Por Bianca Camatta em Jornal da USP | O metaverso é um mundo virtual que tenta replicar a realidade por meio de dispositivos digitais. Ao entrar no metaverso é possível identificar construções, cômodos, móveis, encontrar outras pessoas, por meio de seus avatares, e conversar com elas de modo semelhante a se estivessem no mundo real, o que é caracterizado, por exemplo, com o volume da voz aumentando ou diminuindo de acordo com a distância entre os avatares.
Um grupo da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, coordenado pelo professor do curso de Educação Física e Saúde Carlos Monteiro, está estudando como o metaverso pode ajudar na reabilitação de pessoas com deficiência. Um dos estudos publicados mostrou que, em pessoas com paralisia cerebral, a aplicação de tarefas em realidade virtual por meio da telerreabilitação auxiliou no engajamento, na melhora de desempenho e foi uma opção interessante para incentivar a prática de atividade física, inclusive durante a pandemia.
O estudo sobre a telerreabilitação de pessoas com paralisia cerebral foi realizado entre março e junho de 2020 e contou com a participação de 44 pessoas. O trabalho foi realizado durante o período de quarentena da pandemia de covid-19, que impedia a realização da terapia tradicional.
Com um pesquisador guiando as atividades de maneira remota e com o auxílio de um responsável, os participantes realizavam as práticas desenvolvidas, sendo uma delas um jogo em que os pacientes precisavam “pegar” bolinhas coloridas que caíam no visor do computador, o que era realizado pelos movimentos dos participantes, detectados pela câmera da máquina. Pessoas com paralisia cerebral apresentam distúrbios motores associados a aspectos como mudanças de sensação, aprendizado e comunicação, assim, o jogo buscava melhorar a performance motora.
Durante o jogo, a percepção de esforço dos participantes, ou seja, o cansaço das pessoas foi avaliado. A escala é baseada nas sensações sentidas durante o exercício, como fadiga muscular e aumento da frequência cardíaca e respiratória. Também foram analisadas a performance motora, medida pela precisão dos movimentos e o número de acertos e erros, e a motivação e satisfação dos participantes.
A melhora na performance no jogo não foi constante. Apesar disso, a recepção dos jogos pelos pacientes foi positiva, tendo sido considerado divertido pelos participantes, que se mostraram interessados em continuar a usar o jogo nas suas terapias.
“As pessoas gostam mais, elas têm mais motivação para fazer uma reabilitação em ambiente virtual”, comenta Monteiro sobre a vantagem desse formato de reabilitação em relação a outros.
O diferencial das pesquisas realizadas pelo grupo de estudos do professor Monteiro está em não utilizar o metaverso imersivo, ou seja, aquele que utiliza óculos de realidade virtual. Com um computador ou celular e uma boa conexão com a internet é possível realizar várias tarefas no metaverso. Isso facilita o acesso das pessoas a essa forma de reabilitação e evita que elas precisem gastar com óculos virtuais caros ou se deslocar para laboratórios onde existem equipamentos avançados. Com o uso do metaverso não imersivo o terapeuta também pode atender mais de um paciente por vez e pessoas de diferentes Estados passam a ter acesso a esse tratamento.
Apesar dessas vantagens, Monteiro lembra que o metaverso é um complemento dos métodos de recuperação tradicional, não uma substituição. “Percebemos que, quando tarefas no ambiente virtual são mais difíceis que no real, isso facilita na hora de realizar as atividades na vida real”, conta Monteiro sobre um dos pontos positivos dessa complementaridade.
Ele aponta como desafios para o amplo uso investidores acreditarem no uso do metaverso para fins de saúde, e a dificuldade de algumas pessoas para se adaptarem a plataformas digitais. Para ele, porém, o uso do metaverso na educação e saúde pode ser adiado, mas é inevitável.
Ilha no metaverso onde as corridas ocorreram — Foto: Arquivo pessoal do pesquisador Carlos Monteiro
O grupo também estuda o uso dessa tecnologia em outros grupos, por exemplo, em pessoas dentro do espectro autista e pessoas com síndrome de Down.
Monteiro conta que o grupo realizou a primeira corrida no metaverso para pessoas com deficiência: na pesquisa, pessoas dentro do espectro autista, por meio de comandos do teclado do computador para direcionar seus avatares, correram em um caminho predeterminado em uma ilha no metaverso. Assim, foi possível identificar que ocorreu aprendizado no controle dos movimentos de avatares. As pessoas dentro do espectro autista não só aprenderam a usar a plataforma como também descobriram sozinhas funções que aumentavam a velocidade e a performance na corrida.
O próximo projeto do grupo é o uso de avatares que se movimentam ao mesmo tempo que as pessoas. “A tecnologia irá permitir o reconhecimento do máximo de capacidade e desempenho de cada pessoa. Por meio disso, o avatar auxiliará a equilibrar dificuldades, permitindo tarefas com igualdade para todos”, diz Monteiro.
Mais informações: e-mail carlosmonteiro@usp.br, com Carlos Monteiro
Este texto foi originalmente publicado por Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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