Investimento em adaptação climática precisa ser ao menos 5 vezes maior

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Por Nações Unidas Brasil | O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) publicou uma entrevista com um de seus especialistas da Divisão de Ciência, Maarten Kappelle, para aprofundar os resultados do Relatório sobre a Lacuna de Adaptação 2022.

O PNUMA já apoiou mais de 75 projetos de adaptação às mudanças climáticas em mais de 50 países.

O aumento da intensidade e do alcance da crise climática, com secas, enchentes e ondas de calor tornando-se ocorrências regulares em ambos os hemisférios, desencadeou uma conversa global sobre como ajudar pessoas, ecossistemas e economias a se adaptarem à nova realidade.

No entanto, como mostra o novo Relatório sobre a Lacuna de Adaptação 2022, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), a conversa ainda não se converteu em ações efetivas. O relatório conclui que os esforços de planejamento, financiamento e implementação da adaptação não estão acompanhando os riscos crescentes.

Para aprofundar as questões levantadas pelo relatório, o PNUMA entrevistou o Maarten Kappelle, da Divisão de Ciência, de forma a detalhar o que o PNUMA está fazendo para impulsionar a adaptação climática e o que precisa acontecer para que isto se torne realidade em cada país.

O que é a adaptação climática e por que ela é importante?

Maarten Kappelle (MK): Adaptação significa essencialmente as medidas que implementamos para ajudar países, comunidades e setores, tais como a agricultura e a energia renovável, a planejar e prosperar durante os impactos da mudança climática. 

Existem muitos tipos de adaptação, mas uma das principais abordagens é o que chamamos de adaptação baseada em ecossistemas, que são essencialmente projetos que utilizam a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos para proteger as pessoas. Um exemplo é o plantio de florestas de mangue, que podem absorver picos de ondas e servir como uma barreira natural contra enchentes.

O que o Relatório sobre a Lacuna de Adaptação 2022 nos diz sobre o estado da adaptação?

MK: Infelizmente, não é uma boa notícia e sim um forte apelo à ação. Estamos vendo enormes impactos climáticos com um aumento da temperatura global de 1,1°C e estamos caminhando para um aumento de muito mais de 2°C, se não levarmos a sério a redução de emissões. E mesmo se cortarmos as emissões, ainda precisamos nos adaptar, pois levará décadas para que as temperaturas comecem a cair.

O que estamos vendo é um aumento no planejamento a nível nacional, com mais de 80% dos países participantes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, sob a qual recai o Acordo de Paris, criando pelo menos um instrumento de planejamento de adaptação nacional. O problema é que o financiamento está ficando desesperadamente escasso. Vamos precisar potencialmente de mais de US$ 300 bilhões por ano até 2030 para atender às necessidades de adaptação do mundo. 

Hoje, porém, a lacuna de financiamento é enorme: os fluxos internacionais de financiamento da adaptação para os países em desenvolvimento estão 5 a 10 vezes abaixo das necessidades estimadas. Isto significa que não estamos vendo implementação suficiente de projetos.

O que o PNUMA está fazendo para ajudar a impulsionar a adaptação?

MK: O que estamos fazendo – além de divulgar dados científicos como este relatório para mostrar onde estamos, onde precisamos estar e como chegar lá – é provar que a adaptação funciona através de projetos de campo. O PNUMA já apoiou mais de 75 projetos de adaptação às mudanças climáticas em mais de 50 países. Combinados, estes projetos visam beneficiar cerca de 2,5 milhões de pessoas, restaurar 113 mil hectares de terra, melhorar o conhecimento sobre adaptação climática de 60 mil pessoas e 131 instituições e construir mais de 1,1 mil estruturas de captação de água e 82 estações meteorológicas. É um grande esforço, porém uma gota no oceano, em comparação com a escala do desafio. Entretanto, esperamos que nossos programas ao redor do mundo possam ajudar a mostrar o caminho para muitos outros, através de soluções inovadoras e baseadas na natureza.

O que precisamos fazer para impulsionar a adaptação?

MK: Primeiramente, as nações desenvolvidas precisam cumprir as promessas feitas sob o Pacto Climático de Glasgow, um acordo assinado pelas lideranças mundiais na Conferência sobre Mudança do Clima da ONU no Reino Unido em 2021, para fornecer o financiamento necessário para realizar uma mudança radical na adaptação. Isto também deve incluir uma consideração de perdas e danos, já que muitas das nações menos responsáveis pela mudança climática já sofreram muito. Também precisamos ver uma rápida aceleração na pesquisa científica, planejamento, implementação e cooperação internacional mais profunda.

Que tipo de trabalho de campo os países devem fazer?

MK: O que ajudaria muito é procurar mais projetos que simultaneamente reforcem a resistência à mudança climática e reduzam as emissões de gases de efeito estufa, proporcionando uma dupla vitória para o mesmo investimento, juntamente com cobenefícios, tais como empregos e melhores meios de subsistência.

Soluções ecossistêmicas, como a restauração de turfeiras e florestas, são particularmente eficazes, pois capturam carbono e fornecem todos os tipos de serviços de adaptação, como armazenamento e filtragem de água e proteção contra eventos climáticos extremos.

Basicamente, ao destruir a natureza, ajudamos a impulsionar a mudança climática e reduzimos a capacidade natural do mundo de nos proteger contra os impactos climáticos. Se conseguirmos recuperar a natureza, por assim dizer, conservando e restaurando a natureza, percorreremos um longo caminho para resolver os desafios de adaptação e mitigação que o mundo está enfrentando hoje e amanhã. 

Ações – O PNUMA está à frente em apoio aos objetivos do Acordo de Paris de manter o aumento da temperatura global bem abaixo de 2°C e visando – por segurança – uma temperatura de 1,5°C, em comparação com os níveis pré-industriais. Para isso, o PNUMA desenvolveu um roteiro de soluções em seis setores para reduzir as emissões em todos os setores, de acordo com os compromissos do Acordo de Paris e em busca da estabilidade climática. Os seis setores são Energia; Indústria; Agricultura e Alimentos; Florestas e Uso da Terra; Transporte, e Edifícios e Cidades. A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP27) está focada na adaptação, finanças e uma transição justa – e você pode fazer sua parte agindo agora sobre seu próprio consumo ou expressando suas preocupações.


Este texto foi originalmente publicado por Nações Unidas Brasil de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.

Carolina Hisatomi

Graduanda em Gestão Ambiental pela Universidade de São Paulo e protetora de abelhas nas horas vagas.

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