser usada em muitos tipos diferentes de pecuária e sistemas agrícolas. No entanto, o desenvolvimento de uma vacina para inibir os micróbios produtores de metano no sistema digestivo de uma vaca é extremamente desafiador do ponto de vista técnico, pois precisará funcionar de uma maneira muito diferente de outros tipos de vacinação”, afirma Jeremy Hill, presidente do Consórcio Pastoral de Pesquisa de Gases de Efeito Estufa, ao Fast Company.
Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos.
Saiba mais