O inconsciente, segundo a Teoria Psicanalítica da Personalidade, desenvolvida pelo médico e psiquiatra alemão Sigmund Freud no final do século 19, é um “reservatório” de sentimentos, pensamentos, impulsos e memórias que estão fora da percepção consciente.
Dentro dessa compreensão, grande parte dos conteúdos do inconsciente é considerada indesejável e desagradável. Freud acreditava que o inconsciente continua a influenciar o comportamento no nível consciente, embora as pessoas não tenham ciência dessas influências subjacentes.
A ideia de que existem forças fora da percepção consciente existe há milhares de anos. O termo “inconsciente” foi cunhado pelo filósofo Friedrich Schelling no final do século 18 e, mais tarde, traduzido para o inglês pelo poeta Samuel Taylor Coleridge.
No campo da psicologia, a noção de influências inconscientes foi abordada por pensadores como William James e Wilhelm Wundt, mas foi Freud quem popularizou o conceito e o tornou um componente central de sua abordagem psicanalítica da psicologia.
O psiquiatra suíço Carl Jung também acreditava que o inconsciente desempenhava um papel importante na formação da personalidade. No entanto, ele acreditava que havia um inconsciente pessoal que consistia em memórias e impulsos suprimidos ou esquecidos de um indivíduo, bem como naquilo que chamou de inconsciente coletivo. Jung defendia que o inconsciente coletivo continha memórias ancestrais herdadas comuns a toda a humanidade.
Embora muitas das ideias de Freud tenham caído em desuso na psicologia contemporânea, os psicólogos continuam a explorar as influências dos processos mentais inconscientes, incluindo tópicos relacionados, como preconceito inconsciente, memória implícita, atitudes implícitas, priming e aprendizagem não consciente.
Para Freud, fundador da Psicanálise e o primeiro a chamar a atenção para a importância da influência da mente inconsciente no nosso cotidiano, o aparelho psíquico, ou psique humana, é formado por três níveis de consciência: consciente, pré-consciente e inconsciente.
Nessa divisão topográfica da mente, cada instância psíquica (Ego, Id e Superego) encontra o seu lugar. O Id corresponde ao instinto primitivo, aos impulsos irracionais e ao princípio do prazer. Localizado no nível inconsciente, o Id não reconhece valores morais nem noções de certo e errado, sendo guiado pelas pulsões.
O Ego, que atua no nível consciente, evolui a partir do Id e, por isso, possui elementos do nível inconsciente. No entanto, ao elaborar os impulsos recebidos do Id e julgar se deve dar ou não vazão a esses impulsos, o Ego leva em consideração aquilo que é adequado ou inadequado a cada ocasião.
Se o Ego recebe uma pulsão do inconsciente para, por exemplo, comer em excesso no jantar, ele terá os recursos necessários para decidir o que fazer diante daquele desejo. Antes de tomar a decisão, ele poderá considerar, por exemplo, que 1) que está de dieta; 2) que essa atitude não é saudável; 3) que é uma exceção, então tudo bem “enfiar o pé na jaca” eventualmente. Em última instância, o Ego é responsável pela tomada das decisões diante do impulso recebido pelo Id (inconsciente) e da censura exercida pelo Superego.
O Superego, que atua nos níveis pré-consciente e inconsciente, é o responsável pela censura. É ele quem nos impede de sair fazendo tudo o que nos dá na telha. O Superego se forma ao longo dos anos, geralmente como resultado de punições, sanções e castigos sofridos na infância.
Noções de certo e errado, valores morais e aspectos culturais são internalizados nesta instância, que atua como reguladora dos impulsos que o Id envia ao Ego. Atuando contra as pulsões irracionais do Id, o Superego tem a função de alertar ao Ego sobre as possíveis consequências de tomar decisões “inadequadas” sob o jugo dos desejos primitivos do Id.
Para entender melhor o conceito de inconsciente, pense que a mente humana é como se fosse um iceberg: tudo aquilo que está acima da água representa a percepção consciente, enquanto tudo o que se localiza abaixo da água representa o inconsciente.
Considere a aparência de um iceberg se você pudesse vê-lo por inteiro: apenas uma pequena parte dele seria realmente visível acima da água, certo? O que você não pode ver da superfície é a enorme quantidade de gelo que constitui a maior parte do iceberg, submerso nas profundezas da água.
As coisas que representam nossa percepção consciente são simplesmente “a ponta do iceberg“. O resto da informação que está fora da percepção consciente encontra-se abaixo da superfície. Embora essa informação possa não estar acessível conscientemente, ela ainda exerce uma influência sobre o comportamento do indivíduo.
