O Amazoniar lançou dia 3 de março a cartilha Soluções para o desmatamento na Amazônia, em que destrincha quatro soluções possíveis
Por Lays Ushirobira em Ipam | O crescimento das taxas de desmatamento na Amazônia nos últimos anos, que está intimamente ligado à ocorrência de eventos climáticos extremos no Brasil, coloca o país num cenário desafiador. No entanto, a boa notícia é que há soluções para reduzir o desmatamento e seus impactos. O Amazoniar – iniciativa do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) para promover um diálogo global sobre a Amazônia – lançou dia 3 de março a cartilha Soluções para o desmatamento na Amazônia, em que destrincha quatro soluções possíveis: destinação de florestas públicas; incentivos à conservação em áreas privadas; aumento da produtividade agropecuária; e fortalecimento de comando e controle.
A publicação é resultado do quinto ciclo da iniciativa, cuja proposta foi conectar a juventude com especialistas do IPAM, abrindo espaços para diálogos sobre o que pode ser feito para proteger a floresta amazônica. “Nos últimos ciclos do Amazoniar, aprendemos que os jovens querem atuar por um mundo ambientalmente saudável, economicamente próspero e socialmente justo. Entendendo a importância da Amazônia para garantir seu futuro, eles querem construir soluções coletivamente e de forma inclusiva, integrando os conhecimentos tradicionais das diversas comunidades que vivem no território”, diz Lucas Ramos, coordenador da iniciativa.
Ramos explica que a cartilha é direcionada a todos que querem começar a entender as soluções para o desmatamento da Amazônia. “Com base em todas as conversas que tivemos durante este ciclo do Amazoniar, fizemos essa publicação com intuito de aumentar o acesso à informação sobre algumas das soluções para o desmatamento na região e continuar a expandir esse diálogo tão importante para o mundo”, ressalta.
Faça o download da cartilha aqui.
Destaques da cartilha
1. Destinação de florestas públicas
O desmatamento ilegal é um dos maiores desafios da Amazônia. Entre 2019 e 2021, 51% do desmatamento na região ocorreu em terras públicas, atingindo principalmente as chamadas florestas públicas não destinadas (FPNDs), onde aconteceu 30% do desmatamento total durante o período. Elas cobrem uma área de 56,5 milhões de hectares, o equivalente a duas vezes o estado de São Paulo.
A grilagem – nome dado à apropriação ilegal de terras – está diretamente relacionada aos recordes que o Brasil vem batendo nos últimos anos. Até o fim de 2020, mais de 14 milhões de hectares das FPNDs estavam registrados ilegalmente como propriedade particular no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR).
O processo de grilagem é uma espécie de especulação imobiliária. Estima-se que são necessários entre R$ 800 e R$ 2.000 para desmatar um hectare na Amazônia, ou seja, um desmate de 100 hectares poderia custar até R$ 200.000. Apesar dos altos custos da prática, a falta de fiscalização acaba incentivando o aumento da ilegalidade na região.
2. Incentivos de conservação em áreas privadas
Para reduzir o desmatamento da Amazônia, é preciso pensar também naquele que é feito no âmbito legal. O Código Florestal permite o desmatamento de até 20% da floresta amazônica localizada dentro de propriedades particulares. Isso significa que incentivos – econômicos, fiscais e de assistência técnica – à conservação em terras privadas poderiam potencialmente proteger cerca de 11.3 milhões de hectares do bioma.
No âmbito econômico, recompensas financeiras a produtores rurais e empresas que realizam serviços ambientais em suas propriedades vêm se mostrando bastante eficazes. O Conserv, iniciativa do IPAM com outras organizações parceiras, por exemplo, soma até a data 14.843 hectares de florestas nativas conservadas dentro de propriedades privadas da Amazônia Legal, o que representa 540.635 toneladas de carbono estocado.
Já no âmbito fiscal, um exemplo é o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) Ecológico ou Verde, que pode estimular esforços de municípios em prol da conservação dos recursos naturais nos seus territórios, como mostra pesquisa do IPAM.
3. Aumento da produtividade agropecuária
Muitos estudos comprovam que o Brasil pode continuar suprindo sua demanda global de alimentos sem desmatar. Dados do MapBiomas mostram que a pecuária bovina de baixa produtividade ocupa 73% das áreas já desmatadas na Amazônia. Porém, segundo pesquisa do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), é possível triplicar a produtividade média da criação de gado sem desmatar, adotando técnicas já existentes na região, como rotação de pastagens e integração lavoura-pecuária-floresta.
A diversificação é um ponto-chave para o aumento da produtividade agropecuária, pois confere mais saúde para o solo e para a natureza, além de mais lucro para os produtores. Um exemplo disso é a agricultura familiar. Os dados mais recentes do Censo Agropecuário, de 2017, apontaram que a agricultura familiar ocupava na época cerca de 80 milhões de hectares no país – ou 23% da área total usada para agropecuária. Apesar disso, o segmento tem grande participação no fornecimento dos alimentos consumidos nacionalmente, como 80% da mandioca, 48% do café e da banana e 42% do feijão.
4. Fortalecimento de comando e controle ambiental
Quando se olha o crescimento das taxas de desmatamento da Amazônia nos últimos anos, é difícil de acreditar, mas o Brasil já foi uma referência em conservação ambiental e foi um dos pioneiros no fortalecimento da legislação e de políticas públicas que incentivam a proteção do bioma. Em grande medida, o problema do desmatamento está relacionado à fragilização dos órgãos de comando e controle ambiental da região que aconteceu nos últimos anos.
O Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) é um exemplo de instrumento de proteção ambiental: entre 2004 e 2012, o programa conseguiu reduzir em 83% o desmatamento na Amazônia por meio de sua atuação. Os resultados também se traduziram em investimentos externos a partir de cooperação internacional, que foram fundamentais para seguir combatendo o desmatamento na região. No entanto, foi descontinuado em 2018.
Para reduzir o desmatamento imediatamente, a ação mais efetiva é o fortalecimento do comando e controle ambiental, ou seja, da fiscalização e punições daqueles que cometem e financiam crimes ambientais. Outro pilar fundamental é uma governança territorial estruturada e integrada para combater a grilagem e direcionar a atuação das políticas públicas de forma concreta para a redução do desmatamento.
Sobre o Amazoniar
O Amazoniar é uma iniciativa do IPAM para promover um diálogo global sobre a Amazônia e sua importância para as relações do Brasil com o mundo. Nos ciclos anteriores, foram organizados diálogos sobre as relações comerciais entre Brasil e Europa; o papel dos povos indígenas no desenvolvimento sustentável da região e sua contribuição para a ciência e a cultura; e o engajamento da juventude pela floresta e seus povos nas eleições de 2022.
Com a proposta de levar a Amazônia para além de suas fronteiras, o Amazoniar já realizou projetos especiais, como um concurso de fotografia, cujas obras selecionadas foram expostas nas ruas de Glasgow, na Escócia, durante a COP 26; uma série de curtas que compôs a exposição “Fruturos – Amazônia do Amanhã”, do Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro; além de uma publicação com informações-chave para que todos possam compreender melhor o atual contexto amazônico e algumas das possíveis soluções para seu desenvolvimento sustentável.
Este texto foi originalmente publicado por IPAM de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.