Por Assessoria de Comunicação ICV | Quem é de fora logo percebe que o passar do tempo é diferente no Pantanal. Quem é de dentro, vê o rio Cuiabá, um dos mais importantes formadores do bioma, se transformar todos os dias.
“Na frente da minha primeira casa tinha muito pé de mangueira, o rio foi levando um por um e sobrou só aquela”, apontou Ana das Dores Xavier da Silva, sentada no banco de madeira na lateral da sua segunda casa. A primeira está ao lado da última mangueira, poucos metros da margem do rio.
Quando perguntada sobre o desmoronamento do barranco, Ana lembra do seu pai, que teve as suas duas moradias levadas pelas águas. A primeira ficou na memória. Da segunda, onde a pescadora chegou a morar, ainda resta parte da parede da cozinha.
Para garantir a proteção de moradias e a permanência das comunidades tradicionais pantaneiras, um projeto piloto, realizado em parceria entre o Instituto Centro de Vida (ICV), a Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira, Associação de Agricultores Familiares e Produtores de Mel da Comunidade de Piúva e a comunidade Piúva, que reúne 62 famílias na região de Barão de Melgaço, vai restaurar trechos degradados às margens do rio Cuiabá.
A campanha Pantanal Vivo foi lançada pelo instituto para que a população também possa participar desse processo por meio da doação de qualquer quantia em dinheiro. O valor será revertido para complementar o custeio do processo de recuperação dos barrancos degradados.
Neste primeiro momento, estão sendo restauradas áreas ribeirinhas em duas comunidades: Sangrador Grande e Piúva, totalizando 120 metros. Nessas áreas, o processo de desbarrancamento vem se acelerando. Casas que antes ficavam 50 metros distantes da margem do rio, hoje estão a menos de 30 metros.
As etapas da restauração consistem em trazer uma vegetação que imita o ciclo da natureza, explicou a analista do programa de Direitos Socioambientais do ICV, Paloma Pressato.
“Primeiro vamos começar com as gramíneas daqui do bioma (capim-de-praia), que vêm rápido. A ideia é que a trama das raízes feche o barranco para que a água não impacte tanto. Depois vamos entrar com mudas de sarã, sardinheira e estimular a cobertura da vegetação nativa”.
Ana das Dores, que faz questão de dizer que nasceu no dia da Nossa Senhora das Dores, 15 de setembro, também lembra com muita dor dos dias de aflição causados pelas queimadas de 2020.
“Estava eu e a minha irmã na casa dela e o fogo vinha chegando, chegando. Aí nós corremos pra chamar o pessoal pra ajudar. Foi bem demorado, mas com a ajuda dos vizinhos conseguimos apagar o fogo. Queimou bastante, matou muitos animais e até hoje tem umas áreas que não se recuperam”.
As fotos das queimadas de 2020 ainda estão na memória e no celular da Ana das Dores.
Secas severas, incêndios florestais, desmatamento, mudanças climáticas e impactos causados pelo homem, como o controle de cheias pela represa da usina de Manso, implicam na dinâmica das águas, no movimento dos animais e dos peixes. Nos últimos anos, têm definido também o movimento das pessoas.
Há mais de 4 décadas, a pescadora profissional aposentada, Ana Francolino de Almeida, acompanha de perto as mudanças do Pantanal. Com expressão de quem está determinada a não chorar durante a entrevista, fala com espanto sobre o tanto que o rio Cuiabá já mudou.
“Mudou da água pro vinho, você nem acredita”. O projeto piloto de restauração do barranco é realizado onde um dia foi a área da sua primeira casa.
A erosão é um fenômeno predominantemente natural, causado pela força das águas, das chuvas, dos ventos, e de outros fatores. No entanto, o desmoronamento nas margens do Rio Cuiabá tem se intensificado nos últimos anos, especialmente em áreas desprotegidas, com perda de vegetação nativa.
O desequilíbrio provoca o deslocamento das famílias ribeirinhas, que acabam tendo que arcar com os custos da construção de uma nova casa e com angústia de ver parte da sua história sendo engolida pelo rio.
“Os próprios ribeirinhos falam como essas erosões têm acelerado de alguns anos pra cá, evidenciando as mudanças climáticas e como o Pantanal, um bioma tão sensível sofre com isso. Para além da questão ambiental, mas social também, sobretudo das pessoas que vivem no Pantanal”, disse o analista do programa de Direitos Socioambientais do ICV, Valter Hiron da Silva Junior.
A campanha Pantanal Vivo mostra que várias espécies correm risco de extinção por conta do desmatamento e queimadas no Pantanal. Povos indígenas, comunidades tradicionais da região sofrem com a seca, a perda de lavouras, criações e a queda das suas casas.
O tempo é curto, mas ainda temos a chance de reverter a situação. Ajude o Pantanal a recuperar barrancos degradados da região de Barão de Melgaço (MT).
O Pantanal abriga bichos e árvores nativas, mas também é casa para comunidades tradicionais e agricultores familiares. Todos estão ameaçados. Para participar da campanha, doe qualquer valor através do PIX icv@icv.org.br do Instituto Centro de Vida (ICV).
Este texto foi originalmente publicado por ICV de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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