Considerados guardiões das florestas, por contribuírem para manter preservados biomas como o da Amazônia, os povos indígenas são os grupos que mais sofrem com a poluição das queimadas, mostra estudo liderado por pesquisadores de Harvard
Por Página 22 | O material particulado da fumaça emitido pelos incêndios na Bacia Amazônica representa uma ameaça à saúde humana. Pesquisas anteriores se concentraram principalmente nos impactos da saúde nos países como um todo ou se basearam em dados de internação hospitalar para quantificar a resposta à saúde. Mas essas análises não captam o impacto sobre as pessoas que vivem em Territórios Indígenas próximos aos incêndios e que muitas vezes não têm acesso a atendimento médico e podem não comparecer aos hospitais.
No estudo “Health impacts of smoke exposure in South America: increased risk for populations in the Amazonian Indigenous territories”, pesquisadores quantificaram a mortalidade prematura devido à exposição à fumaça de pessoas que vivem em Territórios Indígenas em toda a Bacia Amazônica.
A conclusão é que a fumaça dos incêndios tem um efeito prejudicial à saúde humana em toda a América do Sul, com um impacto desproporcional nas pessoas que vivem em Territórios Indígenas – justamente os povos que mais contribuem para a preservação das florestas, sendo fundamentais para o equilíbrio climático.
Os pesquisadores estimaram quea fumaça dos incêndios na América do Sul foi responsável por cerca de 12 mil mortes prematuras a cada ano de 2014 a 2019 em todo o continente, com cerca de 230 dessas mortes ocorrendo em Terras Indígenas. Ou seja, a exposição à fumaça é responsável por duas mortes prematuras por 100 mil pessoas por ano na América do Sul, mas quatro mortes prematuras por 100 mil ocorrem pessoas nos Territórios Indígenas. A Bolívia e o Brasil representam pontos críticos de exposição à fumaça e as mortes em territórios indígenas nesses países são de nove e 12 por 100 mil pessoas, respectivamente.
“Estudos como este ressaltam a importância de olhar para o uso do fogo na Amazônia como uma questão de saúde pública. Estamos perdendo vidas por causa dos aumentos das queimadas e isso só tende a piorar nesse cenário acirrado pela mudança climática. Precisamos reforçar políticas que controlem esse uso”, afirma a diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e coautora do estudo, Ane Alencar.
Liderado por pesquisadores da Universidade Harvard, o estudo usa uma combinação de modelos de transporte químico atmosférico e uma função de resposta de concentração atualizada para estimar a taxa de mortalidade de indígenas expostos a altas concentrações de MP 2.5, nome dado às partículas microscópicas emitidas pelas queimadas. A exposição a esse material pode resultar em sintomas fisiológicos como doenças cardiovasculares e respiratórias e percorrem grandes distâncias, afetando a qualidade do ar em vários países da América do Sul.
“Esses incêndios têm um impacto desproporcional sobre as pessoas que vivem em Territórios Indígenas. Com tempos de exposição mais longos e acesso limitado a atendimento médico, populações indígenas correm um risco de morte muito maior”, afirma a principal autora do estudo, Eimy Bonilla. “Recomendamos que os governos forneçam assistência financeira para monitorar a qualidade do ar nessas regiões, fornecendo sensores de baixo custo para estudar o impacto da exposição de curto e longo prazo à fumaça.”
Nos últimos anos, a taxa de queima de biomassa na América do Sul aumentou, impulsionada pela degradação florestal causada pela atividade humana (como mineração, extração de madeira e uso de terras agrícolas) e variações nas condições climáticas.
Este texto foi originalmente publicado pela Página 22 de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.