Hidrogênio musgo é um termo dado ao hidrogênio (H2) produzido a partir de biomassa. De modo geral, ele pode ser classificado como uma fonte de energia verde e limpa, mas difere do hidrogênio verde por ser obtido a partir de fontes específicas e por gerar dióxido de carbono (CO2) durante sua produção.
A expressão “hidrogênio musgo” pode ser vista como preciosismo técnico de classificação, mas, de acordo com o jargão “verde e sustentável” na linguagem popular, o H2 musgo também pode ser considerado “verde”.
O hidrogênio é o elemento mais leve e abundante do Universo. Ele se encontra na família IA da tabela periódica, mas não é caracterizado como um metal alcalino, pois possui propriedades físico-químicas diferenciadas que o tornam único dentre todos os demais.
Quando entra em combustão em motores ou é convertido em energia elétrica por meio de células de hidrogênio, este elemento libera apenas água e energia (1). Neste sentido, o H2 é considerado uma fonte limpa de energia, mas é preciso que seu processo de produção seja de baixo carbono para que realmente possa ser classificado de tal forma.
O hidrogênio musgo é uma alternativa promissora na produção de hidrogênio, diferenciando-se das outras cores do hidrogênio pelo método de obtenção e matérias-primas. Esse tipo de H2 é extraído da biomassa ou biocombustíveis, por meio de processos como reformas catalíticas, gaseificação ou biodigestão anaeróbica.
Em termos simples, é uma forma de hidrogênio verde, mas, diferente do hidrogênio produzido a partir da eletrólise da água, o hidrogênio musgo é extraído das moléculas presentes na biomassa e no biocombustível.
O processo de produção do hidrogênio musgo é caracterizado por etapas que envolvem a transformação de biomassa ou biocombustíveis em hidrogênio, sendo uma alternativa atrativa para a transição energética, caso ocorra a captura e armazenamento do carbono (CCS em inglês) gerado em sua produção.
A biodigestão anaeróbia é a principal forma de obter H2 através da biomassa. Nela, micro-organismos capazes de metabolizar compostos orgânicos em ambientes sem oxigênio são utilizados para realizar a conversão (2).
Antes de entrar no processo de fermentação, a biomassa é submetida a um estágio de preparo. Essa etapa inclui tratamentos para remover impurezas e garantir que os açúcares e outros compostos orgânicos presentes na biomassa estejam acessíveis aos microrganismos envolvidos na fermentação (3).
A biomassa preparada é então submetida à fermentação anaeróbica. Esse é um processo biológico que ocorre em um ambiente sem a presença de oxigênio, e é nesse contexto que microrganismos entram em ação. Esses microrganismos têm a capacidade de converter compostos orgânicos complexos (carboidratos, proteínas e lipídios) em outros mais simples, como ácidos orgânicos voláteis (ácidos acético, propiônico, isobutírico e butírico), álcoois (etanol, butanol), hidrogênio (H2), dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4) (4).
Após a fermentação, é necessário separar o hidrogênio dos demais produtos gasosos resultantes do processo. Essa etapa de separação pode ser realizada por meio de diferentes métodos, com objetivo de obter hidrogênio puro, pronto para ser utilizado como uma fonte de energia limpa (4).
As reformas catalíticas representam um processo no qual a biomassa é submetida a uma série de reações químicas em presença de catalisadores. Esses catalisadores aceleram as reações de decomposição da matéria orgânica, resultando na liberação de hidrogênio (5).
Por outro lado, a gaseificação é um processo que converte biomassa em gás de síntese (syngas), uma mistura de hidrogênio, monóxido de carbono e outros compostos gasosos. Nesse método, a biomassa é submetida a temperaturas elevadas e pressão controlada, resultando na quebra de suas moléculas complexas. Esse processo promove a liberação de gás de síntese, rico em hidrogênio, que pode ser posteriormente isolado e utilizado como combustível (6).
O hidrogênio musgo apresenta diversas vantagens em comparação com outros métodos de produção de hidrogênio. Ele é considerado uma fonte de energia renovável, pois utiliza biomassa como substrato para a fermentação, sendo essa biomassa abundante e de baixo custo. Além disso, o processo de obtenção do hidrogênio musgo pode ser mais acessível economicamente, especialmente quando comparado à eletrólise, uma alternativa convencional para a obtenção de hidrogênio verde.
