Alberto do Amaral Junior avalia os desdobramentos econômicos e militares e se diz pessimista sobre a possibilidade de resolução do conflito
Por Redação em Jornal da USP
A guerra entre Rússia e Ucrânia acaba de completar três meses. No dia 24 de fevereiro, tropas russas invadiram o território ucrianiano por terra, céu e mar. Desde então, o conflito resultou em milhares de mortes, 6 milhões de refugiados e 8 milhões de deslocados internos.
Como reação, diversos países condenaram a invasão e impuseram sanções econômicas à Rússia. Mais recentemente, Suécia e Finlândia ingressaram com pedidos para entrar na Otan, uma aliança militar liderada pelos Estados Unidos.
Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição, o professor Alberto do Amaral Junior, do Departamento de Direito Internacional da Faculdade de Direito (FD) da USP e colunista da Rádio USP, analisa os desdobramentos da invasão.
Crise econômica, humanitária e militar
“As perdas são imensas, a tragédia ambiental provocada é enorme, a tragédia humanitária é igualmente colossal.” É assim que Amaral avalia as consequências da guerra até aqui. As sanções econômicas impostas, segundo o professor, não produziram os efeitos necessários de cessar as atividades e a ofensiva russa.
Por outro lado, o professor lembra que o conflito trouxe grandes prejuízos para a economia ucraniana e mundial. A Ucrânia é um dos grandes produtores de milho, trigo e cevada. Já do lado russo, o fornecimento de gás natural para países como Polônia e Finlândia foi interrompido. “As sanções comerciais provocam efeitos sistêmicos para o mundo como um todo, como aqueles referentes à crise alimentar, à ampliação da desigualdade social e ao aumento da fome no mundo”, destaca.
Do ponto de vista militar, Amaral conta que a Rússia esperava uma conquista rápida e sem resistência por parte dos ucranianos, o que não ocorreu. Então, a estratégia inicial foi alterada e os ataques foram concentrados na região do Donbass, no leste da Ucrânia, onde a população é majoritariamente russa.
O antagonismo com a Otan, uma aliança militar que envolve Estados Unidos e países da Europa, é apontado como um dos motivos por trás da invasão russa. Segundo o professor, essa questão é relevante, mas não é a principal causa da guerra. “O que move o presidente russo Vladimir Putin é a reconstituição de um império”, afirma, ao lembrar que ele é um dos grandes defensores da União Soviética.
Os russos esperavam que a aliança estivesse enfraquecida, já que sua própria existência foi questionada por Donald Trump, ex-presidente dos EUA. Porém, o conflito gerou um grande temor de países vizinhos da Rússia, que buscam ingressar na Otan, o que, de certa forma, a fortaleceu.
Ainda assim, Amaral afirma que existem dificuldades para que países como a Suécia ingressem na aliança. A Turquia vetou a entrada sueca “por razões específicas à política sueca”. A Suécia tem uma política de apoio aos curdos, um grupo étnico perseguido pela Turquia. “Há questões que podem ser resolvidas com negociações entre os países, mas são obstáculos levantados”, afirma o professor.
O grande número de deslocados também é uma das consequências da guerra. O professor lembra que essa questão se soma à crise provocada pela guerra civil na Síria, que também gerou um grande numero de refugiados para o continente europeu. “O conflito transforma esse problema em uma questão de política pública que deve ser executada pelos países da União Europeia para atender às necessidades dos refugiados.”
Possíveis desfechos
Em relação à possibilidade de uma resolução do conflito, o professor se diz pessimista. “Para que haja negociações, é preciso que exista confiança entre as partes.” Amaral também ressalta que as reivindicações russas, como a anexação da região do Donbass, são incompatíveis com os interesses ucranianos.
Ele destaca que a guerra registra uma flagrante violação do direito internacional. “Quando a Rússia invade a Ucrânia, ela automaticamente viola o artigo segundo da carta das Nações Unidas, que estabelece a integridade territorial e independência política dos Estados como um dos princípios fundamentais”, afirma. “Não há nenhuma justificativa plausível para a invasão russa ao território ucraniano. O balanço é sombrio e não existe uma perspectiva de que o conflito seja resolvido no curto prazo”, avalia o professor.
Este texto foi originalmente publicado por Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não representa necessariamente a opinião do Portal eCycle.