Estudos revelam que etanol causa menor dano ao ambiente do que gasolina, ainda que considerados os efeitos de seu processo produtivo.
Foto: Site InteRural
Apesar de parecer lógica a escolha do álcool (etanol) combustível comparativamente à gasolina em relação ao maior impacto desta sobre a poluição e desequilíbrio do efeito estufa em relação ao primeiro, a realidade na escolha por parte do consumidor e dos próprios veículos de informação de massa indicam como opção de consumo a relação entre preços em vigor no mercado: a velha regra de que se o preço do álcool for igual ou superior a 70% do valor da gasolina, opte pelo combustível não renovável. Essa escolha, a princípio racional, não parece razoável. Por isso o eCycle foi pesquisar mais a fundo a relação entre os dois combustíveis – sob o ponto de vista ambiental – em busca de melhores possibilidades para compreensão do tema por parte do consumidor.
Muito tem se falado sobre a produção de Etanol no Brasil, seja de primeira ou mais recentemente, segunda geração. O chamado de primeira geração é obtido através da extração da sacarose pela moagem da cana-de-açúcar. O chamado de segunda geração, também chamado de etanol celulósico, por sua vez se dá pela quebra de fibras ainda presentes no bagaço – desperdiçadas no processo de primeira geração – e o aproveitamento da palha. O etanol celulósico ainda encontra-se em processo de pesquisa e desenvolvimento por parte indústria, com previsão para disponibilidade em escala comercial nos próximos anos.
Por ter sua origem em uma fonte renovável, o etanol é considerado, comparativamente à gasolina, como uma opção mais sustentável, sobretudo ao verificar-se que a taxa de consumo de CO2 (dióxido de carbono) pela cana-de-açúcar durante seu crescimento, através da realização da fotossíntese, praticamente equivale àquela emitida durante o uso do combustível.
Para melhor avaliação do impacto ambiental do etanol, no entanto, seria preciso observar e calcular toda a emissão de gases que afetam o efeito estufa durante o processo de produção do etanol, o que se denomina cálculo do balanço das emissões de carbono deste combustível. Neste sentido, a Embrapa demonstrou, através de estudo, que um carro utilizando o etanol libera aproximadamente 5 vezes menos CO2 do que um que usa a gasolina, a considerar todo o processo de produção dos dois tipos de combustíveis. Do ponto de vista do balanço de emissões de carbono associado ao etanol, outras etapas que interferem no cálculo, além de sua simples combustão, seriam: o tipo de colheita feita e o uso de fertilizantes nitrogenados.
Com relação ao tipo de colheita, quando as folhas são deixadas no campo ao invés de queimadas, parte desse material orgânico atua como adubo devido a sua decomposição, provendo carbono ao solo a lhe conferir maior fertilidade. Vale observar que esta prática, apesar de evitar a emissão de CO2 pelo fato da não queima desta biomassa, no processo de decomposição da palha da cana o impacto se dará via liberação de metano (CH4) na atmosfera, gás cujo efeito sobre o efeito estufa é da ordem de 20 vezes superior àquele promovido pelo CO2 , o que faz com que a quantidade de palha deixada no campo mereça atenção no balanço. No caso dos fertilizantes intensivos em nitrogênio, o grande problema se relaciona às emissões de N2O (óxido nitroso) decorrentes, produzidas quando o fertilizante entra em contato com as bactérias presentes no solo. Esse gás possui potencial de desequilíbrio sobre o efeito estufa cerca de 300 vezes superior ao CO2, ou seja, o impacto é bastante relevante.
E a má notícia é que a concentração deste gás na atmosfera não tem parado de subir, sobretudo em razão das pressões por produtividade agrícola justificadas pela forte demanda por alimentos a abastecer um mundo cujo aumento da população e a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes tendem a progredir até o ano de 2050. O consumo de fertilizantes na produção de cana-de-açúcar no Brasil pode ser considerado relativamente baixo, pois as variedades aqui presentes conseguem se aproveitar bem da fixação de N (nitrogênio) feita pelas bactérias. Registra-se então uso de 0,425 toneladas/hectare e, segundo a Universidade Federal de Goiás (UFG), o fertilizante usado libera de 0,7 a 0,9% de N2O. Essa taxa é inferior à permitida pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o que confere ao etanol brasileiro, comparativamente à gasolina, boas possibilidades de crescimento e comercialização, fosse considerado como fator decisivo para consumo o desempenho deste combustível relacionado às emissões de gases de efeito estufa comparativamente ao combustível concorrente de fonte não renovável.
Opções têm sido estudadas para o aumento da fixação de nitrogênio no solo, evitando-se os níveis de liberação de N2O na atmosfera pelo uso de fertilizantes nitrogenados, mas sobretudo no que se refere ao cultivo da soja. Essa alternativa possibilita a diminuição de fertilizantes na plantação e consequentemente reduz a degradação do solo e poluição de água. Outra opção, também em fase de estudo e agora estendida à cana é a adição de minerais aos fertilizantes, com o papel de absorver gases que evaporariam e iriam contribuir com a poluição. No entanto, isso poderia aumentar o custo da produção. E, quanto à palha, a orientação se dá na retirada de parte dela do campo para o desenvolvimento do etanol de segunda geração ou celulósico.
Fossem as decisões de Legisladores e do Executivo pautadas pela sensibilidade ambiental, decerto que a matriz energética brasileira – estruturada na geração hidrelétrica e uma das mais limpas do planeta – nos deveria conduzir à opção estratégica por veículos elétricos em âmbito coletivo e individual. Nenhuma iniciativa consistente se observa neste sentido. Redução de danos como meio termo, a estruturação de políticas efetivas para fomento do uso de etanol da cana a exprimir vocação agrícola do país e harmonização desta com as questões de ambientais como condução razoável, não se verifica. Restam, na contramão, política de fomento ao consumo de veículos para uso individual, forte subsídio à gasolina (importada inclusive) e grande alarde sobre os potenciais de extração de petróleo em águas profundas.