O inconsciente é a vasta soma de operações da mente que ocorrem abaixo do nível de percepção consciente. A mente consciente contém todos os pensamentos, sentimentos, cognições e memórias que reconhecemos, enquanto o inconsciente consiste em processos mentais mais profundos que não estão imediatamente disponíveis para o acesso da mente consciente.
Boa parte do que aprendemos, especialmente o reconhecimento de padrões complexos, ocorre fora da percepção consciente. Da mesma forma, muitos dos elementos que compõem os julgamentos e a tomada de decisões são processados fora da consciência.
A intuição também é um produto de operações mentais inconscientes, um conjunto de suposições rapidamente montadas a partir de conhecimento e experiência cumulativos. Grande parte da motivação humana e da atração interpessoal também toma forma além da percepção consciente.
O cérebro é um órgão muito ocupado, dirigindo o corpo, constantemente recebendo informações por meio dos sentidos e tomando decisões: tudo ao mesmo tempo. O inconsciente é um motor de processamento de informações, e a maior parte do funcionamento humano ocorre nele. É mais importante que o cérebro receba informações do que saiba como as obteve.
A psicoterapia é um processo de autoconhecimento e resolução de problemas guiada por um especialista, que se baseia em descobrir como e onde encontrar a gênese do problema. Afinal, é difícil se livrar de uma dificuldade – um trauma, um padrão de comportamento, um hábito nocivo – se você desconhece sua origem.
A maioria das formas de psicoterapia visa trazer à consciência crenças e medos ocultos, muitas vezes adquiridos durante a infância, para que possam ser examinados criticamente e, posteriormente, elaborados pelo próprio indivíduo, para que ele possa se entender melhor e, assim, poder se livrar de hábitos possivelmente autodestrutivos.
Freud acreditava que trazer à tona o conteúdo do inconsciente era importante para aliviar o sofrimento psíquico. Mais recentemente, pesquisadores têm explorado diferentes técnicas para verificar como as influências inconscientes podem afetar os comportamentos.
Existem algumas maneiras diferentes pelas quais as informações do inconsciente podem ser trazidas à consciência ou estudadas por pesquisadores.
Freud acreditava que poderia trazer à consciência sentimentos inconscientes por meio do uso de uma técnica chamada associação livre. Ele pediu aos pacientes que relaxassem e dissessem o que quer que viesse à mente, sem nenhuma consideração sobre quão trivial, irrelevante ou embaraçoso isso poderia ser.
Ao rastrear essas correntes de pensamento, Freud acreditava que poderia descobrir o conteúdo da mente inconsciente, onde existiam desejos reprimidos e memórias dolorosas da infância.
Freud também sugeriu que os sonhos seriam uma rota para o inconsciente. Embora as informações da mente inconsciente possam às vezes aparecer em sonhos, ele acreditava que, muitas vezes, elas vêm até nós de forma disfarçada.
Como tal, do ponto de vista de Freud, a interpretação do sonho exigiria o exame do conteúdo literal do evento onírico (conhecido como conteúdo manifesto) para tentar descobrir seu significado oculto e inconsciente (chamado de conteúdo latente).
Freud também acreditava que os sonhos eram uma forma de realização de desejos. Como esses impulsos inconscientes não podiam ser expressos na vida desperta, eles encontrariam expressão nos sonhos.
Por que você comprou seu carro? Por que se apaixonou por seu parceiro? Quando começamos a examinar nossas escolhas na vida, sejam elas determinantes ou irrelevantes, podemos chegar à conclusão de que não temos muita noção de como e por que chegamos aonde chegamos. Na verdade, podemos até nos perguntar se de fato conhecemos nossa própria mente e se entendemos o que acontece nela para além de nossa percepção consciente.
Mas será que tomamos decisões sem pensar conscientemente sobre elas? Para descobrir, pesquisadores investigaram três tópicos: até que ponto nossas escolhas são baseadas em processos inconscientes; se esses processos inconscientes são fundamentalmente tendenciosos (por exemplo, sexistas ou racistas); e o que pode ser feito para que aprendamos a tomar decisões melhores.
Para o primeiro ponto, o estudo examinou se as melhores escolhas feitas em ambientes de consumo eram baseadas no pensamento ativo ou não. Surpreendentemente, descobriu-se que as pessoas fazem escolhas melhores quando não pensam em nada, especialmente em ambientes de consumo complexos.
Os pesquisadores argumentaram que isso ocorre porque nossos processos inconscientes são menos restritos do que os processos conscientes, que demandam muito do nosso sistema cognitivo. Os processos inconscientes, como a intuição, funcionam de maneiras que sintetizam automática e rapidamente uma variedade de informações complexas, o que dá uma vantagem sobre o pensamento deliberado.
