O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) indeferiu a licença prévia ambiental para a construção da Usina Hidrelétrica de Tijuco Alto, no Vale do Ribeira, na divisa entre os estados de São Paulo e do Paraná, devido à inviabilidade ambiental do empreendimento, após 28 anos de luta das populações locais, quilombolas e pequenos agricultores contra a construção da usina.
No Ibama, o processo de licenciamento ambiental tramita há mais de dez anos, com início em janeiro de 2004. Os dados do Estudo de Impacto Ambiental são datados de 2005. Dois anos depois, houve audiências públicas nos municípios de Cerro Azul (PR), Adrianópolis (PR), Ribeira (SP), Registro (SP) e Eldorado (SP), que sofreriam impactos pela obra. As audiências tiveram grande participação da sociedade e fortes manifestações contrárias ao empreendimento.
“Em todos os momentos, houve muita pressão popular. Não sei até se o empreendedor esperava alguma participação desse nível, eram audiências [públicas] que varavam a madrugada, com muitos questionamentos [da população afetada]”, disse Ivy Wiens, do Programa Vale do Ribeira do Instituto Socioambiental (ISA) sobre a importância da resistência local.
Um dos momentos emblemáticos, segundo Ivy, foi a mobilização sobre a Fundação Cultural Palmares, que é o órgão consultado no caso de empreendimentos que afetem as comunidades quilombolas, que tinha emitido parecer que não se opunha à liberação da licença prévia. Assim que as organizações do Vale do Ribeira souberam do parecer, pediram uma audiência específica com a entidade, que ocorreu em Adrianópolis com as comunidades, e a fundação reviu o parecer.
“Porque aí [a fundação] não estava simplesmente em um gabinete despachando, mas conhecendo a realidade, conversou com as comunidades e viu que, de fato, haveria um impacto”, disse Ivy, avaliando este como um resultado positivo da articulação e da pressão da sociedade.
O documento de suspensão, assinado pela presidente do Ibama, Suely Araújo, e pela diretora de Licenciamento Ambiental, Rose Mirian Hofmann, considerou que “a ponderação dos efeitos benéficos e adversos do empreendimento mostra evidente desequilíbrio na distribuição de ônus e benefícios, em virtude da perspectiva de alto impacto ambiental, em área inserida integralmente no bioma Mata Atlântica, para geração ineficiente de energia elétrica para abastecimento do complexo metalúrgico [da Companhia Brasileira de Alumínio (CBA)]”.
O relatório do Ibama informou que “a região de inserção do empreendimento é bastante sensível quanto à presença de comunidades remanescentes de quilombos”. O Ibama diz ainda que o processo de licenciamento da UHE Tijuco Alto recebeu, além de forte pressão popular contrária à implantação do empreendimento, recomendações de entidades sociais e do Ministério Público para a não construção da usina.
Segundo despacho produzido pela Coordenação-Geral de Infraestrutura de Energia Elétrica (CGENE) do Ibama, dados mostram “a relação da área inundada com a energia firme [máxima produção em período crítico], demonstrando que o projeto é ineficiente quando comparado a outros da mesma ordem de grandeza de área inundada”.
O instituto constatou também que o trecho a ser inundado estava “em franco processo de regeneração vegetal”. Tudo isso influenciou na decisão de Rose, que diz que o projeto já demonstrava ser “inviável ambientalmente”. A proposta de construção da UHE Tijuco Alto abrangeria o trecho superior do Rio Ribeira de Iguape. As cidades afetadas diretamente com a inundação seriam Adrianópolis (PR), Cerro Azul (PR) e Ribeira (SP).
A licença foi solicitada pela Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), que havia conseguido concessão para produção de energia elétrica de uso exclusivo, por meio do Decreto Federal nº 96.746, de 21 de setembro de 1988, com prazo de vigência expirando em 2018.
O Movimento dos Ameaçados por Barragens (Moab) acompanhou a luta das comunidades de remanescentes de quilombos do Vale do Ribeira, que vêm lutando contra a construção de barragens no Rio Ribeira de Iguape desde o fim da década de 1980.
Se Tijuco Alto, entre outros projetos de usinas para a região, fosse construída, vastas áreas de Mata Atlântica seriam inundadas, causando prejuízos ambientais, sociais e culturais à região, segundo a entidade. Terras ocupadas por comunidades quilombolas e por pequenos agricultores foram ameaçadas durante o longo processo, que terminou com a suspensão do licenciamento ambiental pelo Ibama.
“Quando começou o processo de licenciamento de Tijuco Alto, eram pensadas quatro usinas no total. Tijuco era a primeira, depois mais três ao longo do Rio Ribeira, na porção paulista, que seriam Itaóca, Funil e Batatal, que pegaria desde o alto Ribeira até a região de Eldorado”, diz Ivy. De acordo com levantamento do movimento, uma área de cerca de 11 mil hectares seria inundada se as quatro usinas hidrelétricas fossem construídas na Bacia do Rio Ribeira do Iguape.
“A primeira hidrelétrica a ser construída seria Tijuco Alto, um empreendimento do Grupo Votorantim. Planejada para gerar 155 MW [megawatts] de energia, ela atenderia exclusivamente aos interesses da Companhia Brasileira de Alumínio, empresa desse grupo empresarial que detém um complexo metalúrgico localizado no município paulista de Mairinque”, segundo informações do movimento.
Em nota, a Votorantim respondeu que tomou conhecimento da decisão do Ibama, mas que ainda não foi citada pelo órgão. “Independentemente disso, a companhia vem avaliando a viabilidade e o futuro do projeto Tijuco Alto desde 2014, quando teve indeferido pela Aneel [a Agência Nacional de Energia Elétrica] o pedido de recomposição do prazo de concessão, que vence em 2018”, diz a nota.
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