Outra vantagem diz respeito à capacidade de compensar o CO2 gerado em sua produção. Isso é possível porque a biomassa cultivada pode sequestrar mais CO2 do que o produzido na geração de hidrogênio. Além disso, quando a produção de hidrogênio a partir de biomassa é combinada com a captura e armazenamento de carbono, o processo pode resultar em “carbono negativo” (7). Isso significa que mais CO2 é removido da atmosfera do que é emitido, contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas.
Essa característica o torna relativamente mais vantajoso em comparação a outras tecnologias de obtenção de H2, como hidrogênio cinza e azul, gerados a partir da reforma a vapor do gás natural, e do hidrogênio marrom e preto, extraídos do carvão mineral.
A sustentabilidade do hidrogênio musgo depende da superação dos desafios mencionados, principalmente em termos de eficiência, gestão ambiental do processo de produção e destinação correta do carbono que possa ser gerado.
O hidrogênio musgo, por ser obtido a partir de biomassa, depende de práticas agrícolas como a monocultura, para a produção de suas matérias-primas. Sendo assim, a expansão da produção de H2 musgo pode levar ao desmatamento e ao uso intensivo do solo para a implementação de novas plantações (11).
Isso pode resultar em impactos significativos na biodiversidade, com plantações frequentemente apresentando menor potencial para a criação de habitats em comparação com as florestas naturais (12). Além disso, substituir ecossistemas naturais, como florestas, savanas e pastagens, por plantações pode reduzir ainda mais a biodiversidade (13).
O uso excessivo de fertilizantes e agrotóxicos tem um impacto negativo no meio ambiente, levando à eutrofização de corpos hídricos. A eutrofização pode levar à hipóxia (zonas mortas), causando a morte de peixes e uma diminuição na vida aquática. Além disso, nutrientes em excesso podem causar florações de algas nocivas (HABs) em sistemas de água doce, que não só perturbam a vida selvagem, mas também podem produzir toxinas prejudiciais aos seres humanos (14).
Ademais, os problemas de saúde em pessoas que consomem alimentos contaminados com agroquímicos são uma preocupação significativa. A maioria dos problemas associados aos fertilizantes está ligada ao uso excessivo e ineficiente. Isso leva a perdas de nutrientes para o meio ambiente e outros impactos adversos, como a contaminação da água potável (15).
Neste sentido, é crucial garantir a certificação da matéria-prima utilizada, assegurando que o hidrogênio musgo não contribua para práticas prejudiciais ao meio ambiente. Exemplos como o RenovaBio, uma iniciativa do Governo Federal para ampliação sustentável do uso de biocombustíveis, indicam que a certificação e rastreamento são elementos-chave para a aceitação de fontes renováveis no mercado internacional.
O hidrogênio musgo pode seguir uma trajetória semelhante, exigindo investimentos em pesquisa e desenvolvimento para tornar seu processo mais eficiente e sustentável, alinhado às demandas globais por energias mais limpas e renováveis.
No entanto, o hidrogênio musgo não está isento de desafios. A eficiência do processo de fermentação anaeróbica exige grandes quantidades de biomassa e sistemas complexos de controle dos micro-organismos para produzir uma quantidade significativa de hidrogênio (8, 9).
Além disso, a aceitação do hidrogênio musgo no mercado internacional está vinculada à certificação da biomassa como uma fonte sustentável (10). Segundo um artigo publicado pela Agência epbr, o Brasil, por exemplo, precisa cumprir metas de redução de desmatamento ilegal até 2030 e adotar tecnologias como o blockchain para rastreamento da matéria-prima, garantindo que sua produção não esteja associada ao desmatamento.
Vale ressaltar que o hidrogênio musgo produzido por biodigestão anaeróbia gera CO e CO2 (8), gases de efeito estufa que contribuem para o aquecimento global. É possível que este carbono seja capturado e utilizado por diferentes indústrias, ou mesmo armazenado em reservatórios geológicos. Entretanto, caso o CO2 seja liberado na atmosfera, os impactos ambientais decorrentes desta prática podem tornar o hidrogênio musgo uma fonte insustentável de energia.
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