Outro estudo mostrou que, por meio do uso de uma técnica chamada “teste de associação implícita (TAI)”, as pessoas podem revelar atitudes inconscientes e tendenciosas em relação a outras pessoas (como discriminação racial ou de gênero).
A pesquisa também sugeriu que essas atitudes podem motivar decisões tendenciosas em várias instâncias, como na contratação de pessoas para vagas de emprego, no campo jurídico e até na área médica, mostrando que preconceitos inconscientes podem ser determinantes em processos de tomada de decisão que envolvem a vida de outras pessoas.
A ciência também tem empreendido esforços para melhorar a maneira como tomamos decisões em nossa vida cotidiana (como optar por uma alimentação saudável ou economizar para a aposentadoria), minimizando o impacto de processos inconscientes tendenciosos que limitam nossa capacidade de fazer escolhas mais adequadas.
Aqui, o trabalho do ganhador do Prêmio Nobel Richard Thaler e Cass Sunstein foi revolucionário. A ideia básica por trás de seu projeto vem do cientista cognitivo Daniel Kahneman, outro ganhador do Prêmio Nobel, que argumentou que as pessoas tomam decisões precipitadas motivadas principalmente por forças inconscientes.
Para ajudar a melhorar a forma como tomamos decisões, afirmam Thaler e Sunstein, precisamos redirecionar processos inconscientemente tendenciosos para a melhor decisão. A solução estaria na Teoria do Incentivo, ou nudge: um leve “empurrãozinho” que levaria as pessoas a detectar automaticamente as escolhas mais adequadas.
Um “empurrãozinho” ou incentivo para que os consumidores optem por alimentos mais saudáveis na hora das compras seria, por exemplo, reduzir o acesso aos doces em um supermercado, dando, por outro lado, destaque à seção de frutas. Essa técnica já foi adotada globalmente em diversas instituições públicas e privadas.
Algumas pesquisas, no entanto, defendem que as técnicas de nudge geralmente são falhas. Em alguns casos, o tiro acabou saindo pela culatra, levando a resultados piores do que aqueles que seriam obtidos caso a estratégia não fosse aplicada. Existem várias razões para isso, como mau uso do método ou interpretação inadequada do contexto por parte dos consumidores. Aparentemente, é necessário mais do que um “empurrãozinho” para mudar o comportamento das pessoas.
Além disso, os defensores do método nudge nos levam a acreditar que somos mais facilmente influenciados do que pensamos e do que somos. Um aspecto fundamental de nossas experiências psíquicas é a crença de que somos os agentes da mudança, seja em circunstâncias pessoais (como formar uma família) ou externas (como combater as mudanças climáticas antropogênicas).
No geral, preferimos aceitar que temos livre escolha em todos os tipos de contextos, mesmo quando nos percebemos sob a ameaça de mecanismos que nos manipulam inconscientemente, como revelam pesquisas. No entanto, ainda acreditamos estrategicamente que temos menos agência, controle e responsabilidade em áreas específicas com base na relevância que damos a essas áreas.
Por exemplo, preferimos reivindicar controle e agência conscientes sobre nosso voto político do que sobre o cereal matinal cheio de açúcar que estamos comprando. Portanto, podemos argumentar que nossa má escolha para o café da manhã se resume à propaganda subliminar. Contudo, estamos menos inclinados a aceitar que fomos enganados para votar em um candidato político influenciados pela força das redes sociais, por exemplo.
Muitas descobertas científicas reforçam a intuição extrema de que somos fundamentalmente governados por nosso inconsciente. Mas a evidência científica mais robusta indica que somos, provavelmente, governados mais pelo pensamento consciente do que pelo pensamento inconsciente.
Podemos ter a sensação de que nem sempre estamos totalmente cientes das razões pelas quais fazemos o que fazemos – talvez porque nem sempre prestemos atenção aos nossos pensamentos e motivações internas. Entretanto, isso não é equivalente a ter o nosso inconsciente governando nossas decisões o tempo todo.
Embora boa parte das escolhas que fazemos no dia a dia tenham uma influência certeira do inconsciente (ou do Id irracional, como você preferir chamá-lo), é o nosso consciente, o Ego, quem tem o poder de tomar as decisões. É dele que dependem suas escolhas de consumo e de estilo de vida.
Em outras palavras, seguir uma alimentação saudável, fazer exercícios físicos, praticar o consumo consciente e tomar medidas para reduzir o impacto que suas ações têm no mundo são ações que dependem, exclusivamente, de você. Se, diante da dúvida, o inconsciente bater à porta, lembre-se de que ele pode ter alguma influência, mas que a decisão final é sua